Mulheres que Correm com os Lobos: um capítulo para viver e superar fossa
Resumo e trechos: o que eu sublinhei do capítulo 5 do livro de Clarissa Pinkola Estés e queria que várias amigas lessem
Na época em que eu pedia um montão de conselho de amiga, pelo menos três delas me sugeriram a leitura do já clássico “Mulheres que Correm com os Lobos”, da psicanalista estadunidense Clarissa Pinkola Estés. O livro gordão interpreta contos e lendas sob um perspectiva junguiana chegando a definições do instinto mais natural da Mulher Selvagem.
A autora gosta de comparar as mulheres às lobas e a partir dessa ótica vai abordando e afirmando em cada capítulo, após apresentar um conto, os pontos mais intrigantes e às vezes confusos da psique feminina.
O capítulo 5 (A caçada: Quando o coração é um caçador solitário) foi onde eu encasquetei. E foi aí também que percebi para mim não vai rolar ler esse livrão de uma só vez. Me pareceu aquele tipo de leitura que tem a hora certa da vida para cada capítulo. Falar de Jung, pode dar um tom intelectual demais, adianto que não é o caso dessa obra. Basta ler com calma que você vai sacar o que eu quero dizer.
E o quinto capítulo me caiu como um luva. Li, reli grifando. Minha vontade real era sintetizar todo esse conteúdo em uma cápsula de remédio e dar de presente para um tanto de amiga, que assim como eu, ficariam muito bem após a leitura (porque ninguém merece amiga insistindo para que você leia o tal capítulo, né?). O máximo que eu consegui foi usar o meu senso de interpretação de texto e minha boa vontade com o Medium para um resumão das 39 páginas desse trecho.
Resumo de Mulheres Que Correm com os Lobos (capítulo 5)
O capítulo 5 fala o tempo todo sobre encarar a natureza da vida-morte-vida do amor, e o mais importante: aceitar. Clarissa Pinkola usa como apoio a lenda da Mulher-Esqueleto, que é em suma a história de um pescador que pesca o cadáver de uma mulher, corre apavorado com a carcaça atrelada a ele, passado um tempo, com calma, resolve desenroscar e acaba vivendo uma paixão fazendo com que a caveira volte a ser mulher. Contando assim e lendo o conto sozinho a história parece bem macabra. Mas a interpretação de Clarissa é muito das lindas.
“A natureza da vida-morte-vida é um ciclo de animação, desenvolvimento, declínio e morte…”
É nessa tecla que a autora bate o tempo todo e nos convence que se um relacionamento está nos seus suspiros finais, é preciso deixar morrer. Só assim pode nascer de novo. E não tem como fugir disso. Para ela, nós, assim como as lobas, passeamos por picos e vales. Eles existem e nada move as montanhas, mas nós sim nos movemos com a caminhada.
Frases do livro "Mulheres Que Correm com Os Lobos'
A autora frisa o fato de que quando escolhemos nos jogar em um relacionamento, escolhemos também viver o tempo todo com essa morte. Dormimos ao lado da morte e essa é a natureza do ciclo. O consolo, nas palavras dela, é:
“A morte está sempre no processo de incubar uma vida nova, mesmo quando nossa existência foi retaliada em ossos.”
E assim devemos então deixar de encarar vida e morte como opostos e passar a interpretá-los como forças complementares. Esquerda e direita. Quando uma termina, começa a outra.
E mais. O tal renascer que vem depois da morte, quando encarado dentro de um relacionamento, pode muito bem acontecer com o mesmo par. Mesmas pessoas, outro relacionamento. Só deixando morrer é que se nasce de novo.
É com esse jeitinho que ela explica aquele trauma que a maior galera tem de entrar em novos relacionamentos. O ciclo da morte é conhecido, envolve dor. O que faz com o que o nosso conhecimento da natureza da tal vida-morte-vida seja contaminado pelo medo.
O capítulo segue passando por todos os estágios desse amor romântico.
- Descoberta da outra pessoa como uma espécie de tesouro espiritual;
- Entre esperanças e receios: caça e tentativa de ocultação;
- Aceitar os riscos;
- Confiar;
- Relaxar;
- Compartilhar sonhos e tristezas e automaticamente curar feridas passadas que ainda não cicatrizaram;
“A ligação iniciada com toda a boa vontade oscila e balança quando o estágio de ‘enamoramento’ se encerra.”
O que erroneamente tentam fazer a partir do momento em que a natureza da morte se manifesta na sua hora de agir é tentar jogar essa “Mulher-esqueleto” do penhasco. Na minha interpretação, a famosa forçação de barra. Na de Clarissa, uma tentativa de prazer a qualquer custo mesmo que as coisas não estejam bem. E então:
O desejo de forçar o amor a prosseguir somente no seu aspecto mais positivo é o que o amor acabe morrendo, e para sempre.
O desafio do pescador é o de encarar A Morte, seu abraço e seus ciclos de vida e morte.
A partir dessa ótica o amor passa a ser encarado então como um ato de coragem. E sua natureza mortífera é justamente surgir na hora da calmaria após o sentimento “Velho e o Mar”, quando finalmente fisgou um peixe grande que pode te saciar para o resto da vida.
Quando percebemos que talvez esse peixão não nos alimente sem nosso esforço para todo o sempre vem a luta e o desespero. Aquela vara envergada pelo suposto peixão na verdade tem uma Mulher-Esqueleto se debatendo.
E quando ela chega à superfície, o primeiro impulso é se assustar com a sua aparência e tentar fugir. Quanto mais rápido se tenta correr disso, mais rápido se arrasta a morte que está emaranhada na varinha. Ela vai se machucando pelo caminho e ficando ainda mais feia e assustadora do que se tivesse sido encarada de frente ao primeiro momento.
“No final, todos temos de beijar a megera.”
Aceitar soa simples, mas quem já viveu fim de relacionamento sabe que não é. Só se pode aceitar que acabou quando se entende que acabou. A esse processo a autora faz analogia ao ato de desembaraçar o esqueleto que ficou preso nas redes do pescador. Tocar no que já está em estado de decomposição, coração ferido, é assustador. Vai dar medo.
E é esse exato medo do contato com a dona morte que não deixa as coisas seguirem o curso natural. Quando você desembaraçar essa caveira, verá que é feia, mas nem tanto. Que pode sim olhar no fundo do buraco dos olhos e ter a certeza de que ela está ali pronta para a vida-morte-vida.
Minha síntese dos grifos do capítulo termina com uma anotação na orelha do livro. Em algum momento da minha leitura eu achei importante separar essas duas palavras por um símbolo:
alma ≠ ego
Para levar para quando chegar o estágio da vida que vem depois da vida-morte. Essa anotaçãozinha foi tão forte que sabe o quê? Sabe que eu nem sei se escrevi esse texto para tirar um peso da alma ou deixar o ego mais alimentado.
Só sei que tá aí e que eu resolvi não falar de metade do capítulo pois ficaria muito grande. Sei que é melhor eu postar agora, antes que eu me arrependa e tente jogar essa caveira pelo abismo. Hoje, vamos dormir juntas.
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Também sobre ‘Mulheres Que Correm Com Os Lobos (capítulo sobre intuição):
15 frases de Clarissa Pinkola Estés
Além dos trechos já destacados no decorrer deste texto, aqui estão outras frases que grifei do capítulo 5 de Mulheres Que Correm Com os Lobos:
- “… se quisermos ser alimentados por toda a vida, precisaremos encarar e desenvolver um tipo de relacionamento com a natureza da vida-morte-vida.”
- “Essa história é uma imagem adequada para o problema do amor moderno, o medo da vida-morte-vida, em especial o aspecto da morte”
- “É fato que dentro de um relacionamento amoroso existem muitos finais.”
- “Quando uma respiração termina, outra se inicia.”
- “Finalmente, o uso do coração para fazer brotar uma nova vida nova e a fusão do corpo e da alma.”
- “Depois, cabe á sua alma a tarefa de não ignorar o que veio à tona, de reconhecer o tesou pelo que ele for, não importando o quanto a sua apresentação for inusitada, e de refletir com cuidado acerca do que fará em seguida.”
- “Uma parte de cada mulher e de cada homem resiste ao conhecimento de que a morte deve participar de todos os relacionamentos de amor.”
- “Se os dois parceiros não puderem suportar esses processos da vida-morte-vida, não poderão se amar além das aspirações hormonais.”
- “O amor tem seu custo. Ele exige coragem.”
- “Amar significa ficar com. Significa emergir de um mundo de fantasia para um mundo em que o amor duradouro é possível, cara a cara, ossos a ossos, um amor de devoção. Amar significa ficar quando cada célula nos manda fugir.”
- “O que se teme pode fortalecer. Pode curar.”
- “Há uma enorme diferença entre a necessidade de solidão e renovação e o desejo de ‘dar um tempo’ para evitar a inevitável ligação com a Mulher-Esqueleto.”
- “Se for amor que estivermos nos dedicando, muito embora nos sintamos apreensivos ou assustados, estaremos dispostos a desembaraçar a linha dos osso da natureza da morte.”
- “O medo é uma desculpa insuficiente para não realizar essa tarefa.”
O que significa ‘correr com os lobos’?
Sim, a expressão ‘correr com os lobos’ vem da obra de Clarissa Pinkola Estés, mas não tem um significado dos mais objetivos. Tem a ver com a constante comparação, já explicada aqui, ao decorrer de cada capítulo, da psique de uma mulher ‘saudável’ e a psique dos lobos. Ambos (apesar de nem sempre reconhecermos) somos criaturas extremamente intuitivas, temos capacidade de devoção, um equilíbrio ternural, conexão com a natureza, conseguimos nos adaptar a diferentes circunstâncias e temos uma força que vai muito além do nosso conhecimento, assim como a nossa coragem feroz e aptidão orgânica de cuidar da nossa cria, nossa matilha e nossa parceria.
Outros livros de Clarrissa Pinkola Estés
- Mulheres Que Correm Com Os Lobos: em inglês, para quem gosta de versão original;
- A Ciranda das Mulheres Sábias
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