Superpopulação: como o número de filhos por casal resolverá o problema

Andre Mazzetto
Revista Subjetiva
Published in
6 min readJun 29, 2017

--

Dois filhos: o número mágico

No primeiro texto desta série, tratamos de forma superficial dos principais motivos pelos quais a população mundial não aumentará de forma exponencial no futuro. Está na hora de aprofundar a análise dos temas, e o primeiro será um dos mais importantes: o número de filhos por casal.

Normalmente as pessoas pensam que há dois motivos que influenciam o número de filhos: condição financeira e religião. Me acompanhe pelas estatísticas mundiais e vamos ver se juntos conseguimos enxergar um padrão.

Condição financeira

Temos um certo pré-conceito de que pobres tem muitos filhos e ricos tem menos filhos. É a velha piada da televisão, o maior contraceptivo já inventado. Será que isso é mesmo verdade? Os dados mostrados aqui são confiáveis, de recenseamentos oficias…não são aquelas estatísticas duvidosas. Cada cor representa um local, separados como Américas , África, Europa e Ásia/Oceania. Antes de falar em grana, dê uma olhada na média geral de filhos por casal:

Figura 1 — O número de crianças por casal vem caindo e chegará a 2 (na média) para o mundo todo (dados: Gapminder)

Aí você já pode concluir: estamos vendo a influência do dinheiro! A África, o continente mais “pobre”, é onde se encontra o maior número de filhos por casal, enquanto a Europa, o continente mais “rico”, é onde encontramos o menor número. Precisamos ver em mais detalhes. No gráfico abaixo o esquema das cores continua o mesmo, mas agora separado por país. O tamanho da bolha representa o número de habitantes. Eu destaquei alguns países para que eles sirvam de referência. A forma mais fácil de interpretar este gráfico é: quanto mais pra baixo e pra direita, menos filhos e mais grana. Quanto mais pra cima e pra esquerda, mais filhos e menos grana.

Figura 2 — Filhos por casal x renda per capita: os “pobres” tem mais filhos (dados: Gapminder).

É possível ver que a maioria dos países estão abaixo da linha de 3 filhos por casal. Desde de 2010, 80% da população mundial está vivendo em países que tem 2 ou menos filhos por mulher. No entanto, os países mais pobres (mais pra esquerda) tem mais filhos por casal. A conclusão que este gráfico nos passa é: países com muitos filhos por casal tem baixa renda.

Religião

Falar sobre religião é complicado, especialmente sobre a ligação entre religião e sexualidade. Algumas religiões incentivam as mulheres a terem mais filhos, e as pessoas acham que isso é uma das pincipais causas da superpopulação. Para ver se há alguma diferença, aqui vai o mesmo Gráfico da Figura 2, só que as cores agora representam as religiões. É difícil separar todas as religiões do mundo e suas variações, por isso as cores foram simplificadas para representar a religião que representa mais de 51% da população do país.

Figura 3 — Filhos por casal x renda per capita: a religião não tem influência (dados: Gapminder)

Você pode até se surpreender, mas não há diferença entre as religiões. Países com religiões orientais tem menos de 3 filhos por mulher, mas é possível ver que tanto países islâmicos ou cristãos estão espalhados de maneira meio igual pelo espectro de renda e número de filhos. A religião tem muito pouco a ver com número de crianças. Todas as religiões podem manter seus valores e se adaptarem a um novo mundo.

Mortalidade Infantil

Um número alto de filhos por casal não significa necessariamente um aumento na população. O problema é que a taxa de mortalidade infantil nestes países é muito alta. Dos 6 ou 7 filhos, 4 a 5 morrem na infância. Aqui vão os dados da mortalidade infantil em relação à renda per capita dos países.

Figura 4 — Taxa de mortalidade infantil vs renda per capita: mais mortes nos mais “pobres” (dados: Gapminder)

Novamente, a renda é importante nesta relação. Países “ricos” tem poucos filhos por casal e uma taxa de mortalidade infantil baixa, enquanto os “pobres” tem muitos filhos mas, em compensação, a taxa de mortalidade é alta. Será que só a renda controla a população?

Os fatores que realmente importam

Aqui vai um exemplo contrastante: dois países islâmicos (que teoricamente é a religião que incentiva vários filhos), com uma grande diferença de renda e população: Bangladesh e Catar. O gráfico parte da data da independência destes países e vai até 2015.

Figura 5 — Bangladesh vs Catar: redução apesar da diferença na renda (dados: Gapminder)

Apesar das diferença em renda, ambos hoje apresentam um número baixo (cerca de 2) filhos por casal. Os fatores que realmente influenciam a taxa de natalidade são:

Maior idade ao casar

Mais educação (métodos contraceptivos e saneamento básico)

Mais mulheres trabalhando

Planejamento familiar

Mesmo um país “pobre” como Bangladesh pode mostrar uma redução no número de filhos por casal quando estes fatores são aplicados. Aliado a isso estão também a melhoria no saneamento básico, que previne as mortes na infância, fazendo com que o casal tenha menos filhos. O planejamento familiar é necessário em países que são muito pobres.

O grande preenchimento

Como vimos lá na Figura 1, o mundo está rumando para um número fixo (2) de filhos por casal. Se o número de crianças não vai crescer, como a população ainda aumentará de 7 para 11 bilhões? Aqui é necessário um ponto de vista diferente, pensando no que acontecerá com as futuras gerações. Está pronto?

Os dados citados aqui são números arredondados, só pra facilitar as contas (lembre-se, eu sou biólogo…). Na Figura abaixo, cada bonequinho representa 1 bilhão de pessoas. Hoje há no mundo cerca de 2 bilhões de crianças (entre 1 e 15 anos), 2 bilhões de jovens (entre 16 e 30 anos), 1 bilhão de adultos (entre 31 e 45 anos), 1 bilhão de idosos (entre 46 a 60 anos) e 1 bilhão de mais idosos ainda (mais de 61 anos).

Figura 6 — O grande preenchimento: como sairemos de 7 para 11 bilhões com um número fixo de filhos por casal (dados: Gapminder).

Como você sabe, o tempo é cruel. Na próxima geração aquela última faixa de 1 bilhão de pessoas com mais de 61 anos morrerá, sendo substituídos pelos 1 bilhão de idosos que tinham de 46 a 60 anos. Os 2 bilhões de jovens (16 a 30 anos) terão 2 filhos por casal, ou seja, 2 bilhões de crianças de 1 a 15 anos (Figura 6). Na próxima geração acontecerá o mesmo. Você já deve ter percebido onde isso vai parar. O “grande preenchimento” é inevitável.

Além disso, a expectativa de vida aumentará, ou seja, a faixa “acima de 61 anos” se tornará “entre 61 e 75 anos” e ainda teremos uma nova faixa: “acima de 76 anos”, com 1 bilhão de pessoas (Figura 6). Seguindo este padrão serão adicionados 4 bilhões de pessoas no mundo. A partir deste momento a população mundial se estabilizará, a não ser que ocorra um aumento ainda maior na expectativa de vida.

A grande história aqui é que os ricos ou pobres, socialistas ou capitalistas, muçulmanos ou católicos, com ou sem políticas governamentais rígidas de controle de natalidade, a maioria dos países conta a mesma história de uma revolução reprodutiva que já está acontecendo.

Fique ligado porque no próximo texto serão abordados dois temas importantes: onde estas pessoas vão viver? Será que vai ter dinheiro suficiente pra todo mundo?

Gostou desse texto? Clique no❤ e deixe seu comentário!

Não deixe de nos seguir nas redes sociais: Facebook | Instagram | Twitter.

Entre no nosso grupo fechado para autores e leitores.

Conheça o nosso podcast oficial, o Subversivo Podcast!

Quer escrever conosco? Confira o nosso Edital!

--

--

Andre Mazzetto
Revista Subjetiva

Biólogo, um cientista que não é movido a café. Entusiasta da Ciência e da Educação. Editor e autor do blog Ciência Descomplicada.