Por que jovens adultos sofrem mais de ansiedade e depressão na pandemia?

Vamos entender como disfunções de ansiedade e depressão cresceram na pandemia, o porquê de jovens adultos serem mais susceptíveis a elas e como manter a saúde mental em dia.

Otavio Corrêa
ARGO — Divulgação Científica
6 min readMar 4, 2021

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Fonte: Pixabay.

Destaques

• Sintomas de depressão e ansiedade aumentaram muito durante a pandemia da COVID-19.

• Jovens adultos compõe o grupo de idade mais susceptível a estresse e a ansiedade durante a pandemia.

• Má qualidade de sono, solidão e dificuldades financeiras foram considerados os principais mediadores de ansiedade e depressão, especificamente no grupo de jovens adultos.

• É possível reduzir os sintomas de ansiedade e depressão mantendo uma rotina, cuidando da qualidade do sono, fazendo exercícios físicos regularmente, entre outras possibilidades.

Contextualização

Não esperávamos mais um ano de pandemia. Na cidade de São Paulo, a quarentena completará um ano dia 22 de março de 2021, com duração similar em outras regiões do Brasil. Mas afinal, se ela chama quarentena, por que está durando mais de 40 dias?

Tirando o humor à parte, a longa duração do isolamento tem afetado negativamente uma grande parcela da população de aspectos econômicos à desordens psicológicas.

Nisso, a piora ou desenvolvimento de desordens de depressão ou ansiedade, principalmente por causa do isolamento social, tem atingido, em maioria, jovens adultos com 18 a 24 anos. E, como ainda não sabemos quando poderemos sair às ruas novamente, precisamos entender o porquê de estarmos sendo afetados psicologicamente pela pandemia e como procurar manter a saúde mental em dia.

Como ansiedade e depressão aumentaram durante a pandemia

Segundo o portal Kaiser Family Foundation (KFF)[1], houve uma piora drástica na percentagens — de 11% entre janeiro e julho de 2019 para 41.1% em janeiro de 2021 — de adultos que apresentaram sintomas de desordem de ansiedade e/ou depressão nos Estados Unidos da América (EUA). Os números foram ainda mais altos no Brasil [2].

Fonte: NHIS Early Release Program e U.S. Census Bureau Household Pulse Survey 2020.

Nisso, foi clara a relação entre sintomas de ansiedade e/ou depressão e perda de empregos durante a pandemia, em que 53.4% das pessoas que perderam empregos apresentam sintomas frente a 31.8% das que não perderam emprego, segundo o KFF.

Foi levantada uma relação clara, natural de se esperar, entre preocupação ou estresse relacionado ao Coronavírus e renda familiar dos adultos:

Fonte: KFF Health Tracking Poll (conduzida de 30 de novembro até 8 de dezembro de 2020).

Por fim, a distribuição dos casos seguiu um padrão inversamente proporcional à distribuição de idade, em que curiosamente jovens adultos foram os mais afetados:

Fonte: U.S. Census Bureau Household Survey 2020.

Isso pode ser explicado por diversos fatores, entre eles o fechamento temporário de universidades, transição para o trabalho remoto e perda de renda e de emprego, que poderiam contribuir para a piora da saúde mental, aponta o KFF.

Mas quais os motivos dos jovens sofrerem mais com sintomas de depressão e ansiedade durante a pandemia?

Por que jovens adultos são mais susceptíveis a ansiedade e a depressão durante a pandemia?

Para elencar os fatores que relacionam níveis de estresse à ansiedade e à depressão em jovens adultos, pesquisadores da Universidade de Victória, Austrália, conduziram uma pesquisa com 2555 indivíduos de 63 países. A partir disso, foram levantadas duas análises [3]:

Fatores mediadores na relação entre estresse e depressão

Fatores mediadores na relação entre estresse e depressão. Fonte: [3].

As três variáveis com maior correlação com depressão (tirando o próprio estresse) foram consideradas possíveis mediadores: qualidade de sono, solidão e “enfrentamento resiliente” (porque explicaram 17% da variação nos índices de depressão). Por “enfrentamento resiliente”, define-se “a habilidade de manter níveis relativamente estáveis e saudáveis de funcionamento físico e psicológico quando se é confrontado com uma situação altamente disruptiva”.

Depois disso, os autores aplicaram regressão múltipla para analisar quais fatores apontam para maior variância - maior dispersão de valores em torno do valor médio dos indicadores de depressão e ansiedade- entre diferentes grupos de idade. No grupo de 18 a 34 anos, mais minutos de exercício físico (por semana) foram relacionados a menos sintomas depressivos, ao passo que má qualidade de sono e estresse aumentado por dificuldades financeiras apontou para mudanças negativas nos sintomas de depressão.

Fatores mediadores na relação entre estresse e ansiedade

Fatores mediadores na relação entre estresse e ansiedade. Fonte: [3].

De modo parecido, qualidade de sono, solidão e idade foram considerados possíveis mediadores da ansiedade (porque explicaram 18% da variação nos índices de ansiedade).

Segundo os autores, o aspecto idade foi um mediador significante na relação estresse-ansiedade entre jovens adultos, sugerindo que esse grupo é mais vulnerável a estresse e ansiedade durante a pandemia. Nisso, curiosamente, a má qualidade de sono e a solidão são relacionados a sintomas de ansiedade em indivíduos de 18 a 34 anos, relação que não foi identificada nos outros grupos.

Por fim, solidão e dificuldades financeiras tiveram impacto negativo nos indicadores de depressão e ansiedade especificamente no grupo de jovens adultos.

Discussão

Como sugestões para a melhora dos sintomas de ansiedade e depressão, os pesquisadores apontam para a importância de algumas intervenções:

  • Adaptar estratégias de saúde mental para cada um dos grupos de idade;
  • Melhorar a qualidade de sono, que pode resultar em redução dos sintomas de ansiedade e de depressão;
  • Empregar estratégias de redução de estresse.

Apesar disso, é apontado que os fatores dificuldades financeiras e solidão não podem ser modificados imediatamente.

Como preservar sua saúde mental

Tendo em mente a dificuldade de acesso a acompanhamento psicológico e psiquiátrico por grande parte da população, vou listar aqui algumas dicas com custo baixo ou nenhum custo. Ainda assim, se você apresentar ou não sintomas de ansiedade e/ou depressão procure um profissional da saúde sempre que possível.

O portal da Organização Mundial da Saúde (OMS) sugere várias medidas relacionadas à saúde mental [4]. Vou listar aqui as menos óbvias:

  • Tenha uma rotina. Acorde e vá dormir em horários similares todos os dias, isso ajuda a preservar a saúde do sono (leia mais nessa outra publição do Grupo ARGO)! Coma refeições saudáveis e em intervalos de tempo regulares. Faça exercícios físicos regularmente. Reserve algum tempo para descansar e para fazer coisas que você gosta de fazer. Tudo isso ajuda a manter a rotina em dia e continuar praticando bons hábitos.
  • Reduza contato com notícias. É sempre importante ouvir as recomendações do órgãos de saúde, mas notícias em excesso podem fazer você apresentar ansiedade e estresse. Na minha própria opinião, a atmosfera pesada e desesperadora das notícias relacionadas à COVID pioram ainda mais isso.
  • Mantenha contato social. Ainda que no isolamento, mantenha contato regular com pessoas próximas por telefone ou pela internet. Como já vimos anteriormente, a falta de contato social é um dos principais mediadores dos sintomas de estresse e ansiedade!
  • Limite seu consumo de álcool e outras drogas. Se você não consumia álcool ou drogas antes da pandemia não comece a consumi-los como uma maneira de lidar com o medo, ansiedade, tédio e isolamento social. Não existem evidências que beber álcool tem qualquer efeito protetor sobre infecções virais. Se possível, limite a quantidade de álcool que você consome ou não consuma nada, tirando o álcool em gel para limpeza das mãos.

Referências

[1] The Implications of COVID-19 for Mental Health and Substance Use.

[2] Brasil lidera casos de depressão na quarentena, aponta pesquisa da USP.

[3] Younger people are more vulnerable to stress, anxiety and depression during COVID-19 pandemic: A global cross-sectional survey.

[4] Looking after our mental health.

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