Resgatamos a história do primeiro patrocinador do América

Museu da Memória Americana
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4 min readNov 13, 2019
América estreou uniforme com patrocínio da Pluna contra o Flamengo, em 1983 | O Globo

Emmanuel do Valle

Durante mais de três décadas o registro do primeiro patrocinador rubro acabou esquecido pelo tempo, desconhecido por torcedores mais jovens ou até mesmo ignorado em alguns almanaques e publicações históricas sobre o clube e o futebol carioca. Mas resgataremos aqui no Memória Americana essa história curiosa, curta e discreta, ocorrida quando o Campeonato Estadual de 1983 já adentrava as rodadas derradeiras da Taça Rio.

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Os patrocínios de camisa no futebol brasileiro têm um marco histórico inicial bem definido: foram legalizados em julho de 1982 por uma medida do extinto Conselho Nacional do Desporto (CND). Dessa forma, o caso do Bangu, que na década de 1950 adotou o logotipo da fábrica têxtil de mesmo nome do clube como seu emblema na camisa, não se encaixa exatamente como um patrocínio: tratava-se de uma espécie de estilização do escudo.

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Entre os principais clubes cariocas, o primeiro a ostentar em sua camisa uma marca que não a do fornecedor de material esportivo foi o Vasco. Os cruzmaltinos passaram a exibir por alguns meses, a partir da terceira fase do Brasileirão de 1983, a propaganda da Bandeirante Seguros. O seguinte — pouca gente sabe — foi o América, no fim daquele mesmo ano. O clube tijucano antecedeu assim a dupla Fla-Flu (em 1984) e o Botafogo (só em 1985).

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Desde meados de 1978, quando se tornou o primeiro clube do Rio de Janeiro a exibir a marca do fabricante de seu uniforme (a alemã Adidas, com suas tradicionais três listras nos ombros), o América vinha preservando seu manto rubro inalterado. Até que, em novembro de 1983, uma interessante proposta para o que atualmente se chama de “patrocínio máster” chegou à mesa dos dirigentes rubros, sendo negociada e aprovada.

Reprodução do Jornal do Brasil, de 12 de novembro de 1983

A empresa era a companhia aérea uruguaia Pluna, na época bastante atuante no Cone Sul e inclusive em fase de expansão, com rotas para a Europa recentemente abertas. Fundada em 1936, seu nome era, na verdade, um acrônimo para Primeras Líneas Uruguayas de Navegación Aérea. Naquele fim de 1983, a Seleção Brasileira havia voado de Pluna para Montevidéu onde enfrentara o Uruguai na decisão da Copa América.

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Segundo o Jornal do Brasil, o contrato entre o clube e a empresa estava avaliado em Cr$ 20 milhões. Em valores atualizados pelos vários indicadores disponíveis, o montante oscilaria entre cerca de R$ 142 mil e cerca de R$ 371 mil. Outra curiosidade ficava por conta do contrato exclusivo firmado pelo centroavante Luisinho — então artilheiro isolado do Estadual — com a empresa, sem valor divulgado na nota da imprensa.

Vale lembrar que a quantia cobriria a exposição da marca até o fim da participação do América naquele Estadual. Ou seja, poucas partidas: quando o acerto foi anunciado, em 12 de novembro de 1983, a Taça Rio já estava em sua antepenúltima rodada, e o América brigava (já quase sem chances) para se classificar ao triangular final do Carioca. A estreia do novo manto viria no dia seguinte, no clássico contra o Flamengo no Maracanã, há 36 anos.

Não foi, entretanto, uma estreia feliz: debaixo de chuva torrencial, o time dirigido pelo velho ídolo Edu perdeu por 2 a 0 para os rubro-negros, com gols de Adílio e Tita, um em cada tempo. Os dois jogos seguintes — contra o São Cristóvão em Caio Martins e o Fluminense em São Januário nos dias 20 e 26 de novembro — seriam os últimos com a marca da empresa de aviação estampada na camisa e trariam resultados melhores.

Contra o time cadete, o destaque foi Luisinho, que disparou na artilharia do campeonato ao marcar quatro vezes na goleada por 5 a 0, que teve ainda o zagueiro Maxwell anotando o outro tento em um bonito chute de primeira após cruzamento de Jorginho. Já diante dos tricolores, que escalaram um time inteiro reserva, outra vez Luisinho deu a vitória ao América, balançando as redes aos 41 minutos da etapa final.

Na despedida do primeiro patrocínio, gol de Luisinho vitória por 1 a 0 sobre o Fluminense | O Globo

Os outros resultados daquela última rodada, porém, decretaram o fim das ínfimas chances rubras de passar ao triangular decisivo — embora o América tenha terminado o certame com a segunda melhor campanha na soma dos turnos, atrás apenas do Bangu. E assim acabou a curta história do primeiro patrocínio do America, curiosamente sem ter sido utilizado uma única vez sequer na camisa número dois (branca).

Somente a partir de agosto de 1985, para o Campeonato Estadual daquele ano, o clube voltaria a exibir outra logomarca de empresa em seu uniforme: o do curso de informática CEOP, que após permanecer por todo aquele segundo semestre voltaria brevemente para a Taça Rio de 1986. Mais adiante naquele ano, seria a vez da madeireira Macanaíba, cuja marca foi exibida na camisa durante a inesquecível campanha semifinalista do Brasileirão.

*Emmanuel do Valle é jornalista e pesquisador da história do futebol brasileiro e internacional.

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