Braid

Pedro Cabianca
Post Luden
Published in
5 min readMay 23, 2018

03/04 — 03/04

Em 2008, foi lançado um dos “pais” da cena atual de videogames independentes: Braid. Teve o Xbox 360 como primeiro lar, mas também habitou os computadores e o PlayStation 3.

Pode ser considerado um jogo puzzle de plataforma, com certo foco na narrativa. Há um documentário que menciona alguns aspectos da criação do game, mas, por mais que o filme não prejudique de forma alguma a experiência que você possa ter com o jogo em si, eu recomendo que não limite a sua experiência apenas em assistir Indie Game: The Movie.

Seu valor base no Steam é de R$27,99, porém ele pode ser encontrado por valores bem menores em promoções.

Análise fresca

Cara… ontem mesmo eu terminei Dust. Não, não é um jogo difícil. Eu morri algumas vezes, mas eu entendia quando o jogo estava me dando um freio, ou uma mensagem de “Amigo, talvez seja melhor você melhorar um pouco antes de seguir”; afinal, eu mesmo escolhi a dificuldade do game anterior, mas o que Braid fez comigo beirou o sujo. Em defesa do jogo, a minha experiência foi quebrada: eu já tinha começado o game antes do meu PC ser roubado, o Steam carregou meu progresso anterior pela Steam Cloud e hoje eu passei por cada fase novamente, simulando como se eu estivesse pegando de fato cada peça de quebra-cabeça mais uma vez e relendo cada diário. A história estava se formando na minha cabeça. Há alguns puzzles cuja solução não é “natural”. Diferente de Portal, a curva de aprendizado não acompanha o jogador. Você vai encontrar peças mais simples nos últimos mundos do jogo, algumas mais complexas que vão tomar um pouco mais do seu tempo e ainda outras que simplesmente quebram as regras da lógica. Eu não quero um tutorial me pegando na mãozinha e me levando até a resposta, mas eu quero uma relação de confiança com o jogo!

Eu já tinha sido pego pelo spoiler de que o Tim não é exatamente o mocinho da história, mas eu também não fazia ideia de que isso seria explicitado nos primeiros 20% do jogo. Sim, é nos primeiros 20% do jogo, porque depois disso, eu ainda fui pesquisar e descobri que esse cacete de jogo que “se diz” finalizado ainda tem time attack e 8 estrelas terrivelmente escondidas por ele todinho você só conseguiria encontrá-las usando um guia (quanto mais pegá-las).

Olha, eu não acho que seja um jogo de má qualidade, mas eu me senti traído. É como se ele nunca te instigasse a entender o mundo dentro dele. A impressão que me passou foi de que ele quis ser tão profundo e obscuro, que, sem a comunidade, ele não é completamente aproveitável. Eu não pararia de jogar ao final do sexto mundo, vendo a escada incompleta levando a um quarto no sótão, mas o lance das estrelas, da princesa, tudo isso, não me desceu pela garganta, sinto muito Jonathan. Ainda tenho uma enorme curiosidade por The Witness, mas Braid, claramente não foi um jogo feito para mim, como a série Souls, que eu sinto que ri quando eu morro sem tentar me ensinar nada com os meus erros.

Talvez outro dia. Ainda tenho muito pra estudar sobre o jogo…

Análise digerida

Talvez, depois de um ano de digestão, eu tenha encontrado uma forma de entender o papel de Braid no meu ano de 2017: Se eu já comparei a experiência de jogar um game específico a ler um livro, ou se não é tão estranho assim pessoas falando que assistir a um filme mais emocionante e surreal lembra a sensação de jogar videogame, o jogo que lançou o desenvolvedor Jonathan Blow me faz pensar na sensação de analisar um quadro.

Braid não foi feito apenas para ser jogado uma vez. Braid sequer foi feito apenas para ser jogado. Talvez ele não tenha a curva de aprendizado perfeita que Portal possui, ou talvez ele não seja muito claro no que ele espera do jogador, nem sempre dando pistas de cada um dos segredos que ele esconde, ou trazendo uma solução inusitada a um desafio específico que não será usada em nenhum outro momento da obra.

Com uma trilha sonora que poderia ser uma incrível playlist de estudos ou meditação, o jogo traz uma arte carismática e com bastante identidade, apresenta fases desafiadoras que podem te fazer vibrar ao compreendê-las ou esgotar a sua paciência após repetidas e frustrantes tentativas de solucionar quebra-cabeças. Conceitos já conhecidos nos videogames, como manipulação de tempo, e muita reflexão também estão presentes, porém apresentados sob uma nova ótica. Os “livros” presentes em alguns segmentos, com seus trechos de leitura selecionados, podem conversar bastante com alguém que não esteja em um bom momento de vida. As simbologias e teorias que rondam o jogo também abrem possibilidade para diferentes interpretações e rendem muita discussão.

Acredito que se eu tivesse jogado Braid na época em que saiu, e participasse de uma comunidade que debatesse a respeito e tentasse descobrir, em conjunto, tudo que há por trás do jogo, este poderia ser um dos games da minha vida.

Eu quis olhar para o quadro e lê-lo literalmente, procurar letras em uma ordem para saber do que se tratava, quando eu precisava respirar fundo, e deixar o tempo passar, continuar encarando a tela já pintada e deixar que ela me trouxesse sentimentos, pensamentos, memórias e cenários imaginários.
Essa análise pode não fazer muito sentido, mas acredito que nem tudo ligado a Braid faça. Este jogo tem o meu respeito, uma ponta de admiração, e uma sensação de que eu ainda o encontrarei de novo um dia, mas com outra mentalidade… e talvez pronto para apreciá-lo de uma forma diferente.

Veredito

Braid não é um jogo feito para qualquer um.

Quem estiver prestes a se aventurar pelo game deve abrir mão da sua impaciência e vestir humildade, curiosidade e determinação. Caso você esteja disposto a passar por isso, esta pode ser a porta para um jogo incrível, cheio de camadas mais profundas do que parecem, com discussões filosóficas e jogabilidade desafiadora.

Foi bem divertido encontrar estes dois Pedros com visões tão diferentes, quase opostas, relacionadas ao mesmo produto.

Possui fortes referências clássicas, tanto da pintura (Van Gogh), quanto da trilha sonora (diversos compositores de música clássica), quanto em seu game design (Super Mario Bros e Prince of Persia) mas ainda se reinventa diversas vezes.

Merece ser conhecido, jogado e explorado com muito cuidado.

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