Não sabemos lidar com o racismo

deivy
re_corte
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5 min readApr 21, 2019

Esses dias eu entrei numa conversa sobre como o negro é visto dentro do país. Como ele é visto pelos próprios brasileiros. E a mídia glorifica esse estereótipo a todos os lados, educando e tornando cultural as frases, palavras e atitudes que deixam no mais baixo solo a negritude, e todo o seu povo. Enquanto uma nova supremacia branca (e embranquecida) é designada ao topo da alta-sociedade. Isso significa que, dentro da sociedade brasileira, há um genocídio acontecendo a todo momento — a cada 23 minutos um jovem negro é morto violentamente, isso diz muita coisa. Mas é somente a ponta do iceberg.

Noutro ponto, podemos ver também em empregabilidade. Onde as pessoas negras recebem 40% a menos que pessoas brancas — sem distinção de gênero. Agora, temos um abismo gigantesco, que só reflete o quanto não estamos prontos e preparados, tão pouco disposto, à lutar contra o racismo que há dentro da nossa cultura e da nossa sociedade. E isso significa que vai desde os movimentos sociais defendido pelas minorias até os relacionamentos inter-raciais que vão se formando ao longo do tempo.

No final de março apresentei um slide em sala para 44 alunos, um frio na barrida podia ser notado evidentemente com o tremor das minhas mãos. Eu estava com medo de como o conteúdo feito iria ser recebido por eles, e como tudo iria ser desenvolvido em meio as perguntas, aos olhares. E em algumas palavras dos participantes, entra a minha voz, grave e tremula. Explicando tudo e todos os braços do racismo estrutural que há nas nossas raízes, afinal, as próprias raízes cresceram com o racismo e formaram grandes árvores — que muitos fingem não ver. Isso me deu um grande conhecimento além do que estou acostumado a perceber com frequência, que hoje, consigo enxergar detalhadamente cada questão.

Os movimentos sociais

Eu enxergava a comunidade LGBT+ como um dos melhores lugares de se vivenciar experiências e conceitos relacionados à sexualidade, e de fato é. Antes de ter contato com as vivências opressivas por questões de raça, me sentia completamente acolhido e protegido ali dentro. Tinha opinião nos debates, voz em análise de políticas públicas, realmente eu tive uma bandeira para levantar e dizer sentir orgulho em fazer parte. Ledo engano. Quando você se dispõe a estudar toda a sociedade em pequenos traços e pedaços, tudo fica evidente aos seus olhos. A questão estrutural está envolvida em todos os movimentos sociais por uma questão cultural que nos envolve e nos faz reproduzir tais discursos e defendê-los com unhas e dentes. Mas o corpo negro sempre é deixado de lado.

A cultura LGBT+ se assimila muito à heterossexualidade. Ambos hipersexualizam o corpo negro como ‘uma máquina de sexo’, o coloca em questões racistas em diversos momentos. Pode tirar a prova dentro dos vídeos pornográficos, desde os títulos aos conteúdos vistos por milhões de usuários como um fetiche. Por ser LGBT e negro, nos negam afeto, porque o negro não sente, não ama. E nos colocam à beira da sociedade. Pode ser provado através dos recortes raciais dentro das próprias estatísticas.

O feminismo não fica atrás

Simpatizei com um dos braços do feminismo quando tive o primeiro contato, o feminismo negro, mas apenas de aprovar a ideia para mim, mesmo tendo diversas dúvidas na minha cabeça, uma delas: Se o feminismo defende à igualdade de todas as mulheres, porquê deveria existir outras vertentes como o feminismo trans? Isso mostra que há um abismo muito maior do que pensávamos entre pessoas brancas e negras dentro da nossa sociedade, em todos os aspectos.

O feminismo negro é falácia. Vivemos numa sociedade racista e sexista. Se formos retornar ao tempo colonial, teremos um governo ali presente investindo na busca de pessoas não-brancas para estuprar as mulheres negras escravizadas para que a população fosse clareando, embranquecendo, logo, comemorar a miscigenação é jogar ao lixo o ventre que pariu o mundo. A pirâmide que tantos exaltam como ‘a visão determinante’ do país é, também, validação para essa conversa para boi dormir. Ter dado origem ao tal ‘feminismo negro’ é apenas uma cortina de fumaça para as mulheres negras se proporem a enxergarem o que realmente está acontecendo no nosso território. Você pode tirar por essa matéria.

Se vivemos num país racista, porquê criar vertentes de movimentos brancos? Para nos matar!

Retornando também ao período colonial. Sabemos, evidentemente, que o grande causador das desgraças que acontecem até os dias de hoje são culpa da raça branca. Onde, se vendo como superior às outras raças, saiu dizimando e se apossando de terras e culturas como se nada tivesse errado — pois a sua religião permitia que pessoas indígenas e negras fossem escravizadas e torturadas, pois era defendido, pela religião, que não tinham alma e eram possuídas pelo demônio. Logo, não há porquê acreditar que pessoas brancas podem não ser racistas em algum momento, e que podem entrar em relacionamento com pessoas negras, a famosa palmitagem, já que o branco é desconstruído o suficiente.

Faz parte da cultura embranquecida sentir-se superior e determinar o que é certo e errado. Os descendentes de brancos colonizadores também possuem esse instinto agressor (moral, físico, intelectual). Isso significa que todo branco é racista, sem exceção, mesmo que tenham o pai ou a mãe negra. Mesmo que tenham namorado uma pessoa negra. Ou que tenha um amigo negro. Afinal, todo colonizador teve o seu mucamo preferido.

Photo by JD Mason on Unsplash

Quando condenamos a palmitagem, queremos proteger os nossos de futuros comentários racistas que podem vir do seu parceiro(a) e também dessas carteiradas quando a pessoa é racista. Claro, isso não significa que proibimos e privamos as pessoas negras de se relacionarem de alguma maneira com outras pessoas brancas — cada um faz o que quer de si. Mas partindo do momento em que dissecamos todo tipo de relação inter-racial, vemos que estamos longe de saber lidar com o racismo. Pois há muitos negros ‘passando pano’ para atitudes racistas como se a sua relação com o mesmo relativasse tudo que viesse a dizer. São essas carteiradas que impedem os nossos irmãos (negros) de verem o mundo como ele realmente é. Ou conseguem ver claramente, pois a síndrome de capitão do mato ainda assola a muitos.

Há muitas pessoas negras que dão suas vidas para estarem em lugares brancos, embranquecidos, pois acreditam ganhar mais servindo de carteira do que ao lado dos seus irmãos recuperando e aprimorando a sua identidade e revendo a maneira que está inserido na sociedade. É um ledo engano.

Pois no final, todos vão para o mesmo tronco caso não se rebele e fuja desses espaços.

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deivy
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um usuário frenético por algo mais concreto. em caso de desistência só resta sobrevivência. entre acasos, espero o despacho do meu corpo magro e vívido.