Contos
De Volta às Práticas Espirituais
Conversa Sob a Fogueira e as Manifestações do Trabalho Interno
*(O conto a seguir foi baseado em experiências reais)
- Haux, Haux, Haux!
- Haux, Haux, Haux!
E com essas palavras - de origem indígena e utilizada em rituais antigos - encerrava-se mais uma prática espiritual noturna. Cada um dos irmãos e irmãs, que até então estavam deitados ou sentados em seus colchonetes extendidos no piso do Instituto, agora encontravam-se todos de pé, interagindo e conversando a respeito da prática.
Localizado a algumas dezenas de quilômetros da cidade, lá na Chácara (Instituto) é possível respirar ar fresco graças à mescla de fazenda e mata. Até mesmo os líquens das árvores que lá habitam possuem uma coloração rosada, indicando a pureza daquele ar.
A estrutura principal do Instituto é toda feita de madeira — com suas bases de madeira maciça — e com acrílicos nas laterais do teto, que permitem a entrada de raios de sol pela manhã até o final da tarde. Há muitos enfeites e imagens espirituais espalhados pelo teto e pelas paredes, como filtros de sonhos, imagens de animais de poder, mestres espirituais etc.
Tudo foi construído visando a sustentabilidade: a água é obtida de um poço artesiano e captação de água de chuva; no telhado há placas de captação de energia solar; da gordura animal faz-se sabão; entre outras práticas.
Eram 22h00 e não demorou para alguém abrir a porta traseira do Instituto, onde havia um pequeno trajeto de terra - rodeado por grandes árvores e a natureza exuberante do terreno - que levava às fogueiras ali próximas, acesas por outros irmãos e irmãs (que não haviam realizado a prática naquela noite).
Era início de outono e as noites começavam a ficar mais frias, principalmente em meio àquela natureza.
Eu estava bem agasalhado, com meias de lã, conjunto moletom, um poncho bem grande e uma toca de pêlo de Lhama que meu amigo-irmão peruano Hermano havia me dado de presente quando retornara de Cuzco, sua cidade natal.
Meu Deus, que vento frio, Hermano!
Hermano e eu havíamos realizados a prática naquela noite e agora caminhávamos até as fogueiras, apreciando aquele vento frio, porém agradável, e sentindo a grande energia daquela lua cheia, que parecia encarar tudo abaixo dela, de maneira serena a atenciosa.
Lá o céu é tão limpo de poluição luminosa que é possível avistar inúmeras constelações estelares, manchas cósmicas e estrelas cadentes. Eventualmente escutávamos barulhos e cantos vindo da floresta por conta do vento e dos animais que nela habitam. Outras vezes jurávamos ter visto algo diferente no céu ou movendo-se em meio à escuridão…
Vai saber… eu acredito em extraterrestres, você não?… Nem a pau entro ali!… Hahah vai você primeiro!… Mano, falei pra você trazer luvas!… Sim, vamos pitar o seu tabaco!… Beleza, comemos alguma coisa antes de dormir… Chegamos!
Passado o leve declive daquele caminho de terra, finalmente havíamos chego às fogueiras, localizadas num terreno relativamente plano. A primeira delas era bem grande, com um raio de aproximadamente seis grandes passos até seu centro e com troncos de árvores ao redor, improvisados como bancos.
Haviam outras duas menores: uma delas diagonalmente à esquerda da primeira fogueira, com pessoas tocando tambores, violão, dançando e cantando músicas das antigas religiões; e a outra, localizada diagonalmente à direita da primeira, mais ao fundo, com pessoas dormindo dentro de sacos térmicos, bem agasalhadas e confortáveis.
Sentamos em volta da maior. Haviam 11 pessoas ao seu redor, contando conosco. Algumas conversavam baixinho entre elas, pitando tabaco - muito sagrado e respeitado pelos xamanistas devido ao seu poder de cura - em seus cachimbos; outras apenas contemplavam e aqueciam-se perante aquela bela chama, com ou sem cachimbos.
Começamos a pitar o tabaco que Hermano havia preparado na semana anterior e, compartilhando do mesmo cachimbo, - que fora entalhado artesanalmente por um outro irmão nosso do Instituto - começamos a conversar.
- Hermano, já estava com saudades de nossas conversas sob a fogueira.
- Si, eu também Irmão… La experiência en el barco, en mar, foi bom?
- Muito boa, era isso que eu estava pedindo ao Universo. Só não sabia que viria desta maneira: trabalhando por quatro meses em alto- mar…
- Nunca sabemos como ven, no?
- Pois é… Até hoje me supreendo com isso. É o trabalho interno agindo…
- Se confiamos y sabemos o que queremos, las cosas simplesmente acontecem…
(Naquele momento lembrara do livro que lera há um ano, “A Lei da Atração”, que falava justamente disso: de sabermos o que queremos para poder atrai-las.)
-Curioso: li um livro, há um ano, tratando deste assunto:
Para descobrirmos o que queremos, basta utilizarmos daquilo que não queremos e nos perguntarmos “Então o que eu realmente quero? E… pronto!
- Eliminar as dúvidas é a raíz no é mesmo, Irmão?
-Sim…
(Os estalos na madeira em chamas e o canto dos grilos ajudavam a criar o ambiente propício para aqueles tipos de conversas: agregadoras e reflexivas)
- E você… o que conta?
- Seguindo o trabalho interno: observando-me e buscando eliminar os “defeitos psicológicos”… muitos “Eus”…
- É uma jornada. Talvez levemos uma vida inteira…
-Si, verdad…
-E é isso que queremos, não?
-Si, si!
Era quase meia-noite quando nos levantamos para comer algo e - apesar da boa conversa - naquele momento só pensava em meu saco de dormir, situado em frente à outra fogueira, há alguns metros de onde estávamos.
Passado uns minutos após deitar-me e apreciar o belo céu noturno (como descrito anteriormente), viro-me repentinamente em direção à escuridão das árvores e percebo dois grandes olhos amarelos foscos, fitando-me.
(Meu Deus! Que susto!)
Percebi que era uma linda e enorme coruja marrom. Ficamos nos encarando por um longo segundo e, assim que ela silenciosamente abriu seu bico e direcionou seu pescoço à mim, - como num gesto de pergunta - foi embora.
(É o trabalho interno novamente se manifestando…)
E foi assim que, após quatro meses fora, retornava às atividades espirituais: com a sabedoria lançando-me uma pergunta, em plena lua cheia.
Gostou do conteúdo? Comente, compartilhe, deixe suas palminhas e assine nossa Newsletter para receber conteúdos gratuitos em primeira mão :)
Abraços de Falcão,
Pablo Gauna
Escritor do blog O Chamado do Guerreiro.
O Falcão também está presente no facebook, Instagram e LinkedIn.
* (Adquira o livro “A Lei da Atração” através da Amazon, clicando aqui)