Texto #Zero: A primeira Experiência Budista

Chrysologo Neto
Revista Passaporte
Published in
6 min readJan 16, 2018

Explicando a ideia

Existem objetos que carregam histórias na sua aparência, árvores carregam muito mais que isso

Assim como os textos budistas clássicos, o nome do autor e suas apresentações são sempre feitas em seu final, fazendo com que o leitor não crie pré-julgamentos a respeito da leitura, superestimando ou subestimando a história que vai ser contada. Bom, pelo menos foi o que ouvi falar.

Essa é uma boa manobra para os ensinamentos e, no meu caso, me serviu como desculpa pra fugir da difícil tarefa de falar de si mesmo, porque, de fato, isso não faz a mínima diferença.

A proposta dessa série de textos será mostrar para aqueles que tem curiosidade de adentrar no budismo e não fazem ideia como ele funciona na prática. Veja bem, na prática. Não irei detalhar a história, filosofia e, menos ainda, tentar explicar sobre budismo por meio de bases teóricas. Até mesmo porque não tenho bases sólidas no assunto e as chances d’eu falar asneiras são bem elevadas.

Os textos irão detalhar minha rotina em um retiro budista que ocorreu no verão de 2017. Na construção dessas série, irei descrever a percepção que tive sobre a prática, um pouco sobre as pessoas que conheci e como isso impactou minha vida.

Os textos foram escritos (quase) diariamente no período que decidi fazer esse registro pessoal. Logo, sintetizaram tudo que vivi no dia em que o escrevi e foram produzidos um pouco antes de dormir, então ficaram visíveis certas semelhanças a um diário de bordo.

A estrutura que eles tiveram seguiram um padrão de um pequeno parágrafo introdutório (bem pessoal) seguido por tópicos que foram relevantes no decorrer da vivência cotidiana. Ao rescreve-los tentei prezar por essa estrutura.

Na sequência de textos, os tópicos contarão, também, sobre a estrutura física desse centro, como funciona a contribuição em atividades, como é a comunidade que aqui reside e outras particularidades que, de maneira geral, não estamos acostumados.

Ao final desse texto é possível encontrar um sumário com fácil acesso para os demais capítulos dessa sequência e, como estão titulados por tema, auxiliam na navegação dentro dessa experiência.

Essa narrativa pode fazer o coração de alguns incendiar, assim como para outros pode dar a certeza que o budismo não é o caminho.

Onde estou

Entrada do CEBB (Viamão)

O retiro o qual participei é organizado anualmente pelo Centro de Estudos Budistas Bodisatva (CEBB), nesse caso, localizado em Viamão (RS). Foi um retiro de 12 dias onde o Lama Padma Samten, ilustre e amado mestre do budismo no Brasil, realizou ensinamentos dos dias 17 a 28 de fevereiro de 2017. Tais ensinamentos foram intercalados com práticas de meditação, yoga e muito bate-papo aberto sobre questões cotidianas muito inusitadas. Quem tiver vontade de conhecer mais detalhes sobre a CEBB basta acessar o link disposto no final desse texto.

Primeira impressões e ambientação

Área de plantação familiar de árvores frutíferas, logo após a entrada onde se delimita o CEBB

Logo ao chegar do CEBB de Viamão tinha nas costas uma viagem de cerca de 13 horas de duração, dividida em três sofridas conexões que rasgaram o Brasil de Boa Vista até Porto Alegre. Isso mesmo, viajei entre os extremos da nossa terrinha com tempo de sobra para meditar.

Além da aventura já contada, quando cheguei ao CM (Caminho do Meio) já eram por volta das 17h15, beirando o momento da janta. Logo ao entrar no espaço já foi gritante a mudança de atmosfera. Várias árvores de aparência milenar, campos bem esverdeados, hortas de agricultura familiar, espaço para camping, parquinhos feitos em madeira maciça que deixavam clara a missão deste centro: o equilíbrio homem, espirito e natureza.

Chuto, no mínimo, uns 100 anos pra essa figueira, anciões do CEBB afirmam mais de 500

Uns podem idealizar como uma sociedade alternativa, mas prefiro definir como um lugar onde todo hippie se sentiria à vontade e qualquer empresário se tornaria hippie. É de exuberante paz. Logo após me deparar com esse panorama fora do comum, fui em direção ao alojamento e não pude deixar de me apaixonar pelo templo budista aqui construído.

Não entrarei muito em detalhes porque ainda tenho uma série de textos para esmiuçar cada maravilha deste lugar. Ao chegar no alojamento escolhi uma cama usando o famoso “uni duni tê” e corri direto para o chuveiro. Estava exausto. Pareceu coincidência, mas logo ao sair do banho escutei um sino tocar. Mesmo sem saber, já eram 18h15 e estava na hora do rango.

Para os amantes da culinária vegetariana, hoje e nos próximos 12 dias, todas as refeições serão exclusivamente para agradar o grupo dos defensores das vaquinhas. Grupo que me sinto muito feliz em fazer parte. Nessa tão esperada janta (estava a mais de 13 horas sem comida de verdade) me deliciei com a sopa de grão de bico, pão caseiro com pasta de grão de bico (sim, bastante grão de bico) e uma torrada safadamente deliciosa. Safadamente, pois não faço ideia do que comi e estava muito gostoso. Para sobremesa foram servidas frutas orgânicas como pêssego e tangerina, acredito que frutas da estação.

Terminei de jantar beirando as 19h. Diariamente é feita uma prática budista chamada Puja, exatamente nesse horário. Corri do refeitório para o templo em meio ao chuvisco. Visando tornar a experiência mais crua, não irei definir o que é Puja. Pois, de qualquer modo, também não faço a mínima ideia do que seja. Mais simples explicar o que foi feito.

Estávamos em 4, onde o mais experiente de nós, pega um livro (semelhante a um hinário) onde estavam os ensinamentos e as preces, lendo-nos em voz alta enquanto o acompanhávamos, cada um com o seu livro. Muitos deles são “cantados” em tibetano. No final da prática, agradecemos a todos os mestres espirituais que nos possibilitaram todo conhecimento budista e o tutor da prática escreve em um caderno o nome de pessoas as quais desejavámos paz e boas energias, assim por se dizer.

Logo após a prática houve uma reunião da Mandala Audio-Visual, grupo responsável pelos equipamentos de som do retiro. Fiz parte para tentar contribuir em algo e também para me entrosar com o coletivo daqui. Não consegui evitar, me envolvi em tudo que me pediram.

Sem muito mais a ser feito, por volta das 22h, corri pra cama porque no dia seguinte teria que acordar, no mínimo, as 5h da manhã para acompanhar o ritmo das práticas espirituais desse pequeno paraíso budista.

O modelo que será seguido a partir do Texto #Um será semelhante a esse. Entretanto, pretendo separar em tópicos de interesse geral e ser mais específico, focando menos nos detalhes externos e oferecendo explicações mais precisas de coisas como o que é o Puja , esse maravilhoso cardápio vegetariano e minha perspectiva interna, tudo da minha ótica nua e crua de budista iniciante.

Sigamos o Caminho, ele que importa.

Link do Site do CEBB: Centro de Estudos Budistas Bodisatva.

Links da Sequência

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Chrysologo Neto
Revista Passaporte

He’s an overthinking guy and has dreams toward music production, alternative lifestyle and skateboard. He’s vegetarian, buddhist and almost a lier, almost.