Pokémon, consumo e nostalgia

Gotta catch ’em all!

Clara Dantas
LENS

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No dia 19 de novembro de 2021, a Nintendo lançou os jogos Pokémon Brilliant Diamond e Shining Pearl (Switch), que são remakes, respectivamente, das versões Pokémon Diamond e Pearl (DS), ambas de 2006. Este release fez parte da programação do 25º aniversário da franquia.

Assim como nos originais, a aventura de passa na região fictícia de Sinnoh. A jogabilidade é semelhante a dos games anteriores, embora o estilo visual (chibi) seja distinto — uma característica que foi criticada por alguns fãs desde o seu anúncio, em fevereiro deste mesmo ano.

Vale lembrar que, por explorar principalmente a Geração IV (em que os iniciais são Piplup, Chimchar e Turtwig), esses jogos ignoram centenas de Pokémon criados e listados posteriormente na PokéDex, que atualmente conta com 898 espécimes; assim como não trazem as Mega Evoluções em sua narrativa. Trata-se de um retorno ao passado, com apenas algumas atualizações referentes a dinâmicas de batalha e melhorias gráficas, repetindo exatamente a mesma jornada de 15 anos atrás.

Comparação entre jogos. À esquerda, o remake (2021); à direita, o original (2006).

Esse direcionamento mais “fiel” por parte dos remakes, mantendo o foco em seus jogos base, não é por acaso. Em primeiro lugar, é necessário compreender o impacto cultural e econômico proporcionado por Pokémon — uma companhia multimidiática, com adaptações para variados meios e formatos (jogos, filmes, mangás, anime, entre outros), capaz de atrair os fãs de longa data, como também aqueles que não estão tão familiarizados assim ao seu universo.

Em março de 2021, diversos portais veicularam a notícia de que, após o lançamento de Pokémon GO, a franquia se tornou, oficialmente, a mais lucrativa do mundo, com números que superaram as vendas da Marvel e de Star Wars. Os jogos Pokémon Brilliant Diamond e Shining Pearl surgem, assim, como desdobramentos do fenômeno que se mantém relevante desde a década de 1990, possibilitando que o jogador reviva sua experiência uma vez mais, através não somente de seu afeto pela história, mas principalmente pelo sentimento de nostalgia.

À primeira vista, a nostalgia é um anseio por um lugar, mas na verdade é um anseio por um tempo diferente — o tempo da nossa infância, os ritmos mais lentos dos nossos sonhos. Em um sentido mais amplo, a nostalgia é uma rebelião contra a ideia moderna de tempo, o tempo de história e progresso.

(BOYM, 2008, p. 10, tradução nossa)

Essa obsessão pelo espírito nostálgico se tornou uma tendência da indústria cultural, também observada em outras plataformas — como o cinema, a TV e suas cadeias ilimitadas de consumo, que constantemente revisitam universos previamente estabelecidos. Ao se conectar ao público por meio de adaptações, fazendo referência a produtos de uma época passada, essas empresas propiciam o retorno a um lugar seguro, um tempo mais simples que o atual, reforçando a recusa ou até mesmo a fuga do presente. No entanto, é importante ressaltar que a experiência oferecida pelos jogos eletrônicos se distingue daquela propiciada por esses outros meios.

Enquanto os meios de reprodução tradicionais, como o cinema e a televisão, clamam por uma imersão passiva, onde o leitor simplesmente absorve o que é transmitido e a interação é praticamente condensada ao ato da interpretação pessoal, o game transpõe esse processo para um diferente patamar, onde a imersão se dá de forma muito mais palpável.

(RIBEIRO e FALCÃO, 2009, pp. 88–89)

Vale lembrar que esses não foram os primeiros (nem serão os últimos) remakes de Pokémon. FireRed e LeafGreen, por exemplo, foram desenvolvidos a partir das versões Red e Blue. Apesar de separados por um intervalo de tempo menor (8 anos), os personagens, o cenário e tantos outros elementos narrativos sofreram upgrades consideráveis — o que só reforça a ideia de que a busca pela reprodução com fins nostálgicos trata-se de uma interesse mercadológico e estratégico relativamente recente.

À esquerda, versão Red/Blue (1996). À direita, FireRed/LeafGreen (2004).

Traçada esta argumentação, entende-se que este é um fenômeno cujos aspectos podem ser melhor explorados em uma pesquisa mais extensa; de antemão, é possível reconhecer que os games são capazes de fortalecer o afeto do usuário com relação à franquia (geralmente estabelecido ainda na infância), revisitando-o por intermédio da nostalgia — o ponto em comum responsável tanto por conectar o jogador à mídia, quanto por conectar a rede de fãs entre si.

Referências

BOYM, Svetlana. The future of nostalgia. Basic books, 2008.

RIBEIRO, José Carlos; FALCÃO, Thiago. Mundos virtuais e identidade social: processos de formação e mediação através da lógica do jogo. Logos, 2009, 16.1: pp. 84–96.

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