“Falta quem entrar?”

Party games” e quarentena

Dinho Senos
Game Clube
5 min readApr 26, 2020

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Sinto o dever de iniciar essa entrada da série Os game studies em tempos de quarentena com uma situação um tanto quanto mórbida: É fato científico que isolamento social tem um preço na saúde mental e bem estar geral do indivíduo. É inegável que apesar de triste (e, convenhamos, terrivelmente chato), nós precisamos nos manter rígidos quanto à quarentena nesses tempos difíceis; para alguns, isso significa meses sem contato físico com todo tipo de pessoas queridas. A saudade da família e/ou amizades não é algo novo, entretanto. Na verdade, o anseio por contato à distância, independentemente dos motivos, moveu a humanidade a inventar sinais de fumaça, o correio, o telefone, entre outros tantos métodos. Possivelmente se pombos pudessem se comunicar conosco eles já teriam reivindicado representação sindical.

A questão é que, principalmente após o início da popularização da internet em meados da década de 80, a diversificação sobre como essa comunicação ocorre tem tomado formatos cada vez mais diversos, e por mais que esse texto tenha começado com um clima meio sombrio, apesar de realista, o objetivo dele é justamente mostrar que há meios de manter quem nós amamos perto, ou o mais próximo disso possível. Já que estamos numa era em que o carteado com cerveja e o War com um uma “rodada de suco pra galera” são impossibilidades logísticas (por favor, não choremos), temos que estender o braço a alternativas virtuais aos jogos de tabuleiro que nos dão aquela sensação tão cara de pertencimento e diversão em grupo.

Esse texto faz parte de uma série de conteúdos sobre o jogar em tempos de quarentena. Fique de olho em nossas redes: novos textos serão publicados todas as semanas!

Party games, como são comumente chamados desde o lançamento do Party Mix pro Atari 2600, são jogos com objetivos curtos, simples, e desenvolvidos pensando em uma jogabilidade multiplayer de cooperação, competição, ou os dois. Existe uma miríade de jogos desse gênero disponível na internet com distribuição gratuita, porém mesmo dentre os pagos os preços costumam ser abaixo da faixa dos AAA. O Game Clube, portanto, resolveu listar algumas sugestões e curiosidades desse gênero que tem salvado nossas semanas durante o isolamento.

Recomendação do chef: este prato é muito bem acompanhado com aplicativos de comunicação por voz.

Gartic

A tão difundida versão brasileira do jogo de desenho/adivinhação foi criada em 2008, segundo o próprio site, sob o selo da Onrizon, uma empresa também brasileira e responsável por outros jogos bem-sucedidos do gênero, como o StopotS, que inclusive poderia ter a sua própria entrada neste texto. A jogabilidade é simples: a cada rodada um dos jogadores recebe uma palavra e deve desenhá-la com o objetivo de fazer os demais acertarem qual palavra é, sem utilizar de qualquer tipo de escrita. Fato curioso é que nas primeiras semanas do isolamento o site oficial ficou tão sobrecarregado com acessos que os desenvolvedores tiveram que pedir ao público que migrasse para o gartic.io, uma versão mais simplista e leve da plataforma. O jogo está disponível em computadores, através do navegador, Android e iOS.

o que se espera que se faça e o que é feito, respectivamente (à esquerda, “zarabatana”; à direita, “cisne”)

Tabletop Simulator

Este jogo da Berserk Titles foi concebido após um financiamento coletivo no Kickstarter em 2014 e, apesar de ser pago, tem uma premissa diferente dos demais jogos desta lista — ao invés de ser apenas um game, propõe ser uma plataforma interativa em que, na teoria, é possível formular e/ou reproduzir qualquer jogo de tabuleiro. A premissa é um aplicativo sandbox em que se pode manipular o conteúdo, as regras e a física da sessão através de um sistema simples de programação pré-produzido. Se essa última parte pareceu complexa demais, não se preocupe: existem dezenas de jogos que vêm junto com a compra do simulador, e outras tantas que podem ser adquiridas separadamente como DLCs. Disponível apenas em computadores.

de pôquer a RPG, passando por quase tudo que a imaginação alcançar

Overcooked

O caótico jogo co-op da Team 17, já famosa pela franquia Worms, coloca os jogadores em uma cozinha, seguindo comandas que pedem pratos específicos e lidando com tudo que isso envolve: fatiar, fritar, lavar pratos, etc. Esse não seria o primeiro game a meter a colher (risos) no tema gastronômico, mas definitivamente entra na lista dos que faz isso de forma mais bizarra. A história começa com uma almôndega gigantesca como cliente, ao mesmo tempo que o mundo parece estar à beira do fim. A jogabilidade não destoa, colocando os chefs em cenários com corredores minúsculos, plataformas móveis, labaredas súbitas e outras tantas situações que acionariam o alarme da vigilância sanitária. O jogo foi pensado com o co-op presencial em mente, e apesar de poder ser jogado online por até 4 pessoas através de certas gambiarras, não se preocupe — a sequência, Overcooked 2 (desta vez alimentando pães zumbis, os Unbread) foi lançada em 2018 e conta com suporte online nativo. Ambas as versões estão disponíveis para Nintendo Switch, PS4, Xbox One e PC.

desperdício de comida meramente ilustrativo

Warcraft III: Reforged

Reforged pode ter recebido notas baixas da crítica ao ser lançado, mas é impossível negar que ele reproduz a essência que fez com que Warcraft 3: Reign of Chaos e sua expansão, The Frozen Throne, fossem aclamados como alguns dos melhores jogos de estratégia em tempo real de todos os tempos. A responsabilidade desse sucesso, entretanto, deve ser creditada não só à produtora do game, Blizzard, mas também à comunidade de jogadores que utiliza o recurso de mapas customizáveis para flexibilizar o gênero do jogo. Um dos mapas mais famosos que entra no escopo do nosso texto é o Uther Party, que faz com que os jogadores participem de rodadas com minigames aleatórios frequentemente baseados em cliques rápidos ou sorte. O Reforged é a versão remasterizada do game, com personagens e cenário refeitos, porém apesar de não estar mais à venda, a versão antiga do jogo ainda pode ser jogada através do cliente da versão atualizada ou encontrada para download em fóruns especializados. A grande maioria dos mapas funciona nas duas versões, e o jogo está disponível apenas para computadores.

“Uther Party” nas duas versões — à esquerda, Frozen Throne, à direita, Reforged

E agora?

Com a incerteza do fim do período de isolamento social, ter momentos de confraternização com quem se ama é uma necessidade básica para a manutenção das saúdes mental e emocional. Da equipe Game Clube, esperamos que esse texto sirva como pretexto para reuniões virtuais e muitas risadas, com direito a áudio cortando e voz robótica. Fiquem em casa, fiquem bem.

Claudio “Dinho” Senos é membro infiltrado do Game Clube desde 2019, pois não faz parte da graduação de Estudos de Mídia e sim de Arquitetura e Urbanismo, pela Universidade Federal Fluminense.

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Dinho Senos
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Arch/Urb student, gaming enthusiast. @DinhoSenos_