Creative Framework — Parte I

Thiago Baron
DOJO.do
Published in
7 min readSep 5, 2019

“Criatividade é fazer as conexões certas”.

Dizer que criatividade vem de berço talvez seja um dos maiores clichês que possa existir. Dizer também que uma criança é criativa é um pleonasmo tombado pela unanimidade, o que acaba sendo acentuado pela família de uma maneira tão convicta que, muitas vezes, o que pode ser criativo seja apenas uma insaciável rotina infantil. Outras vezes, a imaginação aparece e não há como negar que ambas andem juntas, com uma diferença tão sutil que não se possa apontar uma e negar a outra.

A imaginação sempre esteve presente em minha vida. Desde pequeno, era divertido imaginar coisas diferentes com as quais eu pudesse brincar. Diante disso, posso dizer que minha primeira ferramenta de imaginação foi o Lego, uma diversão sem limites para mim. Era comum criar vários universos e transformar tudo isso numa dinâmica lúdica, casinhas e carrinhos ganhavam vida e interagiam, além de outras e várias histórias. E, num determinando momento de minha vida, meu foco nunca foi ser criativo, meu foco foi ser inventor. E há que se considerar que, apesar de significados parecidos, pode-se colocar uma diferença entre o criador e o inventor, justamente pelo fato de o inventor estar ligado a coisas concretas, visíveis, porque não se tem o costume de falar que exista um inventor de histórias, justamente por o termo estar ligado pejorativamente a um mentiroso. E por isso, de forma conveniente, vou me valer do hábito para me considerar muito mais inventivo do que criativo.

Dando um salto mais adiante, tomando essa linha de invenção, comecei minha carreira como programador. Passava horas na internet pesquisando para que conseguisse elaborar um site sobre os jogos de computador que eu jogava naquela época, em fins dos anos 1990. Eu tinha 15 anos e meu sonho era ser jogador de futebol, estava com uma carreira encaminhada, com propostas de jogar em times fora de São Paulo. E foi nesse momento que fui diagnosticado com diabetes tipo 1 e fui obrigado a ficar um tempo considerável sem praticar atividade física alguma. Eu seria obrigado a ficar um grande período em casa, o que praticamente foi um incentivo e tanto para que meus pais me dessem um computador. Durante esse período de dedicação e internação obrigatória, aquela distração acabou virando meu vício e, retomando meu espírito de inventor, eu me tornei um dos precursores no Brasil a desenvolver o que, hoje, é entendido como Log de Streaming. Explico. Quando uma imagem de internet é exibida, ela é fracionada em vários pacotes de bytes, que são carregados numa determinada sequência para que seu browser interprete isso e a exiba em forma de imagem, o que chamamos de renderização de browser. Lembrando que, no final dos anos 1990, estávamos na época da internet discada, primórdios desse maravilhoso mundo virtual, e minha intenção era que os prints screen que eu tirava dos jogos com que me distraía tivessem uma excelente qualidade para serem expostos no site do clã, nosso grupo viciado em F16. Então a necessidade mais uma vez foi meu maior incentivo para desenvolver essa lógica de pacote de bytes para conseguir exibir essas imagens com qualidade de tempo real. Um trabalho gigantesco, resultado de várias buscas na internet ou em bate-papos em fóruns, conversando com pessoas do mundo inteiro. Eu acabava me defendendo bem em inglês, mesmo sem dominar o idioma, a paixão pelo vídeo game me fez agir, e pus em prática essa ideia de deixar nosso entretenimento ainda mais interessante, desenvolvendo um site. Por isso insisto que, desde pequeno, com minhas interações inventivas com o Lego resultou numa lógica de construir coisas e organizá-las de uma forma para que elas ficassem tangíveis e isso acabou se mantendo até hoje e se tornou, provavelmente para sempre, a minha base.

Como nessa vida acredito que existam pontes para tudo, pessoas e situações sempre vão cruzar seu caminho com algum aprendizado, e isso se ratifica quando eu ainda estava na ativa no futebol. O pai de um dos colegas meus era um peixe graúdo da Computer Associates, uma espécie de IBM da época, e estavam desenvolvendo a primeira plataforma de e-learning do Brasil. Coincidentemente, passavam por um problema de processamento de imagem na internet discada. Como esse garoto fazia parte do nosso clã de F16, ele acabou mostrando ao pai, que se impressionou com a qualidade do site e quis saber quem estava por trás de tudo aquilo. Não demorou para que minhas habilidades chegassem ao homem, que acabou me contratando para desenvolver esse mesmo tipo de processamento de imagens junto à equipe de sua companhia. Aos 16 anos de idade, acabei me tornando um consultor de desenvolvimento da Computer Associates, uma multinacional. Eu trabalhava com um tradutor ao meu lado o dia todo, porque tinha de me relacionar com pessoas do mundo inteiro, Alemanha, Espanha, Argentina. Foi um passo para que eu começasse a mexer com internet pensando em Engenharia e Ciências da Computação e comecei a desenvolver sites. Foi então que entendi que a parte visual dos sites me estimulava a ser mais dedicado do que a parte de código. E o salto foi dado, saí da programação e virei designer, o que também me levou a cursar este segmento na faculdade. Quando se vira um profissional dessa área, o ponto de vista técnico da entrega acaba sendo secundário, porque há uma exigência em sua criatividade, você tem de elaborar algo que provoque uma reação em quem vê, tem de ser algo bonito, eficiente para que as pessoas desejem aquilo. E então eu me deparei com o conceito de criatividade. Até determinado ponto em meu trabalho, tudo era muito exato. Nunca fui a pessoa que elaborava slogans, jingles, eu apenas pensava sistematicamente para encontrar uma solução. Mudei meu caminho e fui fazer uma pós em criação publicitária, um mestrado sobre processo criativo. Como matemático, talvez, precisei encontrar a lógica desse processo criativo. Fui pesquisar sobre a criatividade desde a pintura rupestre até os momentos atuais e entender por que determinadas pessoas eram tratadas como criativas e outras não. Eu me deparei com uma fagulha que me estimulou a concluir que, entre os criativos ou não, os seres de luz, tocados pela inspiração divina ou não, todos, sem exceção, têm uma fórmula para se chegar às ideias. Foi então que eu comecei a mapear quem seriam essas pessoas que poderiam me inspirar a ter essas fórmulas, depois de um tempo dedicado nisso, pautado pelas duas experiências que trazia até aquele momento: a ideia do design e a função da programação. Essa busca me levou à IDEO, uma empresa californiana fundada na década de 1990, inventora do Design Thinking, uma espécie de metodologia de processo criativo, e do mouse. E isso me levou a refletir num ponto instigante: se eles foram capazes de inventar um aparelho tão útil e necessário como o mouse e vivem especificamente da criação, provavelmente seus criadores não se dão ao luxo de serem iluminados pela inspiração, tocados por uma luz divina, sentados à beira de uma piscina para que a solução apareça, certamente fazem disso uma profissão. Eu precisava ver como eles trabalhavam, e essa curiosidade me fez viajar até a Califórnia e trabalhar voluntariamente com eles, observando tudo o que faziam para entender como essa lógica de criação funcionava. Literalmente eu tentei ver a criatividade deles e seu processo criativo. Quando voltei ao Brasil, comecei a trabalhar com o conceito de Frameworks, que nada mais é do que padrões que dão segurança ao processo criativo, e transferi essa lógica com a qual trabalho até hoje. Usando o Design Thinking, que é usado para produzir algo centrado no ser humano, mas é falho em produzir algo centrado em marcas. Adaptando essa lógica, fui criando outras para encontrar soluções. Tudo isso porque nunca me senti criativo o suficiente para trabalhar com propaganda ou com design e eu precisava de uma lógica de trabalho que me deixasse seguro para apresentar meus projetos. No entanto eu creio que todo ser humano é criativo, a criatividade vem de qualquer lugar. E creio que existam pessoas com mais facilidade de sinapses, que fazem as conexões criativas, ou seja, associando A com B, do ponto A com o ponto B e é essa “estranheza” de conexões que acabamos chamando de criatividade.

E isso acontece o tempo inteiro com todos nós. Existem várias metodologias dentro dessas associações distintas, quanto mais longe da superfície básica de pensamento nós temos, mais originalidade é gerada, e quanto mais original for, mais criativa se torna, pensando exclusivamente em comunicação. Na propaganda, a emoção ajuda a completar a história que se está contando, que seja empática o suficiente para que quem a veja se coloque no lugar do que se deseja projetar, pois o fim de qualquer campanha é a venda. Todos os dias, a propaganda fala com pessoas diferentes, levando interesses a públicos distintos. É um imprinting diferente do escritor e do músico, que vivem de sua arte e têm uma linha de criatividade e estilo próprios. Portanto eu não me considero uma pessoa criativa, eu me considero uma pessoa associativa, porque foi por associações que cheguei a este framework, que nada mais é que uma leitura própria e uma adaptação de outros frameworks por mim estudados. Ajustei-o para uma forma que funcione melhor à nossa rotina com criatividade em comunicação e propaganda.

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