Uma perspectiva pessoal da morte

Bruno Oliveira
Reflexões
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4 min readDec 18, 2019

Platão introduz, no mundo ocidental, a ideia de um mundo ideal — um mundo das ideias e o mundo da nossa realidade (um mundo sensível). Nesse sentido, Nietzsche afirmava que a igreja católica (e demais religiões) é puro platonismo para a população: para ele, o catolicismo dividia a realidade entre um mundo ruim e um mundo bom, mas para ele existiria um único mundo, aquele que estamos sentindo as coisas neste momento. Não faria sentido a existência de um Deus. Mas Nietzsche não diz que Deus não existe, mas sim que Deus está morto (que não precisamos mais dessa ideia — que podemos construir nossa própria base de valores)!

“Não estaremos vagando através de um infinito nada? […] Os deuses também apodrecem! E Deus morreu! Deus está morto! E nós o matamos!” — Nietzsche (Gaia Ciência)

A morte nunca foi nada para nós. Morte é algo constante (a única certeza absoluta que temos), mas me parece que lidamos muito mal com ela (e com a finitude de todas as coisas). Talvez pela sua natureza misteriosa, a morte nos deixa aflitos, o medo do desconhecido é um grande tabu do ser humano.

“Quando me levantar, o céu estará morto e saqueado, eu mesmo estarei morto, morto meu desejo, morto o pântano sem acordes.” — Carlos Drummond (Sentimento do Mundo)

Epicuro, em A Conduta na Vida, dizia que tanto o corpo, quanto a alma, eram feitos de átomos que estes eram dissolvidos diante da morte. A morte, desse ponto de vista, não ocorre no mesmo momento da existência. Você não existe no momento em que você morre — não há dor envolvida. Não faz sentido ter receio da morte. Recear a morte é um dos motivos da infelicidade dos seres humanos. Quem soube viver, deve saber também morrer — não há motivo para se queixar quando a morte bater a porta.

Tolice afligir-se com a espera da morte, pois trata-se de algo que, uma vez vindo, não causa mal. Assim, o mais espantoso de todos os males, a morte, não é nada para nós, pois enquanto vivemos, ela não existe, e quando chega, não existimos mais.

Já houve um tempo em que não existimos, e não foi algo tão ruim assim não é? Pensamos demais na morte, quando no fundo é algo completamente natural e que sempre esteve ali, mais do que nossa própria existência.

“Não temo a morte. Já estive morto por bilhões de anos, antes de nascer, e isso não me causou nenhum incômodo.” — Mark Twain

E ainda que pareça óbvio, isso mostra outra perspectiva sobre pensar a morte: não somos apenas seres mortais, somos também seres natais! Nós nascemos, e isso é algo importante para entendermos a nós mesmos, e entendermos a morte. A morte é um grande mistério, mas nós somos um mistério ainda maior. Se pararmos para nos entender (presente e passado), conseguimos lidar melhor com o futuro (e com a morte que com certeza está nele). Dentro de cada um de nós, há um desconhecido e um universo de facetas que precisam ser descobertas, mistérios tão grandes quanto a morte — e devemos canalizar nossos esforços nele.

Enquanto a morte não chega, nos resta uma alternativa.

A morte dá sentido as coisas. A vida só tem significado (ainda que mínimo) porque um dia ela termina. Do ponto de vista prático, o fim, ajuda a focar nas entregas — ao saber que existe um prazo e que ele está chegando, as pessoas tendem a se empenhar mais para concluir determinada tarefa. Saber que existe a morte e que nossa existência é finita, nos ajuda a compreender que a nossa missão precisa ser exercida, e que fazê-la nesse lapso de tempo, é o que nos traz sentido para a vida. Já abordei como esse sentido da vida pode ocorrer, e como diria Kafka: “O sentido da vida é que ela termina”.

Todos vamos morrer. Mas não precisamos ter medo da morte. A morte não acontece com a gente, ele ocorre quando já não somos nós. Ou não existimos, como falou Mark Twain, ou já deixamos de existir, como fala Gilberto Gil, em sua filosofia transvestida de música:

Não tenho medo da morte / Mas medo de morrer, sim
A morte é depois de mim / Mas quem vai morrer sou eu
O derradeiro ato meu / E eu terei de estar presente
Assim como um presidente / Dando posse ao sucessor
Terei que morrer vivendo / Sabendo que já me vou

Algumas reflexões extra sobre a morte:

A Morte.

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Bruno Oliveira
Reflexões

Auditor, escritor, leitor e flanador. Mestrando em TI, tropecei na bolsa de valores. Acredito nas estrelas, não nos astros. Resenho pessoas e o tempo presente.