Na foto: em primeiro plano, o livro "Poesia Rouca", de Dora de Assis, ao fundo, uma planta, como as tantas que enfeitam a varanda de Dora.

A rouquidão de uma poesia que pulsa

uma análise nem um pouco objetiva do livro "Poesia Rouca" de Dora de Assis Dacosta

Ligia Thomaz Vieira Leite
Revista Subjetiva
Published in
2 min readJul 17, 2020

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Na orelha de Poesia Rouca, a autora é descrita como "atriz e estudante de artes virtuais da UERJ", mas eu a conheci como a menina na fila da cantina que falou comigo no primeiro dia de aula. Então, desde já peço perdão, porque esse será um texto muito pouco objetivo sobre a poesia em si. Aos leitores de olhar endurecido pela vida, pela política ou pela pandemia, peço que me desculpem, mas não dá pra falar de Dora sem falar de sentimento e, consequentemente, não dá pra falar de sua poesia trilhando caminhos diferentes deste. Do sentir.

Comecemos, então, pelo começo. Pelo título. Dora intitula a sua, uma poesia rouca. Quem a conhece, com certeza já ouviu as histórias sobre a rouquidão e o cisto. O cisto que a impedia de falar como queria e obrigou todo aquele sentimento a escoar pelas mãos em novas plataformas. Corpo, foto, papel. E a poesia que surge do seu escrever, de rouca não tem nada. Ela pulsa, olha no olho, pega na mão e te arrasta junto pra viver tudo aquilo que é Dora.

Mas o que é isso? Quem é essa Dora com quem a gente vive na leitura de Poesia Rouca?

Essa Dora, como a outra, que na verdade é a mesma, também é artista. Diz que até quando ela acerta, ela erra e é sobre esses erros que se constrói sua poesia. É poesia de machucado, de ausência, de quem sente frio, se entorta, morde a língua, coça, geme, cospe, vomita, espera. É uma poesia ao mesmo tempo deslocada e encontrada em seu lugar de deslocamento. Porque parece o fim do mundo e é, mas ela segue sendo também.

A poesia de Dora é dessas que sai escapulida, desembestada, transbordada, se imprime no livro, mas não contenta e imprime também em quem a lê muito de Dora. E Dora, já não mais a menina da cantina, não mais aquela que, sentada na cama, me mostrava os versinhos que rabiscava na aula, é um dos seres humanos mais incríveis que eu já conheci. Hoje, muito mais mulher do que menina, com uma poesia também muito mais amadurecida, Dora compartilha com o mundo as artes que tem dentro. E nós só podemos agradecer a sorte de ler e poder ser, ainda que por pouco, Dora.

por entre a sombra dos dedos

pode até tentar
se enganar
abrindo a geladeira e rindo
olhando o pé

mas a gente sempre sabe
quando perde alguém

Esse texto pode ser lido como parte do desafio #LeiaComASubjetiva e você pode comprar o livro da Dora clicando aqui!

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