Mulheres que escrevem e um milhar de resistência

Comemorando 1k de seguidoras/es no Medium

Mulheres que Escrevem
Mulheres que Escrevem
4 min readJan 14, 2017

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Arte: Nhung Le

por Estela Rosa

Não é novidade para ninguém que o discurso hegemônico que narra a humanidade é, há muitos séculos, majoritariamente constituído por sujeitos de um perfil bastante específico e dominante: homens, heterossexuais, brancos e privilegiados economicamente. Às mulheres sobre estar à margem ou desfrutar o raso papel de musas. Sabemos que somos diversas em nossas narrativas, mas temos um passado borrado porque nunca fomos as donas da bola. Os donos da bola, homens, brancos, privilegiados, acabavam com o jogo quando quisessem e nós ficávamos apáticas sentadas na torcida.

A manutenção desta narrativa masculina funciona sistematicamente como uma forma de marginalizar as diversas narrativas vivenciadas por mulheres. No caso da Literatura, basta uma olhada rápida para o passado para entender do que estamos falando. Em uma palestra dada a uma turma de formandas mulheres de uma faculdade inglesa exclusiva para mulheres, em 1920, Virginia Woolf falava sobre a desigualdade no universo literário. Em 1920 o incômodo já existia e, ainda hoje, vivemos este incômodo de perto.

“Uma mulher precisa ter dinheiro e um teto todo seu, um espaço próprio, se quiser escrever ficção (…) e isso, como vocês verão, deixa sem solução o grande problema da verdadeira natureza da mulher e da verdadeira natureza da ficção. (…) mulheres e ficção permanecem, no que me concerne, problemas não resolvidos”

- Virginia Woolf

Oitenta anos depois e estamos aqui, unidas, buscando uma solução. Uma pesquisa feita pela professora Regina Dalcastagnè, que leva em consideração um período de quinze anos, de 1990 a 2004, buscou traçar um perfil dos escritores e dos personagens da literatura brasileira contemporânea. A conclusão de Dalcastagnè também não é novidade, mas ainda assim choca: “de todos os romances publicados pelas principais editoras brasileiras, em um período de 15 anos (de 1990 a 2004), 120 em 165 autores eram homens, ou seja, 72,7%. Mais gritante ainda é a homogeneidade racial: 93,9% dos autores são brancos. Mais de 60% deles vivem no Rio de Janeiro e em São Paulo. Quase todos estão em profissões que abarcam espaços já privilegiados de produção de discurso: os meios jornalístico e acadêmico”.

Mas e aí? O que fazer com isso? Como mudar uma realidade que parece cristalizada? É difícil não esmorecer e desistir, voltar-se para dentro e continuar escrevendo apenas para si mesmas. Mas é preciso resistir e seguir adiante, criar novas regras, inventar mais uma vez a bola e não estipular quem são os donos do jogo. Pegar na mão o destino de ser mulher e escritora é, de repente, se ver como jogadora, treinadora e torcida de si mesma e de todas as outras mulheres que se aproximam. É preciso ser líder de torcida, é preciso bater na mesa e puxar de dentro da alma a pergunta “E aí? O que vamos fazer?”.

E já estamos fazendo. Desde a resistência de Clarice, dos livros interrompidos de Jane Austen, dos cadernos de Carolina Maria de Jesus, até iniciativas atuais como a proposta pela jornalista Joanna Walsh de dedicar um ano inteiro a ler somente livros escritos por mulheres que nos levaram a movimentos tão necessários como o Leia Mulheres. Estamos resistindo e fazendo por nós mesmas. Criaremos nós mesmas as nossas regras e seguiremos remando contra a maré do desânimo, da marginalização, da descrença.

E é assim, nesse clima de resistência, que queremos celebrar a marca de 1.000 seguidores em nossa publicação do Medium. A Mulheres que escrevem é um projeto com menos de dois anos de vida, que cresce cada dia mais, que reforça cada dia mais a necessidade de abrirmos este espaço de diálogo, de diferenças, de diversidade. Um espaço onde somos líderes de torcida de nós mesmas e de todas as outras mulheres que resistem como escritoras. Nós vamos seguir falando, escrevendo, conversando, dialogando, nos reunindo, jogando nosso jogo até que nos ouçam e nos leiam. As vozes das mulheres que escrevem são muitas, plurais, ricas, intensas, com pulmões cheios de palavras e serão ouvidas. A cada novo texto e novo encontro, renovamos a sensação de que somos imparáveis. E seguiremos sendo.

AEEEEEEE

Que estes mil seguidores sigam conosco nossa caminhada. Ainda temos muito para andar, mas vamos juntas! Que venha 2017!

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