O dialeto do amor

Laura Poffo
Essentia
Published in
7 min readOct 23, 2020

Por causa de uma onda de filmes, músicas e alguns outros clichês, acreditamos que o amor tem apenas “três palavras”. É como se, uma vez dito, o “eu te amo” fosse capaz de desencadear uma série de efeitos mágicos na nossa vida, abastecendo o nosso tanque emocional para sempre. Mas nos esquecemos que o amor, antes de tudo, precisa ser cultivado no dia a dia, com palavras e declarações constantemente dedicadas à pessoa amada.

Antes de continuar lendo este artigo, recomendamos que reflita sobre as diferenças entre o amor e a paixão. Será importante entender que os temas as seguir devem ser sustentados por escolhas racionais e conscientes, não por impulsos passionais.

De acordo com Gary Chapman, o amor pode se expressar por meio de cinco linguagens: palavras de afirmação, qualidade de tempo, presentes, atos de serviço e toque. E hoje vamos falar daquelas que passam despercebidas na rotina, mas são essenciais para cultivar o amor eterno: palavras de afirmação.

O vocabulário de quem ama

Quantas vezes não nos arrependemos de não termos dito a palavra certa para a pessoa certa? Por um momento de vergonha ou vaidade, perdemos a chance de nos mostrarmos vulneráveis e de dizer ao outro como realmente nos sentimos. São várias as situações em que poderíamos ter tratado alguém com mais carinho ou zelo — especialmente em se tratando de alguém que amamos profundamente. Então como podemos nos prevenir de palavras amargas ou mal interpretadas?

Elogios verbais e palavras de apreciação são grandes comunicadores do amor. E quanto mais simples e diretos, melhor! Dessa forma, a mensagem será captada por aquele que amamos com segurança e clareza. Se você já teve a oportunidade, basta lembrar da primeira vez que falou “eu te amo” e como foi capaz de sintetizar, numa frase simples (mas poderosa), tudo que sentia pelo outro.

Segundo Chapman, antes de dominar qualquer vocabulário, precisamos compreender o objetivo do amor: ele não está em conseguir algo que deseja, mas fazer alguma coisa pelo bem-estar daquele a quem ama. Por isso, de nada adianta criar milhares de elogios para cair no vício da bajulação, pois o seu fim sempre será egoísta.

Tendo isso em mente, vamos trabalhar as três classes gramaticais do amor: palavras encorajadoras, bondosas e humildes.

Palavras encorajadoras

Em certas fases da vida, todos nós nos sentimos inseguros. Perdemos a coragem e ganhamos um medo paralisante no lugar, que nos impede de realizar grandes sonhos e objetivos. Uma justificativa aqui e ali, e deixamos de nos arriscar, adormecendo a nossa capacidade de crescer. E talvez a pessoa que você ama esteja passando por isso neste exato momento.

Contudo, uma companhia amorosa pode ser um grande catalisador de grandes descobertas. Uma simples palavra de apoio vinda do seu coração pode promover uma série de decisões importantes na vida de quem você ama.

É natural que seja difícil falar palavras construtivas e encorajadoras. Pode ser pelo fato de não ser a sua primeira linguagem de amor, ou por um vício em palavras críticas e reprovatórias. Porém todo o seu esforço será recompensado com o crescimento da pessoa amada.

Para praticar as palavras encorajadoras, há uma condição muito importante. Somente quando a pessoa, por si mesma, decide buscar um objetivo é que deve ser encorajada. Caso contrário, suas palavras serão apenas mais um sermão sobre o que ela está deixando de fazer. O resultado, então, passa a ser reprovação, distanciamento e rejeição, não mais o amor.

O segredo está em uma pequena e simples atitude: se colocar no lugar do outro. Ver o mundo como a pessoa amada o vê. Entender quais são suas prioridades e o que é importante para ela. A partir disso, você poderá dizer, em poucas palavras, o quanto você se preocupa e dispõe a ajudar — sem precisar de um grande discurso. É acreditar em suas habilidades, dar credibilidade às suas lutas e celebrar as suas conquistas, acompanhadas diariamente por você.

Palavras bondosas

Palavras gentis e bem pensadas são como um convite à escuta e à bondade. E falar sobre o que você sente é uma intimidade confiada somente à pessoa amada. Nesse sentido, podemos compartilhar mágoas e feridas de maneira meiga, e a mensagem ainda será uma manifestação de amor. Os dois, então, vão dar um grande passo no caminho da cumplicidade.

Por que não usar palavras à altura do amor que sentimos? O que nos impede de fazer isso?

O tom de voz é um grande indicativo dos sentimentos do outro. Quando ele usar palavras agressivas, busque permanecer gentil. Não só você será capaz de manter a calma, como também entenderá melhor os sentimentos que se passam dentro dele. Entenda que a forma como ele conversa é uma expressão de seu estado emocional. É o que ele tem guardado e precisa externar de seus sentimentos e sua percepção.

Busque enxergar seu ponto de vista e expresse sua opinião com gentileza e bondade, conciliando opiniões e resolvendo erros de ambas as partes. Lembre-se de que você não está num debate lógico, frio e calculista: é com a pessoa que você mais ama, respeita e considera que você está falando. Dê a devida dignidade a cada diálogo que compartilham.

Compreenda, assim, que o amor não é uma lista de erros, medida e calculada a cada passo. Isso seria apenas uma condenação eterna e sufocante.

Perdão, o irmão da bondade

Como um forte adendo às palavras bondosas, devemos mencionar as palavras de perdão, suas grandes aliadas. Diante do erro (tanto nosso como do outro), temos duas opções: justiça ou perdão. Ser juiz da pessoa amada ou seguir pelo caminho do amor, que é perdoar sempre e cada vez mais.

Trate o passado da forma que merece: sendo deixado para trás como fundamento para o futuro, com seus devidos reparos para ambos os lados. Sem orgulho ou rancor a tiracolo. Por isso, não deixe que o dia de hoje se misture com o ontem. Não há por que trazer erros do passado para o presente, arruinando dias maravilhosos com quem se ama. A melhor coisa que podemos fazer com os fracassos do passado é torná-los em simples história.

Havia uma época em que, se um vaso rachava, a gente consertava. Hoje, se ele quebra, é só comprar outro.

Erramos, reconhecemos, perdoamos e seguimos o curso. Com essa simples receita, colocamos as coisas em seu devido lugar e construímos um amor maduro e respeitoso. Percebemos, então, que o perdão não é um sentimento, mas um compromisso. É a opção de se mostrar misericórdia e não de se jogar a ofensa no rosto do ofensor. O perdão, portanto, é uma expressão de amor.

Palavras humildes

O amor faz pedidos, não imposições. Quando damos ordens ao outro, nos tornamos seu pai e ele uma criança de três anos de idade. Mas numa relação adulta, é preciso se comportar como tal. O amor nunca é sobre domínio, mas companheirismo e conciliação equivalentes. Precisamos entender o que se passa no coração do outro e conciliar expectativas e desejos.

"Se queremos amar um ao outro, precisamos saber como fazê-lo."

– Gary Chapman

Se colocamos nossas vontades como ordens, eliminamos as possibilidades da intimidade e afugentamos a pessoa amada. Se, no entanto, expressarmos necessidades e desejos como pedidos, apontaremos um caminho — mas não empurraremos ninguém para ele.

O amor, portanto, será sempre uma decisão. Seu parceiro pode atender ou não o seu pedido, porque o amor é sempre uma escolha. É isso que o torna significativo. Como consequência natural, um pedido cria uma oportunidade de se expressar amor, ao passo que uma ordem sufoca essa possibilidade.

Palavras finais

Somos todos semianalfabetos no amor: nós podemos vê-lo em nossa frente, mas não seremos capazes de o compreender se não buscarmos praticá-lo com o outro.

O psicólogo William James afirma que, possivelmente, a mais profunda necessidade humana é a de ser apreciado. E as palavras de afirmação poderão suprir essa necessidade em muitas pessoas — especialmente naquela que mais amamos.

Por isso, se permita conhecer o vocabulário do amor. Ele está repleto de detalhes e presentes escondidos em cada adjetivo, frase ou declaração dita à pessoa amada. Busque explorar, lado a lado de quem ama, esse idioma repleto de oportunidades.

“Ainda que eu falasse a lí­ngua do homens e falasse a lí­ngua do anjos, sem amor eu nada seria.”

Referências

  1. Teste — Descubra a sua linguagem do Amor
  2. Cinco Linguagens do Amor — Gary Chapman
  3. Sentido da Vida — Vitor Frankl
  4. O poder da vulnerabilidade — Brené Brown

--

--

Laura Poffo
Essentia

Cinéfila, maratonista de séries e apaixonada pela realização de grandes histórias. Também escreve sobre relações humanas em Essentia.