Tottenham 3x1 Aston Villa: o diamante que precisa ser lapidado

A vitória veio porque Poch jogou a joia para longe

HDL
Galo de Kalsa
6 min readAug 11, 2019

--

Sem dó no meio-campo | Foto: @spursofficial

Em um texto que reside no imaginário deste que vos escreve, e que nunca foi ao ar por incompetência minha (a não ser nessa thread minúscula que fiz no meu perfil no Twitter), comentava sobre o diamante do Tottenham. E esse cristal não era uma jovem promessa, mas sim um esquema.

O diamante é o meio-campo no 4–4–2 losango, que pode ser (e aqui será) chamado de 4–3–1–2 por economia de caracteres e metáforas. Ele apareceu em diversos momentos na temporada passada, começando naquele 3x0 contra o United. Desde então, Pochettino parece ter guardado um espacinho para o esquema no seu coração.

No jogo em Old Trafford, a equipe se apresentara em um 4–2–3–1 durante o primeiro tempo. A má atuação fez o treinador alternar para o esquema com o diamante no centro, e ele deu muito certo. Por quê? Porque Lucas Moura. O atacante passou a atuar ao lado de Harry Kane na frente, e aproveitou brilhantemente os espaços às costas da marcação, deixados pela movimentação do camisa 10, marcando dois gols e acabando com a partida.

Para ter espaço, o adversário precisa estar distante da área. Para funcionar o 4–3–1–2, ao que tudo indica, a altura da marcação também importa. Isso foi posto à prova na estreia da Premier League de 2019/20, contra o Aston Villa. A partida demonstrou que, caso Poch ainda queira usar seu diamante, ele precisa ser melhor lapidado.

O CERTO QUE DEU ERRADO

O diamante com Winks na ponta de trás, Ndombele na direita, Sissoko na esquerda e Lamela na frente

Antes do gol do Villa, o Tottenham criou boas oportunidades e pareceu bem no jogo. Muito disso foi por conta do meio-campo. Winks, na base, controlava o primeiro passe e oferecia o retorno. Na direita, Ndombele estava próximo de Winks, de onde partia com a bola dominada e podia superar a marcação com um drible ou um passe à frente. Do outro lado, Sissoko estava escalonado em uma altura mais próxima de Lamela, podendo receber a bola e correr em campo aberto. O argentino, por sua vez, se posicionava para receber o passe nas costas dos meias rivais e acionar o ataque.

Como a marcação não estava tão recuada (a segunda linha mais avançada do 4–1–4–1 está acompanhando Lamela), os Spurs encontravam espaços na entrelinha. O gol do Villa mudou tudo, porque o visitante — obviamente — baixou suas linhas. Isso sugou todas as forças do losango de Pochettino.

Mapa de posicionamento médio do Tottenham na partida | SofaScore

Atrás no placar, o Tottenham precisava quebrar a marcação baixa do visitante. Para isso, o diamante demonstrava-se insuficiente, o que fez os Spurs parecerem travados em vários momentos seguintes ao gol. Com um grande número de jogadores centralizados (como mostra o mapa ao lado), os laterais Walker-Peters (16) e Rose (3) eram os únicos que ocupavam os lados do campo, o que não é suficiente para espaçar — de modo decente — a marcação. Assim, o time tinha dificuldades para avançar no campo e criar oportunidades.

O INÍCIO DA REAÇÃO

O time passou a atacar em uma espécie de 3–2–5

O time reagiu quando o diamante foi quebrado. Atacando em um 3–2–5 (mais ou menos o que Sampaoli tem feito no Santos), foi possível criar superioridades rodando a bola de um lado para o outro. Com Winks sendo o responsável por inverter o lado da jogada, os triângulos formados por Ndombele-Rose-Kane e Sissoko-KWP-Lucas garantiram boas jogadas para o Tottenham.

No entanto, como mostra a imagem acima, manter Sissoko aberto não é o ideal. Com Walker-Peters por dentro, o francês foi acionado ao menos três vezes próximo da área, com espaço para cruzar. Logicamente, ele não tem esse atributo, e desperdiçou boas oportunidades criadas pela paciência no ataque posicional.

A formação se repetiu no início da segunda etapa, com Sissoko tendo vantagens no duelo físico contra o lateral esquerdo do Villa, Neil Taylor, mas falhando em entregar bons cruzamentos e chutes (aquele que foi pra lateral é um ótimo resumo disso). E, então, Eriksen entrou.

NOVA FORMAÇÃO E TRÊS GOLS

Com a entrada de Eriksen (em vermelho), o time ganhou uma nova dinâmica

Ao lado de Walker-Peters, Harry Winks vinha sendo o melhor em campo. Sua saída, no entanto, melhorou a equipe. Não por culpa dele, mas por culpa de Christian Eriksen. A entrada do camisa 23 modificou o esquema para um 4–2–3–1, centralizando Kane no ataque, abrindo Lamela na esquerda e, ufa, com Lucas na direita. Por dentro, o meia dinamarquês tinha a liberdade posicional para alternar entre ficar atrás do centroavante ou na base da jogada — como na imagem acima, em que está atrás da dupla de volantes Sissoko e Ndombele.

Assim, o time foi incisivo. De um lado, Lamela flutuava para dentro — quando com a bola, dando aquelas lambidinhas nela — e abria espaço para Rose avançar. Do outro, com Lucas sendo agudo e partindo para cima da marcação, tendo um Walker-Peters menos aberto e profundo, mais por dentro (como na imagem acima, que tem ele com a bola). Eriksen pensava o jogo, e ocupava os espaços necessários para garantir que o Tottenham teria vantagens.

O primeiro gol sai após uma bola parada do dinamarquês. O segundo, com uma pressão pós-perda de Lamela (talvez sua maior qualidade), que trabalhava atrás de Kane depois de fazer aquele movimento da esquerda para dentro.

Melhor ainda foi o terceiro gol. O novo posicionamento de Sissoko permitiu que um contra-golpe fosse puxado por ele. E é impossível pará-lo nesse contexto. Menos próximo da área, o francês costuma encontrar espaço para maltratar o adversário ao carregar a bola durante a transição ofensiva, e foi o que aconteceu no lance que matou o jogo.

OU SEJA…

Ndombele não estava tão impressionado com seu gol | Foto: @spursofficial

Pochettino admitiu que errou ao tentar manter o 4–3–1–2 após o gol do Aston Villa. Ele até consertou isso ao mudar o meio-campo e a forma de atacar, mas obteve sucesso pleno quando deixou de utilizar Lucas por dentro e Sissoko por fora, resgatando seu antigo e amado 4–2–3–1. Eriksen é imprescindível e foi mágico desde que entrou (liderou a partida com 3 passes chaves), mas a mudança de esquema foi o que virou a chave do jogo.

Com os atletas que o argentino tem, o 4–2–3–1 é a melhor solução para quebrar defesas sólidas e retrancadas. A dúvida fica por conta da dupla de volantes: Ndombele e Sissoko ou Ndombele e Winks? Com um adversário espaçado em um jogo mais rápido e cheio de transições, a primeira pode ser a melhor opção. Para trabalhar com calma, sem desperdiçar a posse de bola, contra um adversário mais “chato”, é melhor ter só um dos franceses.

Ah, e o negócio vai ficar ainda mais interessante quando Lo Celso estiver à disposição. Aí está um ótimo tema para o próximo texto.

--

--