Terminando de virar a sala de aula de cabeça pra baixo

Marcos V. C. Vital
Hipótese Nula
Published in
5 min readJul 16, 2016
http://unearthedcomics.com/comics/student-attention/

Agora sim, terminando esta história! :D

Ufa. Com clima de fim de temporada, finalmente vou tentar finalizar o nosso papo que começou aqui, continuou aqui e agora termina aqui mesmo, sem link porque o texto é este. ;)

Um dos grandes desafios que me aguarda nesta nova proposta para a disciplina de Biomatemática (e que, pelo menos em algum grau, vai afetar o planejamento das outras disciplinas) são as avaliações. Elas eram simples na versão original da disciplina, pois corrigir exercícios é relativamente simples e direto. Mas, com a nova proposta, a coisa vai ficar mais complexa, pois os exercícios vão sumir (ou diminuir muito). Então, o que fazer?

Virando algumas coisas de cabeça para baixo: ou melhor, colocando de trás pra frente. :)

Já tinha dado a deixa antes, na forma de links, e agora falo mais claramente disso. Lendo umas postagens no excelente Dynamic Ecology, achei relatos sobre o método chamado flipped classroom. A ideia aqui é tornar o aprendizado mais ativo, tirando um pouco do foco no “professor centro das atenções” e buscando mais a construção do conhecimento com o professor como um facilitador. Na prática, isso envolve ter material para os estudantes acessarem antes da sala de aula, o que muitas vezes é combinado com pequenas avaliações no começo das aulas.

Um modelo típico de aula, então, envolve enviar material com alguma antecedência (penso que uma semana seja o suficiente na maioria dos casos). Pode ser um vídeo, um texto, um pequeno exercício ou algo assim. Em sala, começamos com uma pequena atividade em grupos, que seja uma continuação do assunto. Aí, depois disso, a aula em si, mas tomando tudo o que veio antes como gancho.

O que tem de legal neste modelo? Bom, para começar, ele estimula aprendizado ativo, e tem trabalhos por aí mostrando como ele é mais eficiente do que os métodos mais tradicionais de ensino. Ele também dispersa um pouco as avaliações, que serão muitas com pequeno valor cada uma. Isso é legal, pois tira o peso da nota em poucas provas; e, de quebra, permite vários tipos de avaliação diferentes (exercícios, produção de textos, pequenos seminários, etc), o que também é ótimo. Por fim, estimula (ou pressiona? hehehe) o estudo prévio dos assuntos, que é justamente a chave para um aprendizado mais eficiente.

Expectativas e dificuldades pelo caminho…

Será que vai funcionar? Lendo um pouco, já achei relatos bem positivos, e outros nem tanto — e de um jeito ou de outro, é algo que com certeza vai dar trabalho para preparar e implementar. Apesar da vontade, então, dificilmente irei conseguir mudar tudo em um semestre só; mas espero conseguir mudar o suficiente para avaliar se as mudanças foram para melhor. Agora, com certeza vou esbarrar em algumas dificuldades práticas, e é bom ir pensando nisso.

Falta de material em português

Infelizmente, Biomatemática não é um tema com montes e montes de materiais à nossa disposição em português. Como a turma é de primeiro período, exigir a leitura de grandes quantidades de material em inglês não vai funcionar (exigir um pouquinho disso pode ser bom para eles, claro, mas sem exageros). Isto significa que eu vou ter que preparar um bocado de coisas para eles usarem antes das aulas. Eu até tenho meus antigos esquemas de aula, mas eles possuem um formato do tipo “notas de aula”, e não de um texto corrido — foi um material pensando em quem já assistiu, e não em quem ainda vai assistir a aula. Felizmente eu gosto de escrever material didático, mas tenho que ter em mente que o semestre vai ser corrido, então é possível que nem todas as aulas possam seguir o esquema invertido.

Os alunos podem não gostar muito disso em um primeiro momento

Uma coisa bem curiosa sobre os relatos que eu li sobre inversão da aula é que os alunos nem sempre gostam, mesmo que o resultado final seja comprovadamente melhor (com notas melhores, menos reprovações, etc). Isto provavelmente ocorre porque eles se sentem pressionados ao ter que fazer avaliações frequentes e terem que estudar semanalmente para isso, e é algo que não deve ser ignorado. Claro, o foco é em promover um bom aprendizado, e não em ser querido por todos, mas uma boa explicação dos motivos para usar este tipo de método vai ser importante para a turma no começo do semestre — e uma boa conversa com feedback deles no final do semestre vai ser importantíssimo também, para saber o que eles acharam disso tudo.

Correria, correções e problemas de acesso

Além do tempo gasto na preparação das novas aulas, esta mudança certamente terá outra consequência: muito material para corrigir em ritmo acelerado. Se quero avaliar a turma semanalmente, tenho que me preparar para corrigir e lançar notas neste mesmo ritmo: então uma semana típica vai envolver corrigir o material da semana atual enquanto preparo material para semana seguinte. :P

Uma alternativa, pelo menos neste primeiro momento, é tentar um ritmo mais leve: talvez avaliações a cada duas semanas? Isto pode facilitar a dinâmica, especialmente neste primeiro semestre de mudança.

O que vem por aí

Entre começar a escrever este texto e este momento de publicação, o semestre começou aqui na UFAL! Eu já apliquei o primeiro exercício neste formato, e a minha primeira impressão foi bem positiva. :D

O meu planejamento do semestre vai envolver mais ou menos um terço das aulas com uma atividade assim, complementando tudo com algumas atividades avaliativas online. No todo, as notas dos alunos vão ser compostas pelos pequenos exercícios, pelas atividades online, por duas provas mais tradicionais e por um seminário lá no final do semestre. E aí, quando o semestre terminar, volto aqui para contar como foram as coisas, ok?

Neste meio tempo, deixo aqui a deixa para vocês: alguém aí que está lendo este texto já ministrou ou assistiu aulas em um sistema como este? Como foi a experiência? O que vocês pensam disso? Para quem nunca teve contato com sistemas de aulas assim, o que vocês pensam a respeito?

Abraços, e até breve!

Prof. Marcos

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Marcos V. C. Vital
Hipótese Nula

Prof. da UFAL, coordenador do LEQ, apaixonado por ensino, ciência, R e jogos!