A Era do Ferro: Uma cultura militante da força

Ricardo C. Thomé
O Conselho
Published in
8 min readApr 14, 2020

Um antídoto agressivo contra a pós-modernidade.

Diante de um contexto globalizado de esfacelamento das identidades locais, secularização do indivíduo humano e guerra cultural contra o arquétipo masculino, o ambiente virtual tem sido uma ferramenta de difusão de contra cultura e conexão entre aqueles de pensamento dissidente. Iniciado como forma de protesto contra a emasculação da mente e do corpo, a chamada Militant Culture Strength tem tomado forma por volta de 2010 nas redes sociais como forma de unificar o debate crítico sobre a masculinidade moderna, a sociedade liberal e o modo de vida contemporâneo. A tag logo ganhou derivações, e rostos comuns.

A Operation Werewolf — e seu fundador (o atleta fitness Paul Waggener) — foi uma das principais difusoras dessas ideias, aglutinando simpatizantes e reforçando a estética e os princípios da causa. O autor norte-americano Jack Donovan (A Way of Man, 2012) também é figura frequente dentro da pauta, expressando em suas obras uma espécie de culto a masculinidade e necessidade do tribalismo como ferramenta de resistência a degeneração do mundo moderno, como descrita por ele. A produção de textos, livros e material audiovisual logo alcançaria públicos estrangeiros ganhando adeptos e curiosos da ação online que, em sua propaganda, unia pautas masculinas, tradicionalismo, regionalismo, estética própria, artes marciais, levantamento de peso e ritualística esotérica. Tags como #militantculturestrength e #operationwerewolf ou #opww logo evidenciariam não apenas uma convergência de pautas, mas uma filosofia de vida. Esta que chamarei aqui de Cultura do Ferro.

Um culto à masculinidade.

Críticos do modo de vida predominante nas grandes metrópoles modernas simbolizada pelo consumismo, inocuidade espiritual, entretenimento vazio, alimentação pré-fabricada, infantilização do emocional do homem e aviltamento propagandístico da masculinidade, a Cultura do Ferro busca o reavivamento do homem em seu estado primal, se distanciando destes elementos e se aproximando mais da natureza e do desenvolvimento físico do corpo. Um primitivismo controlado que tem o objetivo de desintoxicar a mente daquilo que se entende por contemporaneidade.

Físico Militante.

Propondo um antagonismo a emasculação do indivíduo moderno, a Cultura do Ferro tem por princípio básico a busca por uma estética que espelhe força, presença e preparo. Você não pode ser um homem de aparente força externa e ideias vazias, mas o oposto também é verdade. Buscando um equilíbrio entre estes pontos, a causa busca tornar o seu próprio corpo um difusor moral de suas ideias, evitando a todo custo que suas palavras e atitudes não estejam em concordância. A prática de exercícios e artes marciais é um dos pontos de partida. Como cultura militante, é importante o convencimento através do exemplo e também da aparência, e o treino do próprio corpo é parte essencial desse propósito, demonstrando em meio a decadente modernidade esguia que sua força mental transborda também através de seu físico.

Tribalismo.

Sinalizando uma antítese à globalização, a ação busca incentivar a prática do tribalismo, que neste contexto significa o reforço dos laços e das culturas locais. Cientes de que a ambição de mudar o mundo focando em problemáticas globais só alimentam a frustração e a inércia, os militantes e simpatizantes da Cultura do Ferro veem o envolvimento em atividades comunitárias locais a chave para preencher o homem de significado e utilidade, formando irmandades e criando ligações reais com pessoas reais na busca de propósitos e estilos de vida similares. Tribalismo tem a ver com a consciência do número de pessoas que podemos influenciar e escala que podemos atingir como indivíduos. Ao invés de lutar pelo mundo, lutar por sua comunidade, por sua irmandade, pelos seus.

Espiritualidade e ancestralidade da terra.

O tribalismo nos leva a assimilação dos símbolos e crenças locais, valorizar o solo de onde veio e suas raízes históricas ou mitológicas. Waggener e Donovan — além de difusores da ideia, pertencem ao grupo militante Wolves of Vinland — adotaram a simbologia e ritualística do paganismo nórdico, é notável a influência das mitologias pré-cristãs em suas ideias e estética, um esoterismo importado da Escandinávia para o estilo de vida do grupo ao qual pertencem. Mas não se engane, apesar da religião dos seus difusores, o culto ao ferro não se restringe a simbologia nórdica, sua proposta é ser adaptável a localidade daquele que o pratica, por esse motivo irá variar com a geografia, de grupo para grupo, superando assim a barreira nacional, étnica ou religiosa.

Igualdade é um falso deus.

A realidade contemporânea vive uma errônea ideia de equanimidade. A indústria midiática, através de políticas transnacionais e entretenimento como ferramenta de controle de hábitos, busca o apagamento das culturas locais e das diferenças de gênero, credo e comportamentais no intuito de nos igualar forçosamente, criando assim um indivíduo universal, sem história, raízes ou particularidades. Críticos dos ideais democráticos, a Cultura do Ferro se aproxima muito mais de uma vertente aristocrática, de que os melhores naturalmente se sobressaem e por isso merecem suas posições de influência; neste sentido, a fragilidade e o vitimismo são duramente criticados na militância, isso porque a ação, como mencionado, busca se aproximar do estado natural do homem, da natureza em si, e nela a democracia não existe, mas sim a força do mais apto, do melhor.

A filosofia por trás da ação.

Entre os autores mais comumente mencionados dentre os adeptos desta ideia, seja nos textos, propagandas ou livros, estão os tradicionalistas Julius Evola (Revolt Against the Modern World), Kris Kershaw e Oswald Spengler (The Decline of the West); suas obras versam sobre a decadência moral da sociedade liberal, da destruição de signos e valores importantes para a manutenção daquilo que é eterno e elevado. Como é perceptível, tais ideias se conectam com os princípios da Militant Culture Strenght, por esse motivo autores da corrente filosófica tradicional são recorrentes nos materiais produzidos pelos grupos.

A mitologia do “werewolf” é parte do treinamento de jovens guerreiros através do mundo Indo Europeu (…) o menino simbolicamente morre, dentro de um período de aprendizado, se preparando para o momento em que irá se tornar parte da tribo, ter sua mulher, terra e sua própria prole. — escreve Kershaw.

Na vertente do esoterismo, derivados dos ensinamentos da autora Helena Blavatsky (escritora que influenciou muitas ideias de Evola) são um ferramental teórico evidente para a premissa da aceitação de diversas crenças, visto que a autora, através de um exercício de mitologia comparada, entende que cada crença ou mitologia possui elementos similares para a busca do ascetismo espiritual, elemento esse também contido no modo de vida dos adeptos do ferro, respeitando assim a particularidade ancestral e espiritual das mais diversas culturas.

Na história, partindo da ideia de que a modernidade é carente de figuras exemplares e heróis ou ídolos — agora fabricados pela mídia e esvaziados de qualquer virtude — os grandes conquistadores do passado são alvos de respeito e menções, figuras como Átila, o Huno, ou ao príncipe romeno Vlad Tepes (Drácula) O Empalador, são algumas das personalidades citadas, buscando resgatar homens reais que inspirem força através de seus feitos por seus povos e culturas. Tudo orbitando dentro da ideia do culto ao arquétipo masculino de força, regionalismo e ancestralidade.

O argumento estético, um modo de vida.

Monocromática, soturna e visualmente transgressora. A Cultura do Ferro é acima de tudo um estilo de vida, algo a ser praticado e não pensado, por este motivo a identidade estética acaba possuindo um papel importante na divulgação da pauta, sobretudo online, e esta definitivamente tem o seu lugar.

Cultura Fitness.

Adeptos com portes físicos agressivos, halterofilismo, treinamentos de artes marciais em grupos ou pares, de expressões firmes e evidencias de uma vida devotada ao desenvolvimento do corpo são partes da imagética da ideia. Uma expressão visual anti fragilidade, pertinente a principal mensagem da ação.

Irmandade, tradição, metal e estrada.

Resgatando a expressão agressiva masculina de subgêneros do metal, as vestes pretas, correntes, capuzes, botas, jaquetas e desenhos sobre a pele compõem o imaginário estético de um movimento que se propõe a passar a ideia de um barbarismo, um homem no limite entre a suavidade da civilidade e a fúria de um físico hostil, um estilo comum dentro de motoclubes ao redor do mundo, tendo em comum, além das vestes, um senso de irmandade entre os membros. Tudo isso envolto em influências musicais que transitam entre o black metal e o neofolk, com letras que remetem a períodos históricos de guerras, grandes impérios, mensagens sobre ancestralidade e mitologias variadas.

Morte, guerra e sacrifício.

Não uma veneração da morte, mas a lembrança de que se morrerá, para não teme-la; não um culto a guerra, mas a lembrança de que ela é inevitável, pois é uma constante. Trata-se da guerra contra si mesmo, não contra o mundo, trata-se da morte do seu lado mais fraco, não daquela literal. É sobre entender que a dor, o sangue, o sacrifício e o suor são sinais de que você está vivo, e por isso são bons, são desejados. Cicatrizes, marcas e desenhos no corpo que comuniquem isso são evidências de “guerras” passadas, e acolhidas por isso.

Por uma masculinidade militante.

Aqueles que passam os olhos superficialmente sobre o ideal da Cultura Militante do Ferro naturalmente tem uma reação adversa, os pensariam como extremistas ou mesmo violentos: são homens de força, carregados de desenhos pelo corpo e simbologia interna, de vestes agressivas e ar propositalmente sombrio e dúbio, mas tal aparência esconde um forte senso de irmandade entre homens, de revolta imagética contra o mundo exterior, de contraponto a polida e dócil modernidade, que ao mesmo tempo que critica tal postura destrói ela mesma seus símbolos e raízes. Homens organizando entre si rotinas de exercícios intensos, dietas, lutas marciais, suporte mútuo, praticando sua visão particular comum de fé e aprimorando a si mesmos, independendo da aprovação da sociedade para isso, sem — claro— deixar de passar a sua mensagem a ela.

Independente da controvérsia que seus idealizadores possam representar (seja por seus históricos individuais ou visão de mundo), talvez as maiores lições que se pode tirar da Cultura do Ferro são três, a primeira é (a despeito do sedentarismo urbano) não deixar de aprimorar o corpo, de se conectar com sua “besta interior”, pois ele é um reflexo do tipo de vida que você escolheu; a segunda é: forme uma “gangue”, não preencha sua mente com problemas globais que não tem poder algum para resolver, ao invés disso, forme uma irmandade dentre os de sua comunidade, fortaleça os laços, sua ancestralidade e cultura local, e crie ali o seu próprio mundo, independente do que acontecer no exterior, proteja os seus, fortaleça os teus, defenda-se com os teus da degradação cultural da modernidade; e a terceira é: não tenha medo de exercer e trabalhar a sua masculinidade interior.

Mantenha os irmãos perto. Forme uma tribo.

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Ricardo C. Thomé
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Criador do projeto O Conselho. Professor e livre opinador sobre o homem, vida, morte e tradição | Instagram @ricardocthome