BANDA DESENHADA

Vozes Que Me Inspiram: Siouxsie

André Lissonger
Microphonia
Published in
4 min readMay 2, 2020

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Continuando a mini-série sobre as vozes que ouvi, me surpreendi e me inspiro para compor e cantar, atacando, dessa vez, com outra das minhas maiores musas: Siouxsie Sioux.

A primeira vez que cantei em um palco, pra valer, foi com uma velha camisa preta estampada com a imagem de Siouxsie. Camisa essa customizada grosseiramente, com as mangas cortadas, pois, na minha primeira banda, praticamente “suava em bicas” nos shows. Aliás, na maioria das vezes, não adiantava nem vestir uma camisa. Ou eu a tirava “pingando suor”, a partir da segunda ou terceira música, ou ficava todo o show “ensopado”.

Nesse início do meu ingresso na cena, nos anos 1986–1987, eu tinha outra camiseta branca, também customizada, com a estampa da Joplin. O mestre instrumentista e parceiro, Ordep Lemos, a usava mais, a ponto de insistir que a camisa era dele. Mas isso é assunto para outro dia — voltemos à voz!

Na verdade. eu ouvia tudo de pós-punk que nos chegava. Como a maioria dos discos era importada, as fitas K7 piratas predominavam. Siouxsie and The Banshees era uma das minhas bandas preferidas.

Numa daquelas noites depois de uma das nossas apresentações da Utopia, saí para uma noitada, em uma festa dark, onde estariam projetando o vídeo do show ao vivo Nocturne (1983).

Já de longe, me aproximando do point, ouvi o pulsar misterioso e oriental de Israel (essa música abre o evento). E, ao mesmo tempo, em meio aos que ali estavam, tive aquela linda visão de uma musa elegante, de cabelo curtíssimo, do cenário pós-punk baiano: Marcinha, com aquele olhar… tipo Lisa Stansfield.

Ao adentrar o recinto — um velho casarão eclético —, a projeção das imagens do antigo teatro/igreja neoclássico se misturava com aquele som tribal e de uma voz perfumante. Incenso made in Banglasesh vindo da Portobelo’s Road… e aí caiu a ficha, a provável origem daquele vídeo K7.

A ambiência criada, o som, as imagens projetadas e as roupas pretas (re)significaram o velho casarão. Eu, que nunca tinha assistido apresentações ao vivo dos Banshees, fiquei boquiaberto com a performance de Siouxsie.

Uma Diva!

Resta dizer que voltei para casa em êxtase dos sentidos. Já deitado na cama, com o headphone no volume máximo, psicotrópicos agindo na mente, ouvi pela centésima vez o álbum Hyaena (1984).

Aquela estética de camadas de vozes, arte, psicodelismo, texturas de hiper flangers com notas sinfônicas, minimalismo tribal, acumulados e envolventes ficaram e sempre estiveram densamente girando comigo.

Susan Janet Ballion, hoje, possui 62 anos. É uma cantora britânica que ficou bastante famosa com o grupo Siouxsie and the Banshees e seu projeto paralelo, formado com Budgie, a banda The Creatures. É considerada uma das mais importantes artistas de sua geração e também um dos ícones do rock, desde a década de 1970 até aos dias de hoje, tendo influenciado muito(a)s artistas. Dentre este(a)s, a cantora Liz Fraser, a voz celebrada no primeiro post desta série.

Entre 1981 e 1982, apresentou um problema na garganta. Passou a cantar de forma mais suave, seguindo recomendações médicas. Os álbuns que sucederam à década de 80’ estão submersos em atmosferas oníricas, criadas graças à inclusão de arranjos com outros instrumentos de cordas, além de outras referências orientais.

Os Banshees tinham dado o salto!

Três coisas que mais me impressionam nessa voz:

  1. O frequente uso de três oitavas: fazendo um percurso desde o grave, passando pelos médios e chegando até, algumas vezes, aos falsetes, tudo isso em uma mesma frase.
  2. Quando explora a liberdade na melodia de voz, modulando-a pelas harmonias e ritmos através de camadas, sobreposições de timbres e frequências.
  3. A íntima conexão dessas explorações vocais combinadas com o apuro da imagem ao vivo, seja no figurino e/ou seja nas performances.

Nos figurinos, variando desde os despojados “modelitos” punk aos mais elegantemente sofisticados sado; dos sumários trajes de sutiãs e meias calças arrastão, aos de uma executiva do alto escalão do clube das bruxas góticas.

Nas performances arrebatadoras, plenas de intensidade, charme e gesticulação teatral sensual. Chamam isso, também, de domínio de palco.

É um resultado estético de muita força! Estética do intenso.

Ouça e assista Cities in Dust (do álbum Tinderbox, 1985). E melhor, talvez outras músicas compostas e executadas na fase áurea dos Banshees, acompanhados dos arranjos do mítico Robert Smith (The Cure) nas guitarras… como a exemplo da faixa Dazzle, do já citado Hyaena.

Quais as suas impressões dessa voz? Deixe seus comentários abaixo.

Pois, desde quando vi pela primeira vez seu desempenho voz-performance, estou sempre à espera de sua nova aparição. Deste deslumbre! Seja no palco, completamente suada e vozeirão largado no ar… ou me olhando e girando na penumbra da pista de dança esfumaçada de um velho casarão.

“The stars that shine
And the stars that shrink
In the face of stagnation the water runs
Before your eyes”

André Lissonger para o Microphonia.

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André Lissonger
Microphonia

Microphonia editor and reporter . Architecture . Urban planning Professor . Rock music . Urban sketchers . Art