Eleições 2020 e Escolha Pública: será que você pode confiar em quem foi eleito hoje?

A economia pode nos ajudar a explicar por que a política brasileira é tão suja, e por que brasileiros confiam tão pouco em seus políticos

Amanda de Vasconcellos
O Prontuário
4 min readNov 15, 2020

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Os brasileiros acabaram de descobrir quais foram os candidatos votados para governarem nossas cidades pelos próximos 4 anos. Embora parte da população seja politicamente ativa, eu costumo ver na maior parte dos meus conhecidos um ceticismo quanto à política. Brasileiros não costumam confiar em seus políticos.

Com todo respeito aos governantes com quem já tive contato, eu entendo a desconfiança, e também a possuo. Sendo liberal, duvidar da autoridade pública é uma das bases de minhas crenças. Por isso, não quero pedir a nenhum de meus leitores que acreditem naqueles que foram eleitos: duvidem. Ao menos na teoria, o povo é soberano em um regime democrático. Não sejamos soberanos coniventes: é importante que os políticos estejam sempre prestando contas a nós. Aqueles que estão no poder não merecem confiança cega, mas sim uma confiança que seja conquistada e reconquistada a todo momento.

O que quero, então, é falar da Teoria de Escolha Pública. Antes que você feche esse texto, permita-me perguntar: por que você desconfia de políticos? Por que os políticos brasileiros são tão ruins? São só os brasileiros? É por causa da corrupção? Se sim, por que a política é tão suja? Por que a política brasileira é tão suja? Será que há algum contaminante na água de Brasília que torna nossos políticos ruins?

Na realidade, a política tem alguns problemas inerentes, que não podem ser facilmente resolvidos — talvez sequer possam ser resolvidos! Um deles, que é interessante abordar no dia em que fomos às urnas, são os incentivos que as pessoas possuem para participarem da política com seus meros votos.

A Teoria da Escolha Pública é um campo da economia que se preocupa justamente com esses incentivos. Longe de se preocupar apenas com números e finanças, a economia busca entender o comportamento humano. Pessoas, como eu já havia falado anteriormente neste blog, reagem a estímulos externos, a incentivos, a escassez e a abundância. Se assim agimos em todas as áreas de nossas vidas, não há razão para que fosse diferente na hora de escolhermos nossos representantes.

Políticos, burocratas, lobistas, e eleitores estão todos sujeitos a incentivos, de modo que nem sempre boas intenções são traduzidas em boas medidas governamentais. Compreender quais os custos e benefícios envolvidos em cada ação na política é essencial para entender o funcionamento das instituições.

Na hora do próprio voto, por exemplo, os custos envolvidos com um voto podem determinar os resultados de uma eleição. Suponha que 100 pessoas devem votar a favor ou contra uma nova lei, que determina que o governo cobrará uma taxa de $10 de 90 pessoas, queimar metade da soma coletada, e dar a outra metade aos 10 que não foram taxados. Se todos puderem votar, é evidente que os 90 serão contrários à lei. Se, todavia, o governo decidisse que cada um precisaria pagar $15 para votar, apenas os 10 não taxados teriam um benefício, e apenas eles votariam.

Esse exemplo se baseia no princípio dos benefícios concentrados e custos dispersos. A lei representaria um custo à sociedade, pois um grupo pagaria $900 para que outro recebesse $450. Houve uma perda de dinheiro, e a sociedade piorou, mas o benefício de $450 foi compartilhado por uma minoria influente, que permitiu que a lei passsasse. Como o custo de $900 está disperso entre várias pessoas, cada uma delas possui menores incentivos para votar.

Supor que o governo cobrará uma taxa para votar uma lei é um tanto quanto esdrúxulo, todavia, nós temos sim que arcar com certos custos quando votamos na vida real. Temos de investir tempo se quisermos compreender leis, e até mesmo em eleições de representantes municipais, como as de hoje, há um gasto de tempo (e possivelmente de dinheiro) para fisicamente visitar a zona eleitoral e apertar os botões da urna eletrônica.

São vários os princípios que explicam as más decisões que governos tomam, e a Teoria de Escolha Pública se preocupa justamente com eles. O vereador que você elegeu hoje, por exemplo, pode se abster de uma votação por considerar custoso participar dela. Escolhas racionais para indivíduos nem sempre trazem benefícios à sociedade como um todo, e isso é esperado.

Assim, podemos perceber que não é a maldade humana ou a má índole brasileira que prejudica o bom funcionamento de governos. A Teoria de Escolha Pública faz parte de uma área mais ampla chamada economia comportamental, que traz vários exemplos de como as motivações das pessoas não são tão dependentes de bem e mal como nós gostaríamos de acreditar. Com essa breve introdução, espero que você consiga, pelos próximos 4 anos, acompanhar a ação do governo sabendo que há ótimos motivos para ser rígido com seus representantes, no entanto sabendo também que esses motivos não necessariamente estão relacionados ao caráter individual de políticos.

Para saber mais:

Assista a esta aula do professor Antony Davies, da Duquesne University, sobre a Teoria de Escolha Pública, disponibilizada ao público pela Learn Liberty.

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