Insana idade

Maximilian Rox
Conto que te Conto
Published in
2 min readDec 15, 2019

Acaso Encantado

Era o primeiro ônibus do dia e alguém já estava aos prantos de tanto rir.

Minha filosofia passava pelos prédios recém-acordados da cidade quando um grito agudo ultrapassou o barulho isolante dos fones de ouvido. Parecia alguma mulher gritando ali mesmo, mas na volta ao mundo real percebi uma senhorinha gargalhando até o fôlego secar.

Lá estava ela sozinha na última fileira, com rugas por todo o rosto e rindo enquanto repetia algo baixinho para si mesma. Parecia se divertir como se estivesse ao lado de bons amigos, mas só encarava a si mesma no vidro ao lado da saída.

Por vezes parava, encostava o dedo na imagem refletida e soltava baforadas roucas de risos. No meio de tudo, ainda fechava os olhos para aconchegar aquelas lágrimas reservadas aos momentos mais engraçados da sua vida.

Foi assim por mais 15 minutos. Ela só se acalmou na freada firme que o motorista deu quando chegamos. Então o ônibus quase vazio desceu no terminal.

Inquieto, parei pouco além da porta enquanto os apressados seguiam seu rumo ao meu redor. Ela caminhava para longe com seus passos preguiçosos e sem destino. Me perguntei o que passava naquela cabeça. O que foi tudo isso.

Será que algum dia eu ficarei assim?

Ela parou e virou levemente o pescoço para trás. Engatilhou seus olhos castanhos até mim, frios como uma montanha depois de uma geada.

O olhar mais sério que eu já recebi na vida me fitou por três segundos, girou a catraca e seguiu o seu caminho como se nada tivesse acontecido.

--

--

Maximilian Rox
Conto que te Conto

Jornalista com ascendente em poesia. Community manager; Call of Duty, games, esports.