Foto/arte: Marcos Paim

Blossom — Liberdade para desabrochar

Mulheres em flores

Carolina Assunção e Alves
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3 min readApr 4, 2018

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As flores nos fascinam porque nos colocam em contato com o belo e o efêmero. Elas sofrem metamorfoses, estão vulneráveis a todo tipo de impacto externo, normalmente têm vida curta. Para que durem mais, requerem cuidados. Daí começam a murchar, ficam enrugadas, se despetalam. Acabam. Então voltam a alimentar o solo de onde surgiram. Metáfora delicada da vida.

Pense no verbo desabrochar: desapertar — desabotoar — abrir — desprender — descerrar — romper — rebentar — eclodir — nascer — surgir — brotar são definições correlatas. Um processo simultâneo de ruptura e libertação.

Estou a falar de flores. Mas poderiam ser pessoas. Mulheres, talvez?

Foto/arte: Marcos Paim

Desabrochar é o conceito principal do ensaio fotográfico de Marcos Paim para o Projeto G-old, que aborda a temática do envelhecimento a partir de processos criativos multimidiáticos. Ele foi o primeiro a me fotografar, em novembro de 2017. Eu já não retocava os cabelos desde maio, seis meses sem tinta.

Foi o período inicial de raízes brancas à mostra. Nas interações do dia a dia, notei que alguns interlocutores, entre homens e mulheres, não se preocupavam em me olhar nos olhos, mas sim em investigar o meu couro cabeludo. Comecei a ser chamada de senhora com mais frequência, o que raramente acontecia até então. Achei curioso.

Paim capturou em minha proposta a tentativa de lidar com o peso descarregado sobre a mulher ao longo do inexorável passar do tempo. Em muitas situações e grupos sociais, há amarras a padrões pouco permissivos de aparência. Progressivamente recrudescentes. Difícil se libertar dessas algemas simbólicas. E assim deu-se a nossa construção:

O jovem autor criou uma identidade visual com saturação de cores para abordar as ideias de paixão, luta e empoderamento; as flores na cor violeta, para tratar, ao mesmo tempo, da delicadeza e da dor; o plástico para dar forma à asfixia e à artificialidade das exigências convencionais de beleza; e os cabelos mais acinzentados para destacar o amadurecimento, o pigmento para o novo e o futuro sem amarras.

Edição de vídeo: Marcos Paim — Trilha original: Ortus, por Murilo Oliveira — Maquiagem: Tyz Matos.

Palavras do artista a partir do processo criativo e do texto-base para o projeto:

“Tive um ideal de força feminina inserida em uma atmosfera surreal/onírica. Pude dar presença a uma personagem forte e madura que não se preocupa com preconceito e julgamentos. As cores, a roupa, a maquiagem e a cenografia funcionaram como representação da atmosfera manifestante, que valoriza a luta e a rigidez feminina.

Um estilo de manifestação ácida e gélida ao mesmo tempo. Um lado tem valor celestial, místico, e o outro consiste na brutalidade, nos sentimentos mais potencializados.

O tempo passa, as mulheres envelhecem, mas as conquistas e experiências são estampadas nas marcas físicas. O corpo e a mente se moldam com o tempo, e isso é a prova mais natural/espontânea da vida.” (Marcos Paim)

Saiba mais sobre o Projeto G-old.

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Carolina Assunção e Alves
Writer for

Jornalista, pesquisadora, Profa. Dra. em Linguística do texto e do discurso (UFMG), pós-doutorado em narrativas audiovisuais (CNRS-França).