Sobre a reforma do Ensino Médio

Harim Britto
Lições da Escola
4 min readSep 22, 2016

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A gente imaginava que retrocessos como esses não seriam possíveis numa sociedade democrática.

Mexer no sistema educacional à base de canetadas, sem discussão ampla com a comunidade acadêmica e com os profissionais da área é característico de quem não entende o que é educação, ou prefere ignorar todos os processos. Entre os políticos envolvidos nesta reforma, fala-se tanto em meritocracia, mas quando é pra dar esse direito a quem tem, simplesmente se negam a fazê-lo.

Publicação da página do MEC anunciando a reforma

Filosofia, Sociologia, Educação Física e Artes Plásticas passam a ser optativas.

Uma ação que apenas reforça aquele estigma da escola como um espaço pseudo-asséptico e de ausência crítica e estética, em favor de uma formação estritamente técnica. Podemos fazer algumas aproximações dessa ação tomada hoje com o Movimento Brasileiro de Alfabetização. Fazendo o esforço meramente lúdico e recreativo de imaginar, vejo o atual Ministro recordando com saudades das aulas que teve nessa época e, talvez movido por uma nostalgia, queira vê-las em funcionamento novamente.

Amplia-se gradualmente a carga horária na escola, mas se flexibiliza o currículo.

Qual o comprometimento do Ministério da Educação com a criação de um currículo ampliado neste meio tempo, qual o suporte técnico oferecido para um tempo tão curto e sobretudo, qual o tempo hábil da comunidade escolar se preparar para fazer essas adaptações já para o próximo ano? Fica evidente que não há a menor preocupação com os alunos, tampouco com as escolas.

Por uma suposta autonomização dos indivíduos

Dar a condição do aluno escolher já no ensino médio uma carreira a seguir é uma ideia maravilhosa, quando se tem uma base educacional ampla e consolidada desde os primeiros anos de ensino. Na perspectiva que temos hoje, com tantas disparidades entre os ensinos, a tendência é que os alunos que disponham de acessos diferenciados tenham melhor estrutura para pleitear uma vaga no ensino superior. É uma volta ao velho modelo excludente. O combate desse modelo não foi mérito de um partido apenas, mas um esforço conjunto de todos os envolvidos, desde a reabertura democrática. Arriscamos jogar todos esses avanços fora em uma canetada apenas. Me pergunto, quanto aos alunos de baixa renda, essa flexibilidade curricular aliada “as demandas do mercado”, qual seria perspectiva deste aluno investir numa formação mais ampla e possa com isso ter uma boa inserção no ensino superior? Qual é a probabilidade dele alocar a maior parte do seu tempo em disciplinas de caráter técnico e profissional e por fim fique limitado a uma formação estritamente técnica (e com isso menores salários). Uma visão pragmática, realista e imediatista, em nome de uma empregabilidade que não se pretende ir além disso. Ficas difícil falar em dignidade e liberdade de escolha quando as condições para a escolha (liberdade e discernimento) são de antemão, comprometidas e já pré-determinadas.

E os professores?

Vamos falar sobre os professores, aquela categoria que ano a ano tem seus números encolhidos pelo desinteresse geral na profissão. As causas para isso já falei num outro texto, mas resumindo rapidamente aqui, baixos salários, sobrecarga, precarização das condições de trabalho e falta de perspectiva de crescimento na profissão, que faz com que o magistério seja uma das carreiras menos atrativas do ensino superior.
Essa nova reforma, permitirá que profissionais com notório saber, mas não tenham cursado nenhuma licenciatura, possam dar aulas. Profissionais que, a despeito da sua vasta formação e experiência, não possuem uma formação adequada para licenciatura e tampouco experiência em sala. Esses profissionais poderão ter, segundo essa nova reforma, a responsabilidade de assumir uma sala de aula.
Detalhe: Não se exige nem sequer formação específica para a área, bastando apenas uma afinidade de área.

E tem mais!

Na proposta, existem algumas jabuticabas no texto, que eu quero poder ter o acesso na íntegra para poder comentar e depois atualizar esse texto, mas segundo a matéria do G1, a possibilidade de convalidar conteúdos dados no Ensino Médio como créditos no Ensino Superior é mais perfeita expressão do pouco caso que se dá a formação do estudante, pois ignora os graus de complexidade do processo de formação e desconsidera os estágios de desenvolvimento do discente, coisa que qualquer pessoa que tenha passado pela formação de professor saberia, mas evidente que não é o caso.
Para resumir rapidamente, trata-se de um verdadeiro escárnio com os alunos. Não há um comprometimento real com a melhoria da Educação, tampouco seriedade nessas propostas.

É impressionante como a Educação é esculhambada nesse país. Aceita-se opinião de tudo e de todos, menos dos principais agentes do processo. Um professor universitário, para ter um acesso direto ao Ministério da Educação e não passar pelas habituais burocracias é praticamente impossível. Por outro lado, uma subcelebridade do calibre de um Alexandre Frota não apenas consegue uma reunião exclusiva com o Ministro da Educação, Mendonça Filho, da entrega um projeto com ideias que permitiriam que o Brasil retornasse “à normalidade política, econômica, social etc”.

Esse é o triunfo do Movimento Escola Sem Partido, que foi imposto sem fundamentação.

Esse é o retorno do Movimento Brasileiro de Alfabetização, que ressurge em novas cores.

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