A guerra dos ministérios: o centrão rompeu com Bolsonaro?

Novos lances trazem dúvidas no eterno xadrez de Brasília

João Vitor Castro
Revista Brado
13 min readMar 30, 2021

--

O presidente Jair Bolsonaro entre os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco. Mais à esquerda está o presidente do STF, Luiz Fux, e atrás do presidente o ministro das Comunicações, Fábio Faria. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Na última segunda-feira (29), seis mudanças foram anunciadas na Esplanada dos Ministérios. Os movimentos do governo Bolsonaro, contudo, foram dúbios: alguns parecem ter agradado o centrão e caminhado para um apaziguamento institucional; outros parecem ter fortificado a base ideológica do governo e apontado para uma radicalização. Quer entender melhor como tudo isso se desenhou e o que esperar a partir de agora? Vem comigo!

“Os remédios políticos no Parlamento são conhecidos e são todos amargos, alguns fatais. Muitas vezes são aplicados quando a espiral de erros de avaliação se torna uma escala geométrica incontrolável”.

A fala acima foi proferida pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, logo após reunião com o presidente Jair Bolsonaro, governadores e outros representantes dos três Poderes para tratar de ações de combate à pandemia, realizada na última quarta-feira (24) no Palácio da Alvorada. Porém, antes de tratar da ameaça explícita de Lira, voltemos um pouco no tempo.

No dia 1º de fevereiro o Congresso elegeu Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), respectivamente, presidentes da Câmara e do Senado para os anos de 2021 e 2022, após uma corrida eleitoral que envolveu tentativas de manobra constitucional, coalizões inimagináveis, sucessivas traições e interferências diretas do governo federal. O Palácio do Planalto liberou mais de 3 bilhões de reais em emendas para que os parlamentares votassem em Lira e Pacheco.

A partir de então, começou o burburinho: Bolsonaro comprou o centrão ou o centrão comprou Bolsonaro? Em meu texto “A democracia em frangalhos”, explico que, na verdade, um pouco dos dois. Sim, é claro que o Executivo selou uma importante aliança que, se bem cultivada, pode lhe garantir sucessivas vitórias, desde o privilégio de pautas governistas na agenda de debates das duas Casas até o bloqueio absoluto de processos de impeachment e instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs).

Entretanto, o preço do centrão é alto, e seus lucros, consequentemente, são exorbitantes. Isso em diversos cenários: se o governo vai bem, ganham vantagens eleitorais entre a população; se o governo tem altos e baixos, podem explorar de forma inteligente esses pontos fracos e fortes para ganhos políticos; se o governo vai mal, podem aumentar as cobranças e exigir mais concessões do Planalto em troca de sustentação. O preço do centrão, além de alto, é volátil. Ele oscila de acordo com o momentum. E ao fechar com esse bloco, a quebra de contrato é fatal.

Um dos mais emblemáticos líderes que o centrão já teve, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi um dos principais responsáveis pelo impeachment de Dilma Rousseff. Cunha era investigado por corrupção e, poucos meses antes de abrir o processo contra a ex-presidente, tentou reforçar os acordos que tinha com o Planalto para se proteger. Dilma recusou as negociações e o impeachment foi aberto. Foto: Lula Marques/ AGPT (09/03/2015)

Se o governo tropeça uma vez, o centrão perdoa; se tropeça duas, o centrão estranha; se tropeça três, o centrão encara como esbarrão proposital; e na quarta o contragolpe é a rasteira. Metáforas à parte, a tradição política brasileira é que todo governo começa a caminhar com as próprias pernas, e quando essas não aguentam mais, recorre-se ao centrão. Ou seja, ele funciona como uma bengala: sem ele, o governo se esborracha no chão.

No início, os presidentes das Casas pareciam bastante empenhados em cumprir sua parte da promessa. Pacheco foge da palavra CPI como o diabo foge da cruz. Lira, por sua vez, um dos mais dedicados aprendizes do mitológico Eduardo Cunha, o príncipe do fisiologismo, já iniciou seu reinado com um golpe na Mesa diretora recém-eleita (também tema do já citado texto), além de entregar diversas comissões ao bolsonarismo.

As deputadas Carla Zambelli (PSL-SP) e Bia Kicis (PSL-DF) são as presidentes, respectivamente, da Comissão de Meio Ambiente e da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Foto: Reprodução

As últimas semanas, contudo, fizeram a brisa leve de Brasília se transformar em furacão. Diversos gestos do presidente passaram a sensação de que ele está, como de praxe, esticando a corda de sua relação com os líderes do Parlamento. Uma das mais graves foi a humilhação pública da médica Ludhmila Hajjar pelas redes bolsonaristas. A queda do pior ministro da Saúde da história deste país, general Eduardo Pazuello, se deu a profundo contragosto do presidente da República e sob intensa pressão do centrão. Apesar do fisiologismo desse grupo político, os ventos da opinião pública também contam muito para eles. Afinal, para manter seu exército que sempre domina o Parlamento e constitui poderosa moeda de troca com o governo da vez, é preciso vencer eleições. Por isso são frequentemente vistos como um moderador importante dos governos dos quais são base.

Divagação concluída, voltemos: Pazuello caiu a pedido do grupo comandado por Arthur Lira, e esse mesmo grupo apoiou a nomeação de Ludhmila Hajjar como sucessora. Contudo, a médica não passou na prova de fogo do bolsonarismo. Defensora do isolamento social e crítica ferrenha do “tratamento precoce” — que não existe —, a doutora não cumpria os requisitos para ser parte de um governo negacionista. Além disso, o gabinete do ódio publicou trecho de uma live com a ex-presidente Dilma, que fora sua paciente, e divulgou até áudios falsos e o quarto do hotel em que Hajjar estava hospedada. Dada a rapidez com que a rede bolsonarista atacou a reputação da médica, levantou-se a forte suspeita de que o ataque fora coordenado pelo Planalto antes mesmo de sua reunião com o presidente. Hajjar, obviamente, recusou o cargo no dia seguinte.

O cardiologista Marcelo Queiroga foi o escolhido para substituir Pazuello no Ministério da Saúde. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Arthur Lira e sua tropa de choque interpretaram a sequência como uma afronta direta de Bolsonaro: no meu governo, mando eu. Acontece que, ao se aliar ao centrão, o governo deixou de ser somente de Bolsonaro.

A resposta veio com a frase que iniciou este texto, e recado mais claro que esse, só se Lira utilizasse a palavra “impeachment”. A mensagem agora é: no seu governo, mando eu. É um xeque — a jogada de xadrez — , um aviso de que se o Executivo não andar na linha, não ficar esperto, o peão do Legislativo dá xeque-mate e derruba o rei.

No entanto, entre as investidas contra a médica e o xeque de Lira, dois eventos abalaram ainda mais as relações entre o Parlamento e o governo, dessa vez com o foco no Senado. No dia 18 de março, o senador Major Olímpio faleceu em decorrência da Covid-19, após 15 dias de internação. O senador, que fora eleito fazendo campanha junto a Bolsonaro, havia rompido com o presidente já em 2019, após trocas de farpas envolvendo os herdeiros do trono. Durante a pandemia, Olímpio tornou-se crítico ferrenho do governo.

Foto: Luis Macedo/ Câmara dos Deputados

Apesar de conservador de direita e defensor de muitas pautas do Palácio do Planalto, Major Olímpio era querido por seus colegas, inclusive da esquerda, com os quais participava de encontros e debates. O senador era visto pela maioria do Senado como um democrata. A notícia de sua morte, dias antes do país ultrapassar a marca de 300 mil mortos por Covid-19, comoveu a classe política e gerou uma reação de incômodo sobre a presidência, sobretudo após o longo silêncio de Bolsonaro, que sequer uma nota emitiu em homenagem a seu antigo aliado.

O outro evento foi o gesto neonazista — para dar os devidos nomes aos bois — do assessor especial de Assuntos Internacionais da presidência da República, Filipe Martins, em sessão no Senado Federal. Durante discurso do presidente do Senado, Martins fez um gesto similar a um “ok” três vezes seguidas. O gesto, que inicialmente foi interpretado por parlamentares como um “vai tomar no c.”, é uma saudação típica entre supremacistas brancos. Significa “white power” (poder branco).

O gesto faz parte de um conjunto de simbologias que é ressignificada por esses grupos para fins diversos, desde a provocação e identificação de pares até a tentativa de fugir de complicações legais que teriam fazendo gestos amplamente classificados como supremacistas. Essa estratégia é chamada “apito de cachorro”, em referência ao instrumento cujo som não é ouvido por seres humanos, mas sim pelos cães. Nesse conjunto estão também o “sapo Pepe”, a bandeira da Ucrânia, o sinal matemático de diferente (≠) e um copo de leite — esse último já tendo sido utilizado pelo próprio presidente da República.

Em maio de 2020, em sua live semanal, Bolsonaro bebeu um copo de leite puro com seus convidados. Símbolo histórico de movimentos supremacistas e neonazistas, o ato de beber um copo de leite puro já foi introduzido no cinema em cenas marcantes de diversos filmes que abordam a questão racial, como “Corra!” (2017) e “Bastardos Inglórios” (2009). Fotos: Reprodução/YouTube; Reprodução/Corra!; Reprodução/Bastardos Inglórios

A desculpa esfarrapada de que estava “ajeitando a lapela do terno” poderia ser aceita caso se tratasse de qualquer outra figura. Martins é conhecido por ser o mais olavista entre os olavistas do governo, e já promoveu diversas referências a movimentos supremacistas e neonazistas. Sua foto de capa no Twitter possui um verso de um poema utilizado pelo terrorista neozelandês que matou dezenas de pessoas em uma mesquita em 2019; utilizou expressões da ditadura espanhola de Francisco Franco ao cumprimentar Carlos Bolsonaro; e recorreu a lema do grupo neonazista Combat 18 para prestar apoio a Steve Bannon, guru de Donald Trump preso em 2020.

O terrorista neozelandês que assassinou 51 pessoas em Christchurch em 2019 também utilizou o gesto que Filipe Martins fez no Senado. Foto: Getty Images

O gesto de Martins gerou profundo incômodo no Senado, que respondeu acionando a polícia legislativa para investigá-lo e aumentando a pressão sobre o governo pela demissão do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.

E é aí que chegamos à última segunda-feira de março.

Por volta do meio dia, Ernesto Araújo pediu demissão do Ministério das Relações Exteriores. O antidiplomata, que durante dois anos sabotou o histórico de mediação e razoabilidade da diplomacia brasileira, teve a cabeça pedida pelo Congresso com mais intensidade na última semana. Sabendo que seria exonerado, o antiministro se antecipou e pediu sua demissão ao antipresidente Bolsonaro.

Em seu lugar, foi indicado o diplomata Carlos Alberto França, que é bem visto no Itamaraty, porém com pouca experiência se comparado a outros nomes do Ministério. O gesto foi similar ao da queda de Pazuello: em parte um aceno ao centrão, que pediu a cabeça do ministro; em parte um recado de desobediência, já que não acatou as indicações do bloco: os senadores Fernando Collor de Melo (PROS-AL) e Antonio Anastasia (PSD-MG).

Algumas horas depois, foi a vez do ministro da Defesa, o general Fernando de Azevedo e Silva, deixar o cargo, a pedido de Bolsonaro. O desgaste entre o presidente e o militar já se desenrolava desde 2020, quando o ministro se posicionou publicamente contra arroubos golpistas do presidente que sinalizava que o Exército lhe devia fidelidade. Na carta de demissão, Azevedo e Silva afirmou que preservou “as Forças Armadas como instituições de Estado” — não de governo.

Da esquerda para a direita: Antonio Carlos Moretti Bermudez, comandante da Aeronáutica; Ilques Barbosa Junior, comandante da Marinha; Jair Bolsonaro; Fernando Azevedo e Silva; e Edson Pujol, comandante do Exército. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Contudo, a gota d’água para a demissão do general possivelmente foi a ameaça de substituição do general Edson Pujol como comandante do Exército. Pujol se tornou uma pedra no sapato de Bolsonaro após barrar iniciativas do presidente que visavam colocar o Exército a seu serviço — o que vem sendo chamado de “levar a política para os quartéis”, expresão um tanto evasiva, já que foi no comando de Pujol que militares da ativa, como o Eduardo Pazuello, se tornaram ministros de Estado. Mas para o presidente totalitário isso ainda não foi o suficiente.

Pouco depois da queda de Azevedo e Silva, foi a vez de José Levi, então advogado-geral da União, deixar o cargo. Levi era considerado distante do bolsonarismo e também se tornou um calo para o presidente ao impor-lhe uma derrota diante do STF. O presidente propôs recentemente uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra três estados que adotaram toque de recolher como medida preventiva à Covid-19. A ação, porém, não podia ser assinada apenas pelo presidente, e Levi se recusou a assiná-la.

Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Quem assumiu então a Advocacia-Geral da União (AGU) foi o então ministro da Justiça e ex-AGU André Mendonça, um fiel escudeiro de Jair Bolsonaro, que mesmo enquanto ministro seguiu agindo como um advogado inconsequente, perseguindo opositores políticos com base na Lei de Segurança Nacional. Com isso, ficou vago o Ministério da Justiça e Segurança Pública. E esse foi o X da questão.

Até o momento, Ernesto havia caído em nome do centrão e Azevedo e Silva e José Levi em nome de fidelidade ao presidente. A vacância do Ministério da Justiça teria duas possibilidades de indicação: outro fiel bolsonarista — o que determinaria a tendência da dança das cadeiras como uma radicalização do governo — ou um indicado pelo centrão — o que definiria o governo como vencido, já que o Ministério da Justiça costuma ser posto de figuras fiéis ao governo de ocasião.

A primeira opção se concretizou: foi indicado o então secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Gustavo Torres, aliado dos filhos do presidente e cotado para assumir o ministério já em abril de 2020, após a queda de Sérgio Moro.

Ainda houve trocas em mais dois ministérios. Como o então ministro da Casa Civil, general Braga Netto, migrou para a Defesa, a Casa Civil passou para o então secretário de governo, Luiz Eduardo Ramos, e a Secretaria de Governo passou para a deputada federal Flávia Arruda (PL-DF), ligada ao presidente da Câmara Arthur Lira.

Foto: Alan Santos/PR

Sim, é confuso. Foi uma dança das cadeiras generalizada. Mas o importante aqui não é decorar os nomes, mas entender os movimentos. O resultado das 6 trocas foi que Bolsonaro entregou duas posições para o centrão (Relações Exteriores e Secretaria de Governo), realocou três fiéis (Mendonça, Braga Netto e Eduardo Ramos) e eliminou dois infiéis (Azevedo e Silva e José Levi).

Além disso, é preciso mencionar que Bolsonaro manteve o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, cuja cabeça também era pedida pelo centrão. Para completar as jogadas, a coluna de Miriam Leitão n’O Globo revelou que os três comandantes das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) devem ser substituídos.

Tudo isso indica que Bolsonaro promoveu uma jogada dupla: atendeu a uma parte das demandas do centrão, porém ainda se colocando no comando da situação; ao mesmo tempo em que “fez a limpa” no primeiro escalão do governo, retirando aqueles que poderiam eventualmente traí-lo. Contudo, no meio da jogada acabou abrindo uma cisão na ala militar.

Líderes populistas e de viés tirânico como Bolsonaro precisam demonstrar poder o tempo todo, sobretudo quando estão enfraquecidos. E Bolsonaro está — e sabe que está — enfraquecido. Os motivos são diversos: pandemia, crise econômica, queda de aliados no exterior; mas, acima de todas essas questões, a volta do ex-presidente Lula na corrida eleitoral.

Foto: Ricardo Stuckert

Lula é o único entre os prováveis candidatos com possibilidades reais de vencer Bolsonaro, e além disso possui bom trânsito com o centrão — dadas as politicagens e trocas de favores de um passado recente. Ou seja, o centrão, que se tornou a principal base do governo Bolsonaro, já não tem mais motivos para uma fidelidade integral agora que um forte aliado está de volta no páreo.

Com isso, o centrão está cobrando mais, e ameaçando mais, e sugando tudo o que pode do governo — porque pode. E a reação de Bolsonaro, é claro, é demonstrar força e poder — embora não tenha nenhum dos dois em um cenário democrático. O problema é que Bolsonaro não é um camarada democrático.

E a prova disso é que no auge de uma tensão institucional gritante o presidente muda peças do tabuleiro para garantir maior fidelidade e compra briga com as Forças Armadas — as três em uma única tacada. O motivo da briga: falta de apoio a seus discursos golpistas.

Há quem diga que Bolsonaro esteja planejando um golpe nos próximos movimentos. O cenário ainda é nebuloso e se apavorar por isso neste momento não parece uma urgência. Mas descartar a possibilidade também não parece uma boa ideia.

As substituições no comando das Forças Armadas denotam sim que o presidente quer ao seu lado apenas aqueles que não representem qualquer obstáculo aos seus planos golpistas. Contudo, já expliquei em outros textos as novas formas de solapar uma democracia, a exemplo sobretudo da Venezuela chavista, em quem Bolsonaro nitidamente se inspira.

Nesse novo formato, o golpe não vem com tanques do Exército nas ruas e navios da Marinha cercando o país. Ele ocorre com o silêncio das Forças Armadas coniventes enquanto polícias regionais e milícias locais se amotinam e implantam o caos.

No último domingo (28), deputados do alto escalão do bolsonarismo, incluindo um dos filhos do presidente, insuflaram motins das polícias militares contra as ordens de restrição de circulação dos governadores, após a morte trágica de um soldado da PM da Bahia em surto psicótico.

A aposta dos golpistas, portanto, não é o Exército deixando os quartéis em benefício do governo; mas o Exército se aquartelando e permitindo que motins ilegais tomem as praças pelo país.

Amanhã o golpe de 1964 completa 57 anos. É provável que o presidente comemore publicamente. Que fique claro: quem tem cara de cavalo, anda com cavalo, relincha e come capim, torre ou bispo não deve ser.

Como o centrão vai reagir às novas jogadas do presidente? Cenas dos próximos capítulos. Mas ele vai reagir.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

No ano de 2021, tecer previsões sobre a política brasileira é como apostar em um jogo de xadrez no qual disputam dois iniciantes que sequer decoraram todas as regras: tudo pode acontecer. Na política e no xadrez, porém, certas coisas não variam. Uma delas é o instinto constante de ataque e defesa, e a busca ininterrupta de achar uma brecha no jogo do adversário. A política, contudo, não é um tabuleiro de xadrez convencional: ele não é quadrado, mas redondo; peças externas aleatórias podem surgir de repente; e, embora não seja um jogo de cartas, todos os jogadores guardam algumas nas mangas.

A relação entre Bolsonaro e o centrão pode levá-lo com segurança até 31 de dezembro de 2022, dado o histórico do bloco; como pode encerrar seu governo amanhã de manhã (não importa quando você esteja lendo este texto), dado o histórico de rompantes e inconstâncias do presidente. Tudo depende apenas dele. Enquanto Bolsonaro tiver jogo, Lira e Pacheco o oferecem jogadas; mas se o rei cair na berlinda, o xeque-mate não terá aviso prévio.

Portanto, não se pode dizer, de forma alguma, que o centrão rompeu com Bolsonaro — pelo menos ainda não. Se isso acontecer, não restará margem para dúvidas: sobre a cadeira presidencial estará sentado Hamilton Mourão — que, por sinal, não parece tão desinteressado na ideia. Nada garante que isso ocorra; e nada garante que não esteja ocorrendo neste exato minuto.

--

--

João Vitor Castro
Revista Brado

Jornalista, editor-chefe da Revista Brado e autor de “Refluxo” (Pedregulho, 2023).