NOTA

É DE BOM TOM?

A comicidade dos memes traduzem pensamentos e críticas de uma população ao contexto social a que está submetida; na pandemia de COVID-19, isso não foi diferente.

Revista Torta
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Por Arthur Almeida e Eduarda Motta

Editado por João Vitor Custódio

Em março de 2021, a Revista Torta publicou uma matéria que discute o potencial dos memes como uma ferramenta de auxílio da prática jornalística. || Arte: Reprodução/Autor Desconhecido

Haja vista as diversas formas de comunicação que vêm sendo estabelecidas na internet e, principalmente, nas redes sociais, as frases e figuras em suas formas virais ganham destaque. Conhecidos popularmente como “memes”, essas peças passam por um processo de produção e compartilhamento crítico e satírico, ganhando, assim, novos sentidos dentro do ambiente virtual (em especial, entre os jovens).

Em “Memes e Narrativas em tempos de pandemia da Covid-19: um estudo analítico”, Handherson Damasceno, Doutorando em Educação, define que um meme parte de uma referência textual ou imagética que retoma o fato original e adiciona novos elementos, a fim de criar significados distintos a depender do contexto inserido.

Nesse sentido, para algo ser considerado um meme, esse objeto deve, obrigatoriamente, replicar algo já conhecido pelo público, isto é, ter uma bagagem cultural — além de ser um conteúdo viral.

No ciberespaço, as histórias podem ser (re)contadas utilizando um godê multifacetado de gêneros e formas. Para além do cômico, a cultura memética pode, também, reeditar novas existências e impulsionar visões sobre a realidade.

“Embora o meme apresente uma certa superficialidade das informações, por ser um gênero dinâmico, ele amplifica a velocidade dessas mesmas informações e pode, neste sentido, promover aprendizagens”, pontua Damasceno sobre a reprodutibilidade desse formato digital.

Desde o início da pandemia de COVID-19, o compartilhamento de informações na internet voltou a ser alvo de discussão: quão rápido as notícias chegam?; o quanto precisamos nos aprofundar nos fatos?; e por qual viés as notícias estão sendo disseminadas?

Quando se trata do compartilhamento de memes, por mais que seu intuito principal, na maioria das vezes, seja de apenas entreter, podemos reconhecer alguns desses questionamentos explícitos nas peças.

Para Damasceno, o uso dos memes não desconsidera a gravidade das situações, tampouco esses se configuram como um texto superficial. Com elementos textuais e gráficos simples, eles abordam um assunto de maneira cômica e enviesada, deixando margem para que o internauta reflita criticamente sobre o fato.

Márcio Antônio Gatti é Doutor em Linguística e, analisando alguns memes que ficaram populares durante 2020, destacou, no artigo “Memes e o recorte cômico da pandemia de COVID-19”, uma releitura da imagem do soldado que ‘protege’ o cidadão, que dorme.

Na imagem, Bolsonaro é ilustrado como o militar; o Brasil a criança dormindo; e o Coronavírus as armas (bombas e facas) atiradas em direção à figura que está deitada na cama. || Arte: Reprodução/Autor Desconhecido

Nesse caso, Bolsonaro é caracterizado pela farda militar na posição de braços abertos, que faz menção a um crucifixo. Na forma original do meme, o soldado protegeria a criança da ameaça, mas, nesta versão, ele foi colocado do lado oposto, de forma a enfatizar a ineficácia do presidente diante da atual crise sanitária.

Se nos aprofundarmos em uma interpretação ainda mais crítica, podemos interpretar que as instituições satirizadas desempenham um papel que se aproxima mais da crença do que de uma ação prática.

Memes de viés ideológico equivalente — no caso do exemplo, opositores do Governo Bolsonaro — circulam pelas mesmas bolhas sociais, reafirmando sua forma de pensamento. Desse modo, é possível inferir que o compartilhamento de memes contribui para a formação crítica dos jovens, pois é mais uma entre tantas outras maneiras de gerar conteúdo na Web 2.0.

Apesar desse ser apenas um exemplo, ele ilustra bem a dinâmica dos memes no seu processo de divulgação e replicação pelos espaços virtuais. O público em geral é constantemente submetido a estímulos informacionais, além de gozar da liberdade de ser também um potencial criador, desenvolvendo e compartilhando suas próprias opiniões com terceiros.

Por deter essas características — rapidez, simplicidade e viralidade — as narrativas meméticas demonstram ser ferramentas com grande potencial. Isso tanto no que diz respeito à formação ideológica das pessoas quanto no processo de disseminação das informações por meio da sátira; não à toa, os memes continuam sendo renovados a cada dia, adaptando-se às novas linguagens.

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