Entrando em contato com a dor

Míriam Medeiros Strack
Introverso
Published in
4 min readSep 27, 2018

E tendo mais consciência e clareza de seus processos internos

No meu texto da semana passada falei sobre dores e traumas escondidos por baixo de carapaças musculares de tensão e sugeri que refletíssemos sobre qual a dor que cada tensão muscular esconde. Hoje venho aprofundar mais esse assunto de entrar em contato com a dor, principalmente a dor emocional. Não é fácil. Já digo assim de cara. Não é fácil entrar em contato e encarar nossas dores emocionais. Mas falo outra coisa, todas as vezes em que eu consegui fazer isso, a dor diminuiu consideravelmente e eu tive muito mais clareza de como são meus processos internos de dor e sofrimento. Então acho que vale a tentativa.

Voltando ao meu último texto, contei sobre uma aula onde mexi bastante minha coluna e isso me fez chorar ao chegar em casa, por ter liberado tensões físicas e emocionais que estavam presas ali. O que não falei foi o que eu senti durante os momentos em que realizava os exercícios…

Cheguei nessa primeira aula já com várias dores físicas, por problemas anteriores. Porém, no momento em que comecei a mobilizar a coluna, estendendo ela para trás e flexionando ela para frente, comecei inicialmente a sentir um desconforto no peito. Percebi, observei e continuei. Achei que era só a musculatura alongando. Logo mais, comecei a sentir raiva. Muita raiva. E internamente eu estava direcionando a raiva à professora. Pensava comigo: “porque ela está me obrigando a mexer aqui? Porque ela esta me obrigando a abrir o peito? Que raiva dela!” Obviamente, ela não estava me obrigando a nada. Fui até lá de livre e espontânea vontade. Mas novamente, ao perceber e observar esse sentimento, notei que a professora nada tinha a ver com essa raiva que eu estava sentindo. A raiva apareceu apenas para encobrir meu medo, na tentativa de me fazer desistir do exercício. Percebi essa vontade de desistir com muita clareza. Não desisti e deixei aquela raiva ali fluindo, tentando não me apegar a ela. Tentando apenas observar e ir mais fundo. Então, ao me aprofundar na causa da raiva, aí sim encontrei o medo, misturado com tristeza e vontade de chorar… o que deixei para fazer em casa.

Com essa história, quero ressaltar que o nosso padrão, me incluindo aqui, é fugir ao primeiro sinal de desconforto emocional. Fugir de uma conversa, de um relacionamento, de um livro, de um vídeo, da solidão, de qualquer coisa que possa nos tirar da nossa zona de conforto emocional. Mesmo pessoas introvertidas, que geralmente gostam de ficar sozinhas, podem escolher algo para “se distrair” ao invés de ir mais fundo em pensamentos e emoções desconfortáveis.

O desconforto é uma reação cerebral adaptativa de proteção, pois na vida das sociedades primitivas, normalmente desconforto significava perigo. Atualmente, nosso cérebro continua se utilizando desse sinal interno, porém, sem chance real de fatalidades (na maior parte das vezes). Hoje em dia, o desconforto emocional nos protege de sentir dores emocionais mais profundas.

Porém, sugiro que, ao ver que um desconforto emocional se aproxima, tente segui-lo, se isso já for possível para você. Observe para onde ele está indo, ao invés de barrá-lo ou fugir e também de onde está vindo, qual sua origem. Isso nos permite ir para lugares mais profundos dentro da gente, podendo nos trazer lembranças, memórias ou outros sentimentos diversos que não estávamos esperando. Minha sugestão é sempre de não julgar, por mais absurdo que pareçam as memórias ou emoções que surgirem. Se possível, preste atenção à essas memórias, preste atenção às suas sensações. Elas costumam ser grandes indicativos para o seu processo interno de dor, para que você descubra que tipo de “coisas” te causam sofrimento.

Algo que me ajuda muito nessas horas é falar, verbalizar. Normalmente, a frase que sai no momento de maior desconforto, raiva ou tristeza está no cerne na questão que preciso resolver. “Não aguento mais tal coisa”. “Que raiva do fulano”. “Não é isso que eu quero”. Entre outras. Normalmente essa frase, dita no auge do furacão dos sentimentos, coloca na frente dos meus olhos a causa da minha dor, seja ela presente ou passada e me ajuda a entender o que se passa dentro de mim e a me trazer mais consciência, o que facilita o processo interno de cura.

Quando não posso falar, escrevo. Escrevo o mais rápido e fluído que posso, na intenção de realmente dar vasão aos sentimentos e pensamentos. Novamente, as palavras escritas contém, no meio daquela emoção toda, o ponto central do que está me causando a dor. E, novamente, ao encontrar o ponto central, posso ir atrás de resolver o “problema”, seja ele interno ou externo à mim.

Assim, mais uma vez, encorajo vocês a entrar em contato com a sua dor, a se aprofundar nela. Pode não ser a coisa mais agradável de se fazer, mas, ao mesmo tempo, pode trazer muita consciência e clareza sobre seus processos internos.

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Míriam Medeiros Strack
Introverso

Escritora, professora, bailarina, artista. Falo sobre consciência emocional, consciência corporal e autenticidade. Insta: @miriam.mest