O distrito da luz vermelha de Amsterdã poderá em breve ser uma memória distante — e aqui está o porquê

O que já pareceu uma abordagem revolucionária para prostituição na Holanda agora é claramente vista como um desastre, por todos, exceto aqueles que procuram lucrar com isso

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QG Feminista
5 min readApr 19, 2018

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Por Julie Bindel — traduzido do Indepedent.co.uk

De Wallen é o distrito da luz vermelha de Amesterdã, e políticos holandeses estão considerando uma nova lei para criminalizar os clientes por contratarem uma prostituta que pode ter sido traficadas — Foto: AFP

De Wallen, o infame distrito da luz vermelha em Amsterdã, Holanda, está sob ameaça. Muitos de seus bordéis de vitrine*, em que as mulheres são exibidas como carcaças para o entretenimento de turistas sexuais, estão fechando. A maioria das zonas de prostituição de rua legais pelo país fecharam, e em breve eles todas deixarão de funcionar. Um número de políticos e as autoridades agora estão aceitando a prostituição legalizada tem sido um desastre completo. Atualmente há uma proposta de lei que está sendo considerada pelo Senado Holandês que, se passar, poderia resultar nos clientes sendo criminalizados se pagassem por sexo com uma mulher traficada, cafetinada ou coagida de alguma maneira. Estas mudanças são o resultado de um vibrante movimento abolicionista do comércio do sexo emergindo na Holanda

Os holandeses legalizaram sua indústria de bordéis no ano 2000. O governo prometeu que isto resultaria em segurança para as mulheres, e um fim para o tráfico. Reivindicou que tudo estaria às claras, seguro e limpo. O oposto aconteceu. O turismo sexual é agora uma indústria enorme, com homens britânicos sendo um dos grupos de Europeus que visitam a cidade para pagar por sexo. Um número de clientes que eu entrevistei me disseram que nem sonhariam em usar mulheres prostituídas no país onde eles vivem, mas estar na Holanda lhes deu essa permissão.

O ilegal e não licenciado comércio sexual cresceu sob a legalização, o tráfico de mulheres aumentou dramaticamente, a demanda está em ascensão e as mulheres certamente não estão mais seguras do que estavam quando a cafetinagem era ilegal.

Fotos são proibidas no distrito, mas na era dos smartphones podemos achar algumas imagens de como são expostas essas mulheres em suas vitrines — Foto: Hollandse Hoogte/Patrick van Katwijk

Eu tenho visitado Holanda no decorrer de 15 anos, pesquisando as consequências da legalização. Eu entrevistei os compradores de sexo (incluindo um que me disse que pagou por sexo pela primeira vez quando tinha 12), as mulheres nos bordéis, os cafetões e os lobistas pró-legalização que lucram às custas de mulheres prostituídas.

Xaviera Hollander é uma grande parte da máquina de propaganda que promove a noção de que mulheres prostituídas sob a legalização estão muito bem. Hollander é conhecida por seu livro de memórias publicado em 1972, “The Happy Hooker: My Own Story” (A Prostituta Feliz: Minha Própria História”), que foi vendido aos montes. Fui visitá-la em sua casa em Amsterdã, para perguntar se ela acha que as mulheres são felizes sob a legalização. Ela me admitiu que o tráfico está em ascensão, e que a legalização está longe de remover efetivamente a criminalidade do comércio do sexo. Vindo de uma ex-cafetina, isto é algo extraordinário.

Há um grande número guias de turismo que oferecem excursões em torno das áreas de luzes vermelhas de Amsterdã. Eu fui em uma dessas tours ano passado, e foi dito que a legalização é um modelo perfeito, que as mulheres são seguras e felizes e o público aceita os bordéis de vitrine como parte da arquitetura. Eu perguntei ao guia de onde ele tirou essa informação e ele disse que o Centro de Informação de Prostituição (Prostitution Information Centre — PIC) fornece, por uma taxa, informação para todas as companhias de turismo.

O PIC funciona como um negócio de mulheres que dizem ser “trabalhadoras do sexo”. Na realidade elas não parecem ser nada disso, sendo uma companhia cobrando por essas orientações e portanto lucrando com a prostituição.

Mais uma imagem não autorizada do De Wallen, sem autor — tirada daqui

O que uma vez parecia uma abordagem revolucionária para prostituição na Holanda agora é claramente vista como um desastre, por todos, exceto aqueles que procuram fazer lucrar com a prostituição.

Jolanda Boer é um promotor público sênior se especializando em tráfico humano. Nos últimos anos, Boer investigou mais de 100 desses casos em Amsterdam. “Houve casos em que a garota tinha sido estuprada por seus cafetões e ameaçada para trabalhar atrás das vitrines. As mulheres não estão em posição de dizer livremente às pessoas quando algo vai mal. Mas é claro que elas estão sorrindo, porque se você não sorrir não vai conseguir um cliente, “diz Boer.

No sábado, falei com uma sala lotada sobre o meu livro sobre o comércio sexual global. O evento foi realizado no distrito da luz vermelha, em um prédio que tinha sido anteriormente um salão de massagens chinesas oferecendo “finais felizes”. Eu esperava algum tipo de protesto, ou infiltração pelo lobby pro-prostituição. Mas cada pessoa na sala estava lá porque reconheceram que a prostituição é um abuso de direitos humanos, prejudicial às mulheres envolvidas, e que a legalização foi desastrosa.

Cafetinagem da Prostituição: Abolindo o mito do trabalho sexual, livro de Julie Bindel

No dia seguinte eu estava em Haia, a casa do parlamento Holandês, lançando meu livro na frente de dúzias de cidadãos preocupados, todos que já aguentaram bastante da Holanda sendo tratada como modelo perfeito em lidar com a prostituição. Depois do lançamento, dezenas de nós marchamos ao longo do distrito da luz vermelha local, levantando faixas e cartazes com dizeres como “Acabem com o comércio sexual” e “Já chega!”. Foi o primeiro protesto contra os bordéis legalizados.

O império holandês está desintegrando-se. Mais de um terço de todos os bordéis de vitrine fecharam, e mais perderão logo suas licenças. Um grupo de 10 traficantes Húngaros estão atualmente sendo julgados em Haia, e muitos relatórios do julgamento ligam o tráfico de mulheres ao modelo legalizado. Há um grande caminho a percorrer, mas agora que feministas estão tendo a audácia de falar contra o desastroso modelo Holandês de legalização, não tem como voltar atrás.

Julie Bindel é autora do livro “Cafetinagem da Prostituição: Abolindo o mito do trabalho sexual” (‘ Pimping of Prostitution: Abolishing the Sex Work Myth’ — Palgrave McMillan, 2017)

*Escolhi traduzir window brothel (bordel janela) como bordel vitrine, já que a palavra window serve tanto para janela como para vitrine, lembrando a expressão "window shopping", que seria algo como 'compras de vitrine', usada para quando ficamos olhando os produtos pela vitrine, que é como parece um passeio pelo distrito da luz vermelha, em que as mulheres são exibidas para compra e o que nos divide é um vidro.

Temos uma resenha do livro e outras matérias da Julie Bindel traduzidas aqui no QG Feminista:

“A Cafetinagem da Prostituição”, de Julie Bindel, destrói os mitos do mercado do sexo com detalhes implacáveis

A Maioria das “Profissionais do Sexo” são escravas modernas

Por que a prostituição nunca deve ser legalizada

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