Somos como bonecas russas

O que está debaixo da pele

Carolina Assunção e Alves
g-old
3 min readJul 23, 2018

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O corpo fala. Faz perguntas. Dá respostas e sinais. Preste atenção.

Foto: Tereza Nery Sá

Aprendi com psicanalistas e psiquiatras, nos tempos de telejornalista: certas doenças (se não quase todas) estão relacionadas ao modo como o organismo responde aos pensamentos e sentimentos. São as famosas patologias psicossomáticas.

Dentre elas estão as da pele, e não me esqueço da explicação da médica sobre os ataques aos tecidos epiteliais. Eles expressam o quanto nos desgastamos ou nos esfolamos por dentro para dar conta de demandas externas. Isso pode reverberar e explodir em erupções dermatológicas.

Na infância, tive asma, um problema das vias respiratórias que se transformou em psoríase crônica durante a adolescência, e que permanece na vida adulta. Raras vezes enfrentei crises mais severas, mas todas me avisaram que era preciso me descascar: arrancar cada camada superficial até chegar dentro de mim.

Ainda estou no caminho.

Tereza me fotografou em fevereiro de 2018, num dia de baixa imunidade. Depois de conhecer o projeto G-old, ela havia pedido que eu não usasse roupas além das íntimas para este ensaio.

Assim, olhos nos olhos, lentes a postos, a fotógrafa escolheu um conceito que envolvesse “o puro e simples — sem julgamentos”. O natural #nofilter, a luz da janela. Livre e à vontade.

O self no lugar da selfie. Significa.

Edição de vídeo: Tereza Nery Sá — Trilha: “Luminous Rain”, de Kevin MacLeod está licenciada sob uma licença Creative Commons Attribution (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/)
Origem: http://incompetech.com/music/royalty-free/index.html?isrc=USUAN1100169
Artista: http://incompetech.com/

A partir de meu texto sobre o envelhecimento, Tereza explica o conceito visual por ela criado:

"Enxergar-se sem barreira, sem medo. A ausência de vestes. A leveza de transbordar-se e ser. Apenas o perdão no meio do abraço entre o que se era até pouco tempo e o que está para partir rumo a novos ares. Ninguém faz as próprias unhas crescerem, os cabelos mudarem de cor. O poder que temos é o de saber lidar com o que há de chegar, uma hora ou outra.

Por se tratar de uma pessoa que diferentemente de si, tornou-se, naqueles momentos, muito mais ela mesma. E toda vez que alguém compartilha comigo o próprio tempo de vida para podermos juntas deixar registrado o nascer de um novo ser…

É como poder viver uma alegria pela primeira vez. Cada sarda, cada curva, cada textura. E tudo em direção à luz.

Reencontro. Reestabelecimento. Ressignificar." (Tereza Nery Sá)

Fotos: Tereza Nery Sá — Agredecimento: Rodrigo Andrade

Acho que assumir cabelos brancos é como apresentar o passar do tempo pela mente, a nudez do existir. De algo que não se quer esconder. O eu dentro do eu. O branco como reunião de todas as cores, em paz.

Inteira, #plena. Em busca daquilo que me basta. Que me falta. Que talvez eu não encontre nunca, embora esteja comigo.

Mas como diria Umberto Eco, o que importa é o percurso. O trajeto.

Foto: Tereza Nery Sá

Não por acaso:
Tereza
rima
com
Beleza.

Foto: Tereza Nery Sá

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Carolina Assunção e Alves
g-old
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Jornalista, pesquisadora, Profa. Dra. em Linguística do texto e do discurso (UFMG), pós-doutorado em narrativas audiovisuais (CNRS-França).