Acaso Encantado
Na catarse da noite
Meus livros adoravam contar histórias sobre fadas, reinos encantados e poderes mágicos. O tempo que eu acreditei nisso já havia passado quando saí do trabalho e vi a jovem na calçada encarar a noite que rondava a rua onde só o vento habitava.
Era como ver uma criança admirando seu brinquedo pela primeira vez e lutar com o medo de estragar a embalagem. Ela sorria e seus olhos brilhavam para a lua naquele céu sem nuvens. Se deitou um pouco sobre o braço e balançou a cabeça para contemplar todo o firmamento com uma curiosidade infinita. Nesse momento percebi que, ao lado dela, estava outra pessoa deitada no meio-fio. Outro jovem com um rosto escondido pela mochila que aconchegava sua cabeça.
Não demorou muito até que ela estendeu o braço ao céu e estalou os dedos. O barulho de uma pipoca batendo na panela assoviou pela noite e uma estrela brotou logo acima. Simples assim. Aquele brilho não estava ali, a escuridão da noite estava limpa até então. Poucos segundos depois, mais um estalo palpitou da mão da garota. E mais uma estrela surgiu no céu.
Os minutos seguintes se preencheram com um dos espetáculos mais belos que um ser humano pode presenciar. O som de um festança despreocupada de fogos de artifício preencheu a rua enquanto o céu tomou o brilho de mil e uma estrelas. Cada uma com seu acaso, seu som, seu tempo. Mas cada uma com o mesmo brilho.
Encantado pela cena, sentei no muro e fiquei contemplando o que aconteceu ali. Esqueci de várias coisas naquela noite, mas lembrei como era bom olhar para o céu em uma noite morna de verão.
Quando me dei conta, o garoto ao lado começou a se mexer e acordou. Levantou como qualquer pessoa depois de uma boa noite de sono: no início não sabia onde estava e fez um drama pela inércia. Tomou alguns segundos até se desgarrar da preguiça.
Fez um cafuné na garota ao lado e saudou o firmamento com o próprio estalo com os dedos.
Os primeiros raios laranjas da manhã começaram a aparecer no horizonte.