Cortando o intermediário: o avanço das foodtechs

De olho em estreitar os laços com os consumidores e se posicionando como foodtechs, marcas e redes de restaurantes estão investindo cada vez mais em plataformas proprietárias. O que isso significa para o setor?

Contagious Brasil | editorial
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5 min readFeb 1, 2022

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A pandemia transformou o delivery em um serviço essencial e imprescindível. Segundo um levantamento realizado pela Associação Nacional de Restaurantes (ANR), as entregas são responsáveis por 39% do total do faturamento de bares, cafés, lanchone e resyaurantes. Quem faz essa engrenagem girar são gigantes como o iFood: segundo algumas projeções, a companhia tem uma fatia de mercado de mais de 80% no Brasil. Seu principal rival, Uber Eats, recentemente jogou a toalha e anunciou o encerramento das suas atividades.

Contudo, para além das discussões sobre o monopólio do iFood, um outro movimento se desenha no horizonte: marcas e grandes redes de restaurantes que estão cortando o intermediário e investindo em serviços de venda e entrega próprios, via aplicativo. De olho em estreitar os laços com os clientes e se posicionando como foodtechs, companhias estão apostando no modelo direto para o consumidor.

Fonte: Meio & Mensagem

Meu app, minha entrega

O Burger King é uma dessas marcas: A rede lançou recentemente sua plataforma de entrega própria, o BK Delivery. O serviço hoje alcança 45% das lojas da companhia e a empresa aposta na consolidação e expansão do modelo: a expectativa é que até o final do primeiro trimestre de 2022, o serviço cresça 40%.

Estamos capitaneando a revolução para foodtech no país. O início da nossa atuação com delivery próprio vai muito além de apresentar uma nova opção de compra para os nossos consumidores. Nós queremos oferecer preços ainda mais competitivos e as melhores experiências, desde o atendimento até a qualidade dos produtos, para que o BK siga como uma referência de atuação digital no setor de fast-food do Brasil”

– Alexandre Cezilla, Diretor de Vendas do Burger King do Brasil

Quando se trata de apostar nos seus próprios canais de venda, a Domino’s é uma pioneira, com um posicionamento que tem reflexo nas saídas criativas da rede para ativar seus canais, como por exemplo, ativações em torno do aplicativo de mensagens preferido do público brasileiro, o Whatsapp. A pizzaria também já ofereceu descontos generosos para quem fizesse um pedido via emoji e recentemente lançou a opção de se fazer pedidos por voz, via assistentes digitais — com a carismática Jojo Toddynho atuando como a voz da marca por lá (falamos mais sobre essa ativação aqui e você pode conferir uma entrevista com uma das idealizadoras da campanha, Inaiara Florêncio, aqui).

Em busca do pote de ouro

O posicionamento de BK e Domino’s retira o intermediário do circuito e investe numa jornada de compra de ponta a ponta. Além de aumentar as possibilidades de fidelização, essas companhias têm acesso ilimitado ao pote de ouro da Era Digital: os dados dos seus clientes. A vantagem competitiva de serviços de entrega como iFood é justamente ter uma base de dados ampla sobre a clientela dos restaurantes — informações preciosas que pertencem à companhia e não são repassadas para os restaurantes parceiros.

O acesso aos dados é uma demanda sensível para proprietários e gestores de restaurantes. Poder conhecer a sua clientela é um dos atrativos do Quiq, plataforma de entregas criada por uma joint venture composta por redes de restaurantes como Pizza Hut, Rei do Mate, Outback e Giraffas e por grupos de peso como a Cia Tradicional do Comércio (dona de Bráz Pizzaria, Lanchonete da Cidade, Ici e Pirajá) e a BFFC (que tem Bob’s, KFC, Pizza Hut e Yoggi). Através dela, os estabelecimentos têm dashboards completos e que podem ser geridos diretamente por eles — o que inclui informações sobre os clientes e possibilidades de acesso direto a eles.

Dashboard do Quiq

Enquanto o setor investe em rotas de fuga, o iFood aposta na inovação para continuar dominando o mercado. A companhia conseguiu autorização da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) para realizar entregas por meio de drones em todo território nacional. Há algum tempo atrás, a Amazon fez um movimento parecido nos Estados Unidos, o Prime Air. Anunciado em 2013, o projeto ainda não decolou. Apesar da dificuldade de implementação, projetos ambiciosos como esse ajudam o iFood a se manter na dianteira quando o assunto é disrupção tecnológica e contribuem para a construção da marca.

Enquanto grandes redes de restaurantes apostam em aplicativos próprios para unificar a experiência dos seus clientes, eliminando os intermediários do processo, no setor supermercadista, empresas de tecnologia, de forma análoga, assumem as rédeas de estocagem, logística e distribuição e passam a gerir seu negócio de forma integral, tirando dessa equação os mercados. Com um modelo de negócios baseado em dark stores, empresas de entrega de compras de mercado se tornam lojas.

Vetores opostos

Um exemplo desse movimento é a Nana, startup fundada por executivos egressos do Zé Delivery, que nasceu com a promessa de entregas “ultrarrápidas” de supermercado, com foco principalmente nas classes C e D. A companhia, que está no estágio inicial — operando há poucos meses, apenas em Belo Horizonte — investe no conceito de dark stores, pontos de venda ou centros de distribuição que atendem exclusivamente a compras online, ou seja, não têm fachada e atendimento direto e presencial ao público. Cada loja da Nana serve apenas um pequeno raio de distância, garantindo assim a velocidade da entrega.

A startup segue os passos da Daki — um dos mais novos unicórnios brasileiros –, negócio de entregas de supermercado que também aposta num modelo verticalizado, sem intermediários: do contato com a indústria, passando pelo estoque e chegando à logística de entrega, a companhia assume todas as etapas. A Daki mantém 60 dark stores em cidades do sudeste do Brasil e planeja expandir até para outros países.

Sorrateiramente, a Rappi também emprega a estratégia de dark stores e entregas rápidas: sua vertical de varejo, a “Rappi Turbo”, já tem 125 unidades instaladas em 13 cidades brasileiras. Aliando sua extensa base de dados com um conhecimento profundo dos hábitos dos seus consumidores, a companhia pretende usar modelos preditivos e oferecer produtos comprados frequentemente para seus consumidores.

Estas mudanças nos modelos de negócio e de operação de marcas já estabelecidas e o surgimento de novos players que fundam uma espécie de novo setor também implicam novas formas de comunicar os serviços para o consumidor. Seja para ativar plataformas proprietárias ou para fomentar uma mudança de hábitos de compra, existe um novo tipo de desafio de criatividade para o marketing destes negócios. Num cenário em que cada restaurante ou delivery de entrega de supermercado é um aplicativo, como essas marcas podem ir além dos pushs e cupons de desconto? Quais recursos criativos podem ser usados para ativar suas plataforma e canais de venda? Como convencer os clientes a usar o seu aplicativo e não um marketplace?

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Perfil do time editorial da Contagious Brasil. Publicando reflexões, análises e referências para excelência criativa e estratégica.