Precisamos conversar sobre demissão de voluntários

Renato Diniz
Projeto Pato
Published in
5 min readJun 20, 2018

Um programa bem planejado e gerenciado é a melhor prevenção contra problemas. Quando os voluntários têm acesso a descrições de trabalho claras e bem desenvolvidas, passam por treinamentos apropriados para a posição que irão exercer e recebem apoio e reconhecimento adequados de seus supervisores, os programas geralmente funcionam sem problemas. No entanto, a verdade é que de vez em quando, um voluntário pode precisar ser demitido.

Um grande equívoco de instituições voluntárias é acreditar no fato de que voluntários não devem ser demitidos. Elas acreditam que por não serem pagos, eles não apresentam custos sobre a organização e por isto sua demissão não se faz necessária. Muitas vezes supervisores simplesmente permitem que voluntários desengajados permaneçam na organização fazendo o que querem, como querem. O que não é notado é que infelizmente, voluntários desengajados que permanecem na instituição acabam desestimulando outros membros envolvidos e isto leva a uma redução geral nas taxas de engajamento. A equipe e os outros voluntários que servem sua organização merecem ser parte de um ambiente de trabalho que honre o bom desempenho e resolva situações problemáticas. Todos nós somos desvalorizados quando o comportamento ou o desempenho de outra pessoa, até mesmo de um voluntário bem intencionado, é permitido continuar sem controle e sem correção. Se o voluntário não está promovendo a missão da organização, ajudando a alcançar as metas do programa, então a situação deve ser resolvida para o bem do programa e a moral de todos os membros.

Introdução

Em muitos casos, os problemas entre os voluntários e as organizações para as quais trabalham derivam da falta de planejamento e comunicação.
Como acontece com qualquer interação humana, o potencial de conflito aumenta quando as pessoas se sentem subestimadas ou incompreendidas. O primeiro passo é compreender os fatores que geram um bom programa de voluntários e acertar o ciclo de recrutamento, treinamento e gerenciamento (Volunteering Victoria, 2011).

Porém, é fato que em qualquer programa de voluntariado, eventualmente, haverá a necessidade do administrador de lidar com voluntários ineficazes, desmotivados e improdutivos. A pior e mais fácil ação para o supervisor é simplesmente ignorar a situação. Entretanto, por mais difícil que seja, o voluntário precisa ser avisado sobre seu comportamento e ter a chance de reagir e melhorar. Muitas vezes o voluntário não tem nem ideia do problema e basta uma boa conversa sobre seu desempenho para resolver a situação. Embora a sessão possa ser difícil, a alternativa de ignorar o problema pode ser ainda mais prejudicial para o programa (Culp & Doyle, 2011).

Causas para demissão

Sarah Rehnborg comenta que geralmente, a demissão de um voluntário advém como uma resposta a uma de três áreas de preocupação: problemas de desempenho, de conduta ou econômicos. Os problemas de desempenho geralmente estão relacionados à qualidade do trabalho, à quantidade de trabalho ou quanto a pontualidade do trabalho realizado. Problemas de conduta relacionam-se com comportamentos como postura, honestidade e sobriedade com outros membros da instituição. Embora possa parecer contra-intuitivo, problemas econômicos também podem se aplicar à área do voluntariado. Uma organização que sofreu cortes fiscais significativos, pode não ter fundos para contar com um número suficiente de supervisores para coordenar os voluntários, fornecer infra-estrutura adequada para o desenvolvimento de seus trabalhos ou pagar pelos treinamentos e capacitações de cada membro. Em situações como essas, os voluntários também podem ser vítimas dos mesmos déficits fiscais que reduziram a força de trabalho assalariada (Rehnborg, 2015).

Desenvolvendo um processo

Diferentes autores propõem que um dos passos fundamentais do processo de demissão de voluntários deve ser o de instituir uma política clara quanto ao desligamento (Fox & Sheehan, 2009; Francis & Savir, 2003). Voluntários jamais devem ser demitidos ser existir primeiro a definição de um processo sistemático. Ken Culp e Joyce Doyle apresentam algumas perguntas fundamentais para o entendimento pelos diretores da organização na hora de desenvolver este processo:

  • O voluntário compreende claramente suas responsabilidades? (O voluntário teve acesso a uma descrição de vaga? A descrição da posição indica os deveres necessários a serem cumpridos e estabelece ao supervisor responsável um guia do que deve ser exigido)
  • O responsável pelo voluntário encontrou-se com o voluntário para aconselhá-lo sobre a situação e desenvolveu um plano de remediação? (Geralmente, duas intervenções devem ser agendadas antes do término de um voluntário, exceto em situações mais graves como as que envolvem violência ou assédio)
  • Alguma circunstância atenuante influencia a situação? (O voluntário está sob estresse? A situação do voluntário mudou? Outras circunstâncias estão contribuindo para a situação?)
  • O voluntário foi formalmente avaliado? (A preocupação foi identificada em uma avaliação escrita? A avaliação foi assinada tanto pelo voluntário quanto pelo responsável direto?)

Conclusão

Um grande mito dentro do terceiro setor ainda é o de que administradores não podem demitir voluntário pois se o fizerem, o programa irá desmoronar.
Porém se este for realmente o caso, é sinal que a instituição apresenta problemas muito mais profundos com seu programa de voluntários (Groff, 2003).

É importante lembrar que o desligamento é uma parte natural de todo relacionamento. Comunicar aos voluntários que os objetivos da organização não estão sendo cumpridos e que é do melhor interesse de todos os envolvidos que ocorra o desligamento dele da instituição é importante não só para a gestão interna, mas para o proprio bem estar do voluntário. Embora o administrador possa querer ignorar ou evitar a situação, para o melhor interesse da organização, de seus programas, da clientela e de outros voluntários, a decisão de desvincular um membro deve ser tomada sempre que identificada como necessária.

Adendo - Quando os voluntários são os proprios clientes da organização

Programas que tem o foco no voluntariado como um benefício para o proprio voluntário também tem grande dificuldade com este tipo de questão, porque eles classificam os voluntários como ‘clientes’ do programa, e é filosoficamente difícil justificar a rescisão de um cliente. O requisito principal para entendimento deste processo é o de que em geral, quando questionamentos sobre a permanência de um voluntário dentro de sua organização começam a surgir, é que ela seja provavelmente apropriada. Ao longo dos anos, essa tem sido uma questão difícil para muitos administradores individuais abordarem, provavelmente porque são muito orientados para as pessoas e apreciam a disposição dos outros em ajudar em seus programas. Estes gestores tiveram particular dificuldade em lidar com situações em que a decisão de terminar não se devia a qualquer ‘falha’ particular por parte do voluntário, mas sim devido a problemas de saúde ou a uma mudança nas necessidades do programa (McCurley, 1993). Mesmo sendo clientes do programa, voluntários que não participam ativamente do processo desvalorizam o programa para outros voluntários que ainda creem na organização. Portanto deixa-los a esmo não deve ser considerada uma atitute consequências negativas.

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Renato Diniz
Projeto Pato

Coordenador Regional no Students For Liberty Brasil e escritor no @projetopato