Texto 09 — “Fazer a Ponte, construir a memória”

Trechos do livro “Escola da Ponte, Defender a Escola Pública”, de 2007 — José Pacheco — pág. 61 a 82

Marcelo Voos
MARÉ Ubatuba
14 min readJul 10, 2016

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[esta seleção de trechos faz parte do nosso Percurso em Educação]

Uma escola sem muros

«É a natureza do trabalho escolar que deve determinar a estrutura
dos edifícios (…) A nossa escola será uma ‘oficina de trabalho’ integrada
na vida do meio. Este destino específico necessita de uma estrutura nova».
(Freinet)

A Escola da Ponte é uma escola de área aberta construída por vontade dos
professores, onde não foram erguidos muros nos lugares em que os arquitetos derrubaram as paredes.

A arquitetura também desempenha um importante papel na concretização dos objetivos do projeto. A disposição espacial ampla encontra a sua maior expressão num conceito de escola aberta que se revê como uma oficina de trabalho, parafraseando Freinet, ou escola laboratorial, recorrendo a Dewey.

É um edifício-escola que permite o desenvolvimento de uma pedagogia orientada para uma praxis social de integração do meio na escola e da escola na vida, aliando o saber ao saber fazer.

Nesta escola não há salas de aula e não há aulas. Um espaço pode, no princípio de um dia de trabalho, acolher o trabalho de grupo, pode servir a expressão dramática, a meio da manhã, e pode receber, no fim do dia, as crianças que vão participar no debate.

(…)

O espaço e o tempo de aprender

«Organizamos minuciosamente a vida da escola para que desta
organização decorram naturalmente o equilíbrio e a harmonia»
(Freinet)

O derrubar das paredes libertou alunos e professores da rigidez dos espaços
tradicionais e acompanhou o derrube de outros muros. Em conjunto com as alterações arquitetônicas atrás referidas, outras opções organizacionais marcaram a ruptura com o modelo tradicional de organização da escola, que considerávamos não respeitar as individualidades e não favorecer o sucesso de todos.

Referimo-nos à organização do tempo e, concretamente, à opção pelo modelo de dia escolar integral (ausência de turnos) que evita fraturas na organização do trabalho, porque não há necessidade de partilhar o espaço com grupos diferentes e lógicas de funcionamento também diferentes. O dia escolar integral facilita a adoção de processos de organização e gestão participada do tempo e do espaço e a sua apropriação por parte da população escolar.

Referimo-nos, também, à ausência de muros na atribuição do espaço aos alunos: ressalvados os já referidos casos específicos da iniciação e da transição, todo o espaço está ao dispor de todos os alunos, ao longo de todo o tempo de funcionamento da escola, sem consideração de classe e sem consideração de anos de escolaridade. Esta opção permite uma mobilização integrada das estruturas curriculares e paracurriculares, de acompanhamento e de socialização, estimula a participação na experiência pedagógica quotidiana e permite colocar igual ênfase na aprendizagem dos processos como na dos conteúdos, enquanto estratégia de aprender a aprender.

Referimo-nos, ainda, ao progresso dos alunos em que também se aboliu ou se
atenuou os efeitos do mecanismo de aprovação/reprovação, por não se lhe encontrar o sentido numa escola em que se procura que tudo se conjugue para proporcionar uma programação flexível adequada ao progresso dos alunos ao longo do ciclo de estudos e, desde logo, uma perfeita correspondência entre progressão e progresso.

(…)

A vivência na comunidade escolar tem um caráter formativo, veiculador de
valores sociais e de normas por todos assumidas e elaboradas com a participação de todos.

Na Ponte, vive-se, cultiva-se, respira-se a delicadeza no trato, suavidade na voz, a afabilidade para com o colega, a disponibilidade, a atenção ao outro, a capacidade de expor e de se expor. A interajuda permanente acontece em todo o sistema de relações, a partir do exemplo dado pelo trabalho em equipe dos professores.

Repensar a escola

«A Educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. Como aprender a discutir e a debater com uma educação que impõe?» (Paulo Freire)

Ao estabelecer uma clara e definitiva ruptura com a organização em classe, esta escola assumiu, em concreto, a tarefa de encontrar uma outra forma de pensar a organização escolar. Essa ruptura — que não terá, forçosamente, de acontecer em todas as escolas, mas em cada qual a seu modo… — teve consequências a vários níveis.

Para que se não cerceasse a liberdade e autonomia dos alunos, forçoso se tornou que a abertura organizacional estabelecida fosse sendo matizada por um conjunto complexo de dispositivos que, a par e passo, se irão explicitando em relação às várias dimensões de organização pedagógica da escola. Estes dispositivos, ao constituírem marcadores do quotidiano escolar, reafirmam a preocupação com o tratamento integrado das várias finalidades do projeto.

No domínio das relações interpessoais e do equilíbrio afetivo dos alunos, o
quadro de direitos e deveres regula todo o sistema de relações, mas é proposto, debatido e aprovado pela Assembleia da Escola, no início de cada ano letivo.

A caixinha dos segredos, onde as crianças depositam um recado, sempre que
pretendem conversar em segredo com algum professor, permite manter e aprofundar cumplicidades entre alunos e professores e, assim, reequilibrar afetivamente os alunos.

O debate é um dispositivo de trabalho coletivo onde cabem, entre outros, a
discussão de assuntos do interesse dos alunos e a gestão de conflitos. Realiza-se no final de cada dia de trabalho, exceto à sexta-feira, dia em que todos os alunos reúnem em assembleia.

A Assembleia da Escola tem um cariz mais formal e mais abrangente.

Obedece a uma convocatória que estabelece os assuntos a tratar, cujo tratamento e conclusões são registrados em ata no final de cada reunião. É dirigida pela Mesa da Assembleia, que é eleita no início de cada ano letivo. E serve, entre outros, para preparar projetos, resolver conflitos, estudar os relatórios das Responsabilidades…

A organização de meios e a gestão do bem-estar são de responsabilidade
coletiva, de acordo com categorias de tarefas a que se dá o nome de
Responsabilidades, de que abaixo se apresenta exemplos. O cumprimento das tarefas incumbe a grupos de alunos, aos quais se dá o nome de grupos de responsáveis. Há, por exemplo, o grupo dos murais (a quem compete manter os murais atualizados e organizados), o grupo do recreio bom (a quem cabe velar pelo bem-estar de todos, nos períodos de recreio), o dos responsáveis pelo material comum, pelo terrário, etc. De quinze em quinze dias, todos os grupos de todas as responsabilidades apresentam na Assembleia o relatório com tudo o que fizeram da sua responsabilidade, durante esse tempo.

(…)

No domínio do agrupamento de alunos, o grupo heterogêneo é a unidade básica adotada, muito embora a organização do trabalho alterne entre o trabalho em grupo, o trabalho de pares e o trabalho individual; é, geralmente, constituído por três alunos e organizado de modo a promover a participação e entreajuda entre alunos de diferentes idades e níveis de desenvolvimento. Apesar de o vínculo afetivo ser a base da constituição do grupo, prevalece uma condição para a sua constituição: cada grupo deve incluir um aluno que tenha mais necessidade de cuidados.

No início de cada ano letivo, após o acolhimento dos mais novos, é organizado um jogo. Cada criança recebe um papel onde está inscrito um símbolo (entre três possíveis) e terá de fazer grupo com duas crianças que possuam símbolos diferentes do seu. Este jogo dura apenas até meio da
primeira manhã. A partir desse momento, os alunos podem mudar de grupo sempre que o desejarem, desde que se mantenha a regra da heterogeneidade.

Na perspectiva de uma gradual e sustentada passagem para um contexto de
inclusão, foi-se esbatendo uma integração, enquanto processo através do qual as crianças consideradas com necessidades especiais eram apoiadas individualmente, de forma a poderem participar no quotidiano de uma escola inalterada. Não podendo ser ainda considerada uma escola inclusiva, a Escola da Ponte tende para a inclusão e, neste sentido, o trabalho em grupo heterogêneo assume um papel preponderante.

No plano curricular, o suporte tecnológico da correspondência entre a progressão e o progresso dos alunos é, a par da avaliação contínua, o ensino individualizado. Ora, nesta escola, a gestão das aprendizagens e dos respectivos tempos e espaços é da responsabilidade de cada criança, sujeita, embora, a orientações definidas de forma partilhada numa unidade de planeamento de base quinzenal.

Todo o planeamento curricular se subordina, em primeira instância, ao quadro de objetivos afixado na parede de uma das salas. Trata-se de uma lista completa dos objetivos do(s) programa(s), mas descodificados, isto é, transcritos em linguagem acessível a todos e na lógica do ciclo. O plano de estudo é o mesmo para todos os alunos, mas há adaptações no currículo de cada um, em função das suas necessidades e capacidades, nomeadamente, no nível de iniciação e no da transição.

No início de cada dia, cada aluno define o seu plano individual, que consiste num registro de intenções sobre o que quer aprender durante o dia. Este subordina-se, por sua vez, às propostas constantes do plano da quinzena, o qual resulta de negociação entre professores e alunos.

No final do dia e no final da quinzena, procede-se à avaliação dos planos
referidos, quanto ao seu grau de concretização, para definição dos planos e ações subsequentes.

A avaliação das aprendizagens é feita quando o aluno se sente preparado para o efeito. A auto-avaliação acontece quando alguém sente necessidade de manifestar ou aplicar conhecimentos adquiridos, expor competências, etc. Cada aluno comunica o que aprendeu e faz prova de aprendizagem só quando quer, quando sente que é capaz, o que, por vezes, consiste em comunicar aos outros, durante o debate, as descobertas realizadas.

As aprendizagens processam-se, quase sempre, em trabalho de pesquisa e não se subordinam a manuais iguais para todos os alunos.

Quando algum aluno não consegue concretizar os seus objetivos, recorre à ajuda do grupo ou pede uma aula direta a um professor especialista. A aula direta acontece sempre que há pedidos de ajuda de grupos de alunos e em diferentes áreas. Para participarem nestas aulas, os alunos interessados inscrevem-se num mural que se designa por preciso de ajuda. A aula acontece num espaço próprio e em função da área e da dificuldade identificada.

(…)

Educar é fornecer os meios e acompanhar processos de desenvolvimento. Na
Escola da Ponte, o currículo escolar é entendido como um conjunto de situações e atividades que vão surgindo e que alunos e professores reelaboram conjuntamente. É feliz a criança a quem se permite satisfazer a liberdade de ação num ambiente de segurança, confiança e apoio criado pela presença dos educadores. Porém, a liberdade permitida a cada criança é concedida na proporção do que ela é capaz de utilizar.

O plano da quinzena dos alunos é muito negociado com os professores, é também feito pelos professores. Haverá nisto algo perverso? Partindo de problemas que os alunos inventariam, os professores agem como persuasores mais ou menos democráticos…

A liberdade é mitigada ainda mais pela necessidade de prestação de contas do
que se faz. No final de quinzena, o dispositivo o que eu fiz e o que eu aprendi durante a quinzena é uma espécie de relatório em que cada miúdo registra o que fez, o que não fez, o que aprendeu ou não aprendeu. A possibilidade de escolha pessoal do que se inscreve no plano do dia é, por sua vez, subordinada ao plano da quinzena.

Acresce que a autonomia é ainda mais relativa, se atendermos a que todos os
alunos devem contemplar nas suas planificações a dimensão do projeto coletivo. Se cada um agisse isolado, onde estaria a ideia de projeto, onde estaria a escola? Todos convergem para os mesmos objetivos gerais, senão haveria diferentes e indiferentes escolas dentro de uma mesma escola.

(…)

Ninguém tem um lugar fixo para brincar, trabalhar e aprender. Nem os
professores, nem os alunos. Ninguém tem tempos fixos para brincar, trabalhar e aprender. Embora haja um horário de referência para alunos e professores, estes não olham para o relógio, quando o que é preciso fazer-se tem de ser feito.

O rompimento com a organização tradicional da escola teve consequências
também quanto ao repensar do serviço docente, tendo-se operado significativa mudança relativamente à tradicional divisão do trabalho dos professores no 1º ciclo, o professor por classe. Do trabalho isolado passou-se ao trabalho em equipa educativa. Superando as dificuldades do regime de professor único, optou-se por uma situação em que cada um dos elementos do corpo docente se especializa em duas áreas do currículo, de modo a conseguir-se dar todo o programa e não apenas o Português, a Matemática e o Estudo do Meio.

Conseguiu-se, igualmente, contemplar a dimensão da formação pessoal e
social dos alunos… e dos professores. Sem deixar de estar disponível para apoiar todo e qualquer aluno, a todo o momento, cada professor estará disponível para uma resposta cientificamente mais rigorosa em determinada área de especialização. No entanto, esta especialização em áreas curriculares específicas processa-se no contexto de uma equipa e não pode ser confundida com a disciplinarização.

(…)

Decidimos harmonizar a atividade de ensinar com a de aprender, pondo a tônica do nosso trabalho nesta última. Não nos preocupamos com o dar o programa, porque são os alunos que o… aprendem. A ideia de um programa a transmitir a alguém, ao mesmo tempo, num mesmo espaço, do mesmo modo, já não faz sentido. Mas o programa de que os miúdos se vão apropriando faz sentido. Faz sentido a ideia de aprendizagens diversificadas, significativas, ativas, socializadoras e integradoras.

O que os professores da Escola da Ponte pretendem é o mesmo a que qualquer
professor aspira: que as crianças aprendam mais, que aprendam melhor, que se descubram como pessoas, que vejam os outros como pessoas e que sejam pessoas felizes, na medida do possível. Esta ideia esteve presente desde a primeira hora, ao ser inscrita no projeto uma matriz axiológica assente na solidariedade e na autonomia.

Em nome da autonomia e da solidariedade

«Se trabalho com crianças, devo estar atento à difícil passagem ou
caminhada da heteronomia para a autonomia, atento à responsabilidade
da minha presença que tanto pode ser auxiliadora como pode virar
perturbadora da busca inquieta dos educandos» (Paulo Freire)

Na Escola da Ponte, as crianças são tratadas como crianças e não como alunos.

O estatuto das crianças, a relação entre elas e com elas são imediatamente perceptíveis para quem visita a escola. As crianças apresentam-na aos visitantes como coisa sua, conhecem-lhe os meandros, dominam por completo os dispositivos pedagógicos, explicitam os porquês de tudo o que fazem, de tudo o que vivem.

Desde que um aluno chega à escola e até que dela sai, realiza tarefas que variam de dia para dia, que dependem do tipo de projeto em curso, do nível em que se encontra, mas que se poderá, para além do imprevisível — e que é o mais comum! — resumir do modo seguinte.

Quando chega à escola, brinca. Quando se apercebe que os professores vão
chegando, dirige-se para uma das salas, após registrar a sua presença no respectivo painel. Pega no material que está no seu cacifo, procura o seu grupo, senta-se na mesa que escolheu e elabora o seu plano do dia. Por vezes, os alunos deixam duas ou três linhas de reserva na folha onde escrevem o plano do dia, de modo a poderem acrescentar novas tarefas, se dispuserem de tempo ao longo do dia.

Entretanto, os responsáveis pelos murais vão atualizando a data e expondo a
informação disponível, enquanto os professores começam a circular por ali,
conversando sobre o trabalho feito em casa e verificando se o encarregado de educação rubricou o caderno de recados (um dos dispositivos de intensificação da relação entre a escola e as famílias).

Após a verificação pelos professores do plano do dia, a primeira atividade
poderá ser desenvolvida, por exemplo, na rede de computadores. Mas, se verificar que não há unidades disponíveis no momento, pode dirigir-se à biblioteca e iniciar uma pesquisa.

De regresso ao grupo, pode participar em atividades de ensino mútuo, prestando ajuda a um colega, ou partilhando informação com outro. De seguida, perante uma qualquer dificuldade, pede a intervenção de um professor próximo e disponível.

Gerindo o seu plano, desloca-se para o espaço onde decorrem atividades de
expressão dramática… e tudo o mais que os professores não podem prever. A gestão do tempo e dos espaços e materiais disponíveis requer uma consciência das necessidades, que é exercitada a todo o momento pelo aluno, que conta com o permanente aconselhamento dos professores. Tudo num ambiente de responsabilidade e serenidade (quase sempre, com fundo musical).

Na linha de Dewey, pretendeu-se centrar a aprendizagem nos interesses da
criança, fomentar métodos de pesquisa e de resolução de problemas.

(…)

Na Escola da Ponte, o valor da autonomia encontra a sua expressão máxima nas atividades realizadas pelas crianças. Estas atividades, porque são planificadas pelos alunos e orientadas pelos professores, potenciam o trabalho autônomo e no sentido da auto-aprendizagem, que permite que o aluno construa o seu conhecimento de forma ativa e participada. Contudo, não se pense que o professor, à luz deste modelo, deixou de ter qualquer preocupação no processo de ensino e de aprendizagem. O seu papel
apenas se alterou, deixou de ser o protagonista central, para passar a ser também um ator que auxilia os alunos na construção do seu conhecimento.

Deste modo e porque o trabalho autônomo não significa trabalho independente (no sentido do trabalho isolado), os alunos necessitam da colaboração do professor, que orienta as atividades de acordo com os interesses dos alunos. Uma vez que as atividades se inserem num processo
dialético que deverá conjugar os interesses, expectativas e motivação dos alunos e os objetivos dos professores, elas enquadram-se em princípios de organização servidos por uma fundamentação teórica que promove a sua legitimação, e que foi elaborada e reelaborada ao longo dos anos.

(…)

Memórias

«Marco Polo descreve uma ponte, pedra a pedra.

Mas qual é a pedra que sustém a ponte? — pergunta Kublai Kan.

A ponte não é sustida por esta ou por aquela pedra — responde Marco — mas sim pela linha do arco que elas formam.

Kublai Kan permanece silencioso, reflectindo. Depois acrescenta:

— Porque me falas das pedras? É só o arco que me importa. Polo responde:

— Sem pedras não há arco.»

(Italo Calvino)

Há 25 anos, foram definidos como objetivos: concretizar uma efetiva
diversificação das aprendizagens, tendo por referência uma política de direitos humanos que garantisse as mesmas oportunidades educacionais e de realização pessoal para todos; promover a autonomia e a solidariedade; operar transformações nas estruturas de comunicação e intensificar a colaboração entre instituições e agentes educativos.

Ao longo dos anos, o percurso deste projeto não foi linear. A escola não é hoje o que era há cinco, há dez, há vinte ou mais anos. Na procura da reconstituição da memória do projeto, encontramos três tempos de referência: o tempo de estar sozinho, o tempo de estar com alguns, o tempo da escola toda.

Entre o segundo e o terceiro tempo, verificou-se um hiato em quase tudo o que até então se construiu correu o risco de desaparecimento. Os projetos são feitos por pessoas, são objetos frágeis, precários, sujeitos a contingências.

Para que se mantenham e se aprofundem, é indispensável que todos os intervenientes queiram e façam.

Depois, houve o tempo de os pais aprenderem e de nós aprendermos com eles.

Houve tempo de as crianças se adaptarem e de nós adaptarmos a escola a todos e cada um deles. Depois, houve ainda o tempo de a inspeção e a administração se adaptarem… o tempo de consolidar e de fundamentar o que se fez. Entre o tempo de estar sozinho e o tempo de estar com alguns, o que permitiu que o projeto não soçobrasse perante inúmeros obstáculos foi o trabalho num círculo de estudo, que reunia professores de diversas escolas animados de uma mesma intenção: a de fazer das crianças e dos professores pessoas mais felizes.

Nada foi inventado na Escola da Ponte. Num longo processo de vinte e cinco
anos, os problemas geraram interrogações, as interrogações conduziram à busca de soluções. Os contributos recolhidos foram testados e avaliados. Após experiências cuidadosamente planeadas e aplicadas, algumas das propostas acabaram por ser recusadas, outras passaram a integrar, sob diferentes formas, o que não pára de se transformar: o projeto da Escola da Ponte está sempre incompleto, sempre a recomeçar.

[Esta seleção de trechos faz parte do Percurso em Educação, do grupo MARÉ — Ubatuba.]

[Próximo texto: Sociedade Sem Escolas]

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