E assim a ciência não “caminha a passos largos”: compartilhar informação científica é preciso!

Tiago Leite
Cultura de Inovação em Bibliotecas
Sent as a

Newsletter

6 min readApr 2, 2016

No último texto que escrevi por aqui, em um dos trechos em que frisava sobre a relevância da disponibilização da informação, eu disse que “na sociedade contemporânea a disseminação da informação é tudo!”. Partindo deste princípio posso dizer que há uma grande importância na disseminação e acesso à informação para que o conhecimento seja produzido, para que haja ciência. A partir disso, como é possível, ainda, que os periódicos ou bases de dados pagas sejam mais valiosas que as de acesso livre, onde há facilidade para a produção científica, ou mais valiosos que os repositórios institucionais, já que muitas das instituições de ensino e pesquisa os possuem, facilitando o acesso à informação produzida pelos integrantes das instituições.

Ainda há uma grande importância dada pelos avaliadores dos periódicos e bases de dados científicos aos periódicos e bases pagas, ou seja, prece que dão mais valor ao de difícil acesso. O mercado editorial ainda é muito forte, pois, muitas vezes por pressão profissional das instituições, os pesquisadores têm de submeter sua produção científica aos periódicos de nota alta perante as instituições avaliadoras e muitos deles são de acesso restrito. O acesso pago vai de encontro com o acesso livre, com a via verde da informação, dificulta a criação de novo conhecimento e vai contra a inovação, ou melhor, restringe a inovação. Então por que se dá mais valor (nota qualis por exemplo) às bases de dados e periódicos pagos do que aos de acesso livre? Não tenho a mínima ideia, só sei que o caminho para a criação de novos conhecimentos, inovação e para a aceleração da ciência é o compartilhamento de informação e de conhecimento científico.

O acesso livre gera o compartilhamento facilitado de artigos ou documentos científicos e ajuda a gerar novos conhecimentos, isto pode significar inovação. Vemos surgir a todo momento, com a velocidade da ciência, tipos de plataformas para compartilhamento ou disseminação da informação e do conhecimento científico, se tem como exemplo os repositórios, que surgiram exatamente para a organização e disseminação da produção científica institucional, isto ajuda a publicação dos autores da instituição, que não necessitam mais publicar em periódicos pagos, muitas vezes dificultando o acesso para a própria instituição. Eles podem publicar em seus respectivos repositórios e, mesmo publicando em periódicos pagos, eles podem publicar (armazenar) o pré print no repositório. O repositório é um das várias “ferramentas” que facilitam o compartilhamento de documentos científicos, porém como ter acesso aos artigos pagos? A resposta é óbvia, pagando! Mas e se não puder ou não quiser pagar? Pode ser aluno de umas das instituições que possam te liberar acesso a esses periódicos, como por exemplo as várias universidades que liberam acesso pelo Portal da Capes ao conteúdo pago, geralmente feito através do IP da instituição. Mas e se não for aluno de determinada instituição, não possa ou queira pagar, ou outra coisa que o impeça de ter acesso a esse conteúdo, o que fazer? Chegamos ao ponto que aflige o mercado editorial, que coloca na discussão a Lei dos Direitos Autorais e a pirataria na Web.

As plataformas de compartilhamento de artigos científicos (pagos) podem ser o caminho para facilitar e agilizar a criação de novo conhecimento e gerar o “real” acesso livre. Tenho que confessar que não sou um expert para ir a fundo no assunto, mas através de uma pesquisa básica já vi que esta questão é bem controversa, polêmica e é um tiro no coração das grandes editoras.

O desenvolvedor de softwares, escritor e ativista da internet Aaron Hillel Swartz, morto aos 26 anos (suicídio), era um grande defensor do “real” acesso livre, brigou para que realmente houvesse acesso à ciência, a política, leis entre outras coisas, na internet. Pode-se dizer que ele é um dos que mais brigavam e produziam ideias para o compartilhamento de informações na internet.

“Os bibliotecários brasileiros podem não saber, mas Aaron tomou partido de algumas coisas que fariam Ranganathan ter orgulho.”

Ele conseguiu produzir plataformas ou sites, como queiram, que possibilitavam o acesso às informações que constavam como pagas em bases de dados, periódicos e sítios da internet, por isso foi achincalhado pelo mercado editorial e pelo governo, acusado de pirataria e, pode-se dizer, de roubo, pois infligia os direitos autorais. Mesmo que de forma rasa não posso iniciar uma fala sobre o Sci-Hub e o LibGen sem ter antes falado desse cara, que faleceu jovem e, pelo que li, deixou um legado a ser seguido em direção ao “real” acesso live.

Segundo o Wikipidia o Sci-hub ou Scihub é um repositório de 47.000.000 de artigos científicos, que contornam sistemas que restringem o acesso a usuários da Internet sem registros pagos em seus sites (em inglês, os paywalls). A editora acadêmica Elsevier alega que o site fornece acesso pirata a artigos acadêmicos. O acesso aos artigos científicos deste repositório é feito através de um sistema baseado em proxies, permitindo a leitura de artigos que custariam, de outra forma, em torno de $30 USD cada (aproximadamente R$ 120). Sim, ele dá acesso ou compartilha os artigos científicos pagos de graça e como disse isso é um tiro no coração das grandes editoras, que “gritam” socorro à justiça para que a informação científica não seja disseminada, a meu ver interferem no processo de criação de novos conhecimentos, vão contra a ciência por interesse financeiro, a final vivemos em um mundo capitalista.

O Wikipédia também descreve o Library Genesis ou LibGen, que é um motor de busca de artigos científicos e livros, que permite o acesso aberto a conteúdo protegido sob acesso pago. Ele carrega os conteúdos em PDF dos portais de internet como o Elsevier e ScienceDirect. A plataforma entrou em confronto com a mesma editora citada anteriormente (Elsevier), com o início de uma briga dessas só quem perde com isso é a ciência.

Essas duas plataformas de compartilhamento são irmãs a meu ver, pois têm os mesmos objetivos: a popularização da ciência, a disseminação da informação, a democratização do acesso e a velocidade na produção de novos conhecimentos, que ajudam a gerar inovação, por exemplo. É notório que as plataformas são muito úteis e, na minha opinião, são excelentes e não deveriam sofrer com polêmicas ou com decisões judiciais que inviabilizam seu uso. Se pensarmos que os documentos compartilhados têm fins acadêmicos e de produção de conhecimento, elas deveriam ser afirmadas como essenciais, porém vivemos em um mundo capitalista como fora dito.

É claro que essas plataformas, pela maneira que são utilizadas, vão de encontro com a Lei dos Direitos Autorais, que no Brasil, a meu ver deve ser reavaliada, já que é impensável, na sociedade contemporânea, somente liberar para o domínio público a obra após 70 anos de falecimento do autor, caso o autor faleça no dia 2 de janeiro, por exemplo, a lei fala para liberar somente após primeiro de janeiro do ano subsequente, logo são 70 anos e 364 dias. Este é um exemplo do que deveria ser revisto na lei, a meu ver essa questão atrasa a ciência, é óbvio! Logo o uso de plataformas desse tipo facilitam a ciência e “compartilham o mundo”.

Para não infligir nenhuma lei ou algo do tipo, o caminho pode ser o uso dos repositórios, assim, a criação de repositórios de acesso aberto nas instituições é importante e está entre as várias medidas que podem ser tomadas com a ajuda do bibliotecário para o compartilhamento de informações científicas.

O bibliotecário é “o cara” da informação, da documentação, da organização e do conhecimento, logo ele deve auxiliar e tomar decisões no processo de compartilhamento de informações científicas de sua instituição, isto é uma maneira de inovar e de propor novas facilidades à instituição e a seus usuários.

Além do bibliotecário atuar na questão relativa ao compartilhamento de informações científicas outras medidas devem ser tomadas, como por exemplo a criação de mais periódicos de acesso aberto e uma avaliação positiva destes periódicos, de forma que estimulem os produtores de informação científicas a publicar neles. Estes produtores de informação científica também devem colaborar e dar preferência a esses tipos de periódicos, já que dão maior visibilidade ao seu trabalho e facilitam a produção de ciência. Ou seja, um valorizaria o outro e vice-versa. Estes são conjuntos de fatores que, se aliados, podem gerar o tão falado e importante acesso livre, não permitindo as grandes editoras comandar a produção de ciência, apesar de muitas vezes serem elas que podem investir nesta produção, logo se faz importante o investimento institucional, principalmente do governo. Isto mostra o quão complexo é o compartilhamento de informação científica, que passa por “pirataria”, acesso livre e investimento, enquanto isso a ciência não caminha a “passos largos” como deveria ser.

Tiago Leite

--

--

Tiago Leite
Cultura de Inovação em Bibliotecas

Mestre em biblioteconomia pela UNIRIO, bibliotecário, estudante, eterno calouro com vontade de aprender continuadamente.