Criar é florescer: uma entrevista com a cantora Tulipa Ruiz

A cantora, compositora e ilustradora Tulipa Ruiz fala sobre carreira, parcerias musicais, vida, morte, David Byrne e, é claro, sobre sua presença confirmada no MECAInhotim!

Crédito: Rodrigo Shimidt.

Santista de nascença e mineira de criação: a cantora, compositora e ilustradora Tulipa Ruiz impressiona pela versatilidade e aptidão com que trilhou seu caminho musical. Não é à toa que a libriana de 40 anos de idade — sendo 10 de carreira — tem como um dos fãs o criador da banda novaiorquina Talking Heads, David Byrne, que já brilhou os olhos duas vezes quando a viu subir no palco nos Estados Unidos.

Com quatro álbuns impecáveis e uma apresentação poderosa, segundo o jornal britânico The Guardian, ela surpreende pela quantidade de gêneros que flerta: vai do “pop florestal” — termo cunhado por ela mesma para classificar seu álbum de estreia — em “Efêmera” (2010), passando pelas guitarras deliciosamente distorcidas, pelos experimentalismos da execução vocal e pelo arranjo de cordas de “Tudo Tanto” (2012); pela MPB dançante com pitadas eletrônicas, indie pop e carimbó em “Dancê” (2015), até alcançar a densidade da sua lírica potencializada nas regravações intimistas em voz e violão de “TU” (2017).

Para celebrar toda a potência que é existir enquanto mulher e multiartista no Brasil e no mundo, Tulipa floresce no palco do MECAInhotim, que rola de 17 a 19 de maio no Instituto Inhotim, acompanhada da banda Pipoco das Galáxias, formada por seu irmão, o guitarrista e produtor musical Gustavo Ruiz; Gabriel Mayall e Samuel Fraga. Seu brilhantismo na forma de ser e ver o mundo fica evidente na entrevista abaixo. Vem com a gente?! (Na leitura e no festival, é claro!) ❤

Você nasceu em Santos, mas foi criada em São Lourenço, no sul de Minas. Você se considera mais santista ou mais mineira? Como esses dois lugares existem dentro de você?
Me considero mais mineira, porque só nasci em Santos, nunca morei lá. Em São Lourenço, vivi dos 13 aos 23 anos de idade. Então, a maior parte da minha formação é mineira. Na velocidade das coisas, na compreensão do tempo, nas paisagens sonoras. Existe a influência santista, claro. A família da minha mãe é caiçara. O meu avô era pescador e fazia tarrafa. A durabilidade poética desta imagem é infinita em mim. E em Santos, durante as férias, eu tinha mais contato com o universo pop também, via MTV (em São Lourenço não tinha) e ia nas matinês das boates do canal 3.”

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“O olho no olho é a nossa tecnologia mais avançada.”

O David Byrne já foi em dois shows seus nos Estados Unidos. Como você lida com esse lance de ser tão impecável no que faz que desperta a admiração de tanta gente maravilhosa como o fundador do Talking Heads?
Sim, ele é ligado nos meus discos, um cara conectado com o agora. Acho que isso é uma das características do atemporal, você estar presente no agora. David Byrne acompanha tudo que acontece, é um barato. O livro dele ‘Como Funciona a Música’ é a prova disso. Sobre como fazer música é resultado de uma série de circunstâncias naturais e sociais. Ele elabora isso de uma maneira incrível. Uma honra tê-lo nos meus shows em Nova York. O público fica alucinado quando ele aparece e é muito especial você fazer um show para uma pessoa que mora na sua vitrola, né? Meu último disco, o “TU”, foi produzido pelo meu irmão, Gustavo Ruiz, e pelo meu amigo Stephane San Juan, baterista que atualmente excursiona com Byrne. Ou seja, a vida é esse mashup.”

Crédito: Rodrigo Shimidt.

Uma das suas músicas do disco “Dancê” que eu mais gosto é “Old Boy”. Nela, você fala sobre velhice, vida e morte de uma forma tão singela que é praticamente impossível ouvir sem pensar no dia de partir. Como você vê, hoje, a dualidade da vida e da morte?
Fiz “Old Boy” pensando na morte de maneira balsâmica e natural. Isso me vinha como mantra, como oração. Morrer é natural. É mágico e misterioso esse ciclo de vida e morte. De renascer. Morrer. Começar, finalizar. Viver. E descansar.”

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“O público fica alucinado quando ele aparece e é muito especial você fazer um show para uma pessoa que mora na sua vitrola, né?”, Tulipa Ruiz sobre David Byrne.

Suas letras falam muito sobre casos do cotidiano que servem de trilha sonora para a vida de várias pessoas quase como um filme. Se sua vida fosse um filme qual nome teria? E qual gênero seria?
Meu filme se chamaria “Agora Now” e seria uma aventura.”

“Faço questão de estar presente neste ano de luto e luta por Brumadinho.”

Seu último álbum, “TU”, traz novas versões de canções já conhecidas. De onde veio essa vontade de revisitar e renovar as canções já lançadas?
Eu e Gustavo tínhamos voltado de uma série de shows fora do Brasil neste formato acústico. A sensação que me dava é que as músicas voltavam para a sua essência. Tudo ficava mais legível, as harmonias, melodias, as letras. Foi interessante tirar as camadas das músicas. Fiquei com vontade de gravar, para registrar este momento das composições. Como se fosse tirar uma foto do som mesmo, para não esquecer. A gente faz tanta coisa no contemporâneo, e é tudo tão rápido e disperso que às vezes perdemos um pouco nossa conexão com o sensível. Verbalizar novamente essas músicas foi um exercício zen importante para mim, uma espécie de ritual. A princípio o “TU” seria um disco só de regravações, mas músicas novas também aconteceram porque a gente se empolgou durante o processo.”

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E você gravou com Adan Jodorowsky, Metá Metá, Lulu Santos, Céu… Como é criar música com outros artistas?
Os encontros, esse olho no olho, são a nossa tecnologia mais avançada. Sempre é muito nutritivo encontrar pessoas parceiras durante uma jornada. Eu gosto de fazer som com quem eu piro no som, então todos esses encontros que você mencionou aconteceram com muito frio na barriga e coração na boca.”

Você está animada pra tocar no MECAInhotim? Como você vai florescer no nosso palco?
Muito, porque acompanho e admiro o MECA e faço questão de estar presente neste ano de luto e luta por Brumadinho.”

Essa entrevista foi feita pela nossa repórter Débora Stevaux e pelo nosso curador musical Dimas Henkes. Segue a gente no Instagram? E no Twitter também?

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MECA // Informação, cultura, criatividade e festivais: um radar da cena cultural do Brasil e do mundo. @mecalovemeca

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