Teoria U (Kit Fora da Caixa)

Alex Bretas
Educação Fora da Caixa
5 min readJun 12, 2015

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Fonte: Social Foresight Network.

Aprendendo com o futuro que quer nascer

A Teoria U, sistematizada por Otto Scharmer em 2006, é uma metodologia voltada para a transformação social profunda. A crença principal que a alimenta é a de que a qualidade da mudança gerada por qualquer intervenção ou projeto é uma função da consciência e do nível de atenção das pessoas envolvidas. Consciência e atenção, aqui, remetem à “fonte” ou ao “lugar interior” (“inner place”) a partir do qual todas as nossas ações tomam forma.

Para os utilizadores da Teoria U, quanto mais nos conectarmos autenticamente ao nosso lugar interior e estarmos fincados nas experiências do presente, maior tende a ser a qualidade de nossas intervenções sociais ou organizacionais.

Por quê?

Bill O’Brien, ex-CEO da Hanover Insurance, compartilhou numa entrevista a essência dos seus aprendizados em relação à mudança organizacional: “o sucesso de uma intervenção depende da condição interna do interventor”. O insight ressoou em Otto Scharmer, que iniciou uma jornada em busca dos elementos que conformam nossa condição interna. No nível coletivo, essa estrutura subjacente ou lugar interior também se apresenta — sistemicamente — e é responsável pelas realidades que criamos. No cotidiano não somos capazes de percebê-lo, são pontos cegos. Conforme nos mostra Maria Angélica Rente:

“A grande questão que Scharmer apresenta é que todos os sistemas atuais — saúde, finanças, educação etc — caracterizam-se pelo fato de que, coletivamente, estamos criando resultados que não queremos. Isto ocorre porque operamos a partir de paradigmas de pensamento obsoletos, que embasam nossos comportamentos, crenças e atitudes, perpetuando uma realidade que não condiz ao futuro que quer emergir”.

Operar a partir do passado, portanto, é o “vício” que a Teoria U propõe-se a transcender. Para tanto, é preciso aprender a partir do futuro que emerge, e isso se faz por meio da conexão profunda com o momento presente. As expressões “deixar ir” e “deixar vir” revelam justamente isso: mover-se das nossas noções preconcebidas para um lugar que estimule a criação de novas realidades.

Com o objetivo de abastecer quem se conecta com esse propósito, a Teoria U apresenta uma série de métodos e ferramentas ancorados no arquétipo do U. O elemento comum de todas as práticas é o “presencing”, um neologismo que mescla as palavras “presence” e “sensing” e guia as ações a partir do potencial de futuro mais promissor de cada um. O propósito maior desta jornada é sair de uma consciência egossistêmica para se chegar numa outra, ecossistêmica.

Como?

Fonte: RQ Genesis.

A Teoria U pode ser melhor compreendida por meio de 8 princípios de aplicação que são descritos a seguir (para mais detalhes, veja este link do Presencing Institute, em inglês):

1. A energia segue a nossa atenção.

2. Siga os três movimentos do U.

  • O primeiro movimento é “observar, observar, observar” (a descida do U). A ideia é imergir totalmente nos limites do sistema, isto é, nos locais e situações mais significativas para a questão na qual você está interessado.
  • O segundo é “recuar e refletir” (o ponto mais fundo do U). É preciso tomar alguma distância e escutar o que as observações podem revelar sobre o futuro que quer emergir. “O que quer emergir aqui?”; “Como nós podemos fazer parte da história do futuro ao invés de continuarmos repetindo a história do passado?”
  • O terceiro é “agir num instante” (a subida do U). A ideia é explorar as possibilidades de futuro por meio da ação, desenvolvendo protótipos que consigam coletar feedbacks rapidamente de todas as partes interessadas na questão.

3. Vá aos limites do ego.

Mente aberta, coração aberto e vontade aberta.

4. Passe pelo “buraco de agulha”.

O buraco da agulha é o ponto mais fundo e mais crítico da jornada do U. Trata-se de uma imagem para nos lembrar o quão importante é “deixar ir” as noções do passado, abandonando tudo que não for essencial para construir o futuro que deseja emergir.

5. Transforme os três inimigos.

A voz do julgamento, a voz do cinismo e a voz do medo (que se opõem respectivamente à mente aberta, ao coração aberto e à vontade aberta).

6. Sempre comece percebendo as fendas.

As fendas são onde o futuro aparece primeiro, e percebê-las significa prestar atenção aos nossos sentimentos e às nossas ações, para além do pensamento analítico.

7. Transforme as conversações do “downloading” e do debate para o diálogo e a criação coletiva.

8. Fortaleça as fontes do “presencing” para evitar as dinâmicas destrutivas do “absencing”.

O “absencing” é a força contrária ao “presencing” e manifesta-se por meio das três vozes inimigas descritas no princípio 5. Mais precisamente, se ficarmos presos a uma verdade única, bloqueamos a mente; se nos atermos à visão de que somos ‘nós” contra “eles”, obstruímos o coração aberto; e se agirmos a partir de uma identidade muito rígida, desprezamos a vontade aberta.

Tive a experiência de trabalhar com a Teoria U em alguns projetos sociais. O que mais me chamou atenção foi a sua capacidade de nivelar as compreensões das diversas partes interessadas na questão com a qual estávamos envolvidos. Quanto mais complexas as realidades, mais força tende a ter a aplicação da Teoria U.

Assim como o Dragon Dreaming e a Investigação Apreciativa, a Teoria U é um conjunto de princípios, processos e práticas para abordar desafios coletivos. Desde uma pequena escola ou comunidade até um estado ou país inteiro, aplicá-la pode levar o sistema a fazer novas perguntas, e por consequência, obter novas respostas.

Para saber mais:

Este texto faz parte da série especial do Kit Educação Fora da Caixa, que aborda diversas ferramentas educacionais inovadoras. Navegue no blog para ver tudo o que já publicamos.

Para saber mais sobre mim, acesse o site www.alexbretas.com.

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Alex Bretas
Educação Fora da Caixa

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.