Usina São Manoel amplia impactos no rio Teles Pires

Empresa antecipou o início dos testes da primeira turbina sem comunicar as comunidades que recebem diretamente os impactos da usina.

Fórum Teles Pires
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4 min readDec 10, 2017

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Nível do rio com vista para Aldeia Teles Pires ( Foto : Caio Mota)

A Empresa de Energia São Manoel (EESM) iniciou, no dia 5 de dezembro, uma nova fase de testes. A primeira turbina da usina começou a funcionar e conectou o empreendimento ao Sistema Interligado Nacional (SIN). O fato amplia as violações socioambientais na região, já que a empresa continua sem comunicar as comunidades sobre as operações e não realiza ações de mitigação dos impactos provocados pelos testes.

Desde agosto, o nível do rio Teles Pires tem sido alterado drasticamente. As comunidades que vivem no rio relatam que as águas descem e sobem de forma repentina por algumas horas, algo similar ao efeito de uma maré. O IBAMA emitiu a Licença de Operação da usina no dia 5 de setembro. Os primeiros relatos sobre mudanças no nível das águas surgiram antes da concessão da licença, fato que indica um possível início da fase de testes da usina antes da empresa ter a autorização legal, o que configura mais uma violação da legislação ambiental.

O Fórum Teles Pires encaminhou uma denúncia ao Ministério Público Federal (MPF), FUNAI e IBAMA, no dia 11 de setembro, enumerando as irregularidades cometidas pela EESM. As comunidades indígenas protocolaram, nos últimos três meses, três cartas pedindo o cancelamento da Licença de Operação e abertura de diálogo com o governo para buscar reverter os processos de violações que estão acontecendo.

Em outubro, o Ministério Público Federal de Mato Grosso (MPF/MT), considerando as diversas ilegalidades no processo de licenciamento ambiental da Usina São Manoel, expediu recomendação ao IBAMA para anular a Licença de Operação (LO) do empreendimento, mas a recomendação ministerial não foi acatada pelo órgão ambiental.

Leia na íntegra o documento emitido pelo procurador da República Malê de Aragão Frazão, do MPF Sinop, no Mato Grosso: clique aqui.

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A usina São Manoel fica a 700 metros da terra indígena Kayabi. Tem um custo aproximado de R$ 3,3 bilhões. Faz parte de um consórcio formado pela empresa chinesa ‘Three Gorges’, pela portuguesa ‘EDP’ e pela estatal Furnas, do Grupo Eletrobrás.

Comunicação enganosa e chantagens

No mês de julho de 2017, a EESM iniciou uma campanha publicitária que informava sobre o início do enchimento do reservatório da UHE São Manoel. O enchimento do lago está atrelado à concessão da Licença de Operação (LO), que até aquele momento não havia sido concedida pelo IBAMA. Diante dessa publicidade enganosa, o MPF recomendou que a empresa pedisse desculpas à população e corrigisse a informação, sob pena de responder judicialmente.

campanha publicitária na cidade de Alta Floresta — MT ( foto: Forum Teles Pires)

A ação publicitária da UHE São Manoel sobre o enchimento do reservatório é um exemplo de que a desinformação e falta de transparência são táticas para excluir as populações atingidas pelas barragens de qualquer debate sobre seus direitos.

Outra tática denunciada pelos indígenas é a da prática da chantagem. A empresa busca ‘negociar’ os direitos já adquiridos das comunidades em receber materiais como voadeiras, motores e outros produtos previstos no Programa Básico Ambiental Indígena (PBAI), que é uma obrigação do empreendimento para mitigar os impactos que causa.

A forma arbitrária de elaboração, a execução e o acompanhamento do PBAI é outro exemplo de ilegalidade cometida no processo de licenciamento da Usina São Manoel. Da mesma forma que todo o processo de licenciamento violou o direito de consulta e consentimento livre, prévio e informado dos indígenas atingidos pelo empreendimento, o que traz a violação de diversos outros direitos. O PBAI não foi construído juntamente com os indígenas, em descumprimento à condicionante da FUNAI.

A forma não participativa de elaboração do PBAI faz com que o programa seja insuficiente para mitigar os impactos das violações causadas pelo empreendimento. Mesmo assim, a empresa está obrigada a cumprir a execução do cronograma do PBAI apresentado, como uma condição obrigatória para a manter a licença. Mas a postura da EESM tem sido de chantagear os indígenas para descumprir o que está no programa.

O IBAMA e o MME fazem vistas grossas a toda essa cadeia de violações aos direitos, mantendo o discurso de estarem cumprindo toda a legislação mesmo que o Ministério Público Federal venha fiscalizando o licenciamento e apontado diversas infrações.

De acordo com matéria publicada no Canal Energia, a EESM está antecipando o prazo para entrar em funcionamento. Com os testes realizados em dezembro, a empresa pretende começar a operar antes de maio de 2018, prazo que está estabelecido nos contratos de comercialização de energia elétrica, mantendo a posição de descaso com relação às demandas dos povos indígenas atingidos e desrespeito à legislação.

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Ação coletiva de enfrentamento das violações de direitos cometidas pelos empreendimentos hidrelétricas, na região do rio Teles Pires