Como avaliar o potencial de uma ideia?

Felipe Sertorio
EquitasVC
Published in
5 min readApr 7, 2022

Como parte do trabalho de investidor em um fundo de Venture Capital, recebo diariamente inúmeras startups buscando capital, dos mais variados setores, fundadas por empreendedores de diferentes backgrounds.

Apesar das diferenças, todos têm algo em comum: uma ideia que pode se transformar em uma companhia que valha bilhões de dólares. No entanto, como sabemos, a probabilidade de isso acontecer é muito baixa, tende a zero.

Nesse cenário, como saber se uma ideia tem ou não potencial??

Antes de seguirmos, vale o disclaimer de que, a ideia por si só, tem pouquíssimo valor. Empresas de sucesso são construídas por grandes times, uma excelente execução, e, porque não dizer, um pouquinho de sorte, certo?

De qualquer forma, todas elas começam de um ponto de partida, isto é, uma ideia. Ideias de startups nada mais são do que hipóteses de como a empresa pode crescer de maneira acelerada.

Para simplificar, podemos quebrar uma ideia em três partes:

  1. Problema a ser atacado
  2. Solução para o problema
  3. Time que desenvolverá a solução

Em relação ao problema a ser atacado, nós, como investidores, gostamos de identificar os seguintes aspectos:

  • Contexto: quais são as condições atuais que fazem com que o problema seja relevante? Há alguma mudança recente no ambiente, em termos tecnológicos, sociais, regulatórios etc., que auxilia na existência / importância do problema?
  • Tamanho e crescimento: Os bons problemas de ser atacados são os populares, isto é, um grande número de pessoas / empresas sofrem com eles e querem que desapareçam (e estão dispostos a pagar por isso). De preferência, são os problemas que crescem e ficam mais relevantes com o tempo
  • Urgência e frequência: Os melhores problemas são aqueles que precisam, urgentemente, ser resolvidos, do ponto de vista de quem sofre com eles. Além disso, são notados frequentemente, idealmente várias vezes ao dia, pois são esses que estão sempre na cabeça do potencial cliente

No mundo ideal, uma ideia deveria preencher os três itens. Porém, com 1 ou 2 itens já dá para se animar. No entanto, caso a sua não esteja preenchendo nenhum dos requisitos acima, a probabilidade de sua startup não atingir um crescimento exponencial é alta.

Apenas um parêntese, a melhor forma de classificar o problema é conversando com seu cliente / potencial cliente. Para ajudá-los, escrevemos um artigo chamado “Como validar (de verdade) a dor que sua startup resolve”, com diversas dicas e boas práticas do que fazer para extrair informações valiosas das entrevistas.

Seguindo para a segunda parte, da solução para o problema identificado, a principal dica é: NÃO COMECE POR AQUI!!

Pode parecer óbvio, mas o que mais me deparo, principalmente com fundadores mais técnicos, é um apego grande por um tipo de tecnologia ou de solução, mas que não resolve um problema de fato (ou, se resolve, não é um problema relevante). Nesses casos, a empreitada pode até ser bem-sucedida, mas as chances caem drasticamente.

Portanto, recomendo construir uma solução apenas depois de validar um problema do tipo “cabelo pegando fogo”, isto é, que apresente as características citadas acima.

Para finalizar a construção de uma boa ideia, o terceiro fator é o time que desenvolverá a solução. Esta parte merece uma atenção especial, à medida que, como dito no início do texto, mesmo que haja um problema relevante e uma proposta de solução para ele, caso as pessoas envolvidas não estejam adequadas, dificilmente teremos um empreendimento de sucesso.

Gostamos de avaliar esse ponto como founder / market fit, ou seja, o quão adequado o time está para atender ao mercado escolhido? Se a resposta for pouco adequado, vale repensar a ideia (ou o time, se for o caso).

Além disso, uma vantagem muito grande (às vezes inclusive o maior diferencial de uma startup) pode ser o conhecimento dos founders no setor em que estejam atuando. Quando encontramos empreendedores atacando problemas que eles mesmos possuem, construindo soluções que eles mesmos anseiam, vemos isso com bons olhos, pois é um indício de que o problema de fato existe e, provavelmente, outras pessoas / empresas também o possuem.

Passados os três pontos, o próximo passo para avaliarmos boas ideias é identificando quais são suas vantagens competitivas, que são classificadas em:

1. Conhecimento técnico do time

  • Como citado anteriormente, quando os empreendedores possuem conhecimentos específicos, que os diferencie de outras pessoas que estejam tentando atacar o mesmo problema, isto pode ser uma ótima vantagem competitiva

2. Produto (10x ou +) melhor que outras soluções

  • Caso seu produto seja (10x ou +) melhor, isto é, 10x mais barato, 10x mais rápido, 10x mais forte, isto te deixará em ótimas condições de conquistar o cliente
  • Esse diferencial deve ser perceptível até para leigos. Qualquer um, com pouco conhecimento, deve conseguir identificar a superioridade do seu produto / serviço frente aos concorrentes
  • Obviamente não será com um MVP que essa vantagem será alcançada. No entanto, é importante, desde o início, identificar o que seu cliente mais valoriza e focar para entregar o melhor resultado nesse sentido

3. Poder de aquisição “orgânica” de clientes

  • Fontes de aquisições orgânicas mostram que sua empresa possui um bom poder de branding, o que aumenta a barreira de entrada de competidores e consequentemente a rentabilidade do seu modelo de negócio
  • Na fase early-stage que estamos falando, muitas startups não possuem capital suficiente para investir em marketing e growth, o que, muitas vezes, pode ser ótimo, pois obriga os founders a ser criativos e a desenvolver canais orgânicos de aquisição
  • Canais pagos são uma boa opção, principalmente no momento de crescimento e expansão, porém ficar altamente dependente deles pode te deixar em uma posição mais fragilizada em relação à entrada de concorrentes mais capitalizados

4. Escalabilidade e monopólio

  • Há alguns modelos de negócio, principalmente aqueles relacionados com “efeito de rede” e “marketplace”, que criam barreiras de entrada à medida que a startup cresça e ganhe relevância
  • Esses modelos são interessantes principalmente quando sua ideia é ser o first-mover. Lá na frente isso pode ser uma vantagem importantíssima e uma barreira de entrada contra potenciais competidores

Novamente, no mundo ideal, sua ideia teria todas as vantagens competitivas descritas acima. Porém, vemos que, com mais de uma, a chance de sucesso já aumenta de forma relevante. Caso você não consiga identificar em sua startup nenhuma das vantagens acima, seu caminho provavelmente será mais difícil.

Como investidor, saber identificar essas características nas oportunidades de investimentos que aparecem é fundamental. Contudo, vale sempre ressaltar que uma startup é um tipo de empresa construída para mudar e se adaptar de maneira muito rápida e, portanto, mesmo que um time ainda não tenha encontrado boas ideias para seguir, isso não significa, de maneira alguma, que não haja potencial no projeto.

Como referência para esse texto (e para nosso trabalho), utilizamos o material do YCombinator.

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