7 Crônicas #03 — Apenas um desenhista

Renato Nascimento
Sete Crônicas
Published in
3 min readSep 17, 2017

A ingenuidade do ser humano é subestimada. Nós vivemos os nossos dias tão ocupados e atarefados que não nos damos conta do que realmente acontece a nossa volta, que há algo muito errado com todas essas notícias horríveis na televisão, com todo esse medo, de não saber bem quem seu vizinho possa ser, se vai chegar e sair todas as vezes que levanta pela manhã ao ir para o trabalho, e a ironia de que para se sentirem cada vez mais seguros em seus lares estão na verdade atrás de grades, e cada veis mais sozinhos. A globalização e a internet deixam as pessoas mais conectadas e cada vez mais afastadas, e os dias passam cada vez mais rápidos, silenciosos e sorrateiros, as pessoas nem percebem.
Eu desenhei hoje uma linda jovem, seu nome é Alisson Corrigan, ela mora no exterior, em Londres na luxuosa Inglaterra, e mandei um dos nossos melhores homens para busca-la, Keenan Wadder, o número quatro, esse trabalho é muito importante e essa moça também. Mas eu sou apenas um mero desenhista, nada mais, não comando nada e meu poder aqui dentro dessa igreja é tão banal quanto a ingenuidade que eu superestimo.

Meus desenhos não são meus de verdade, as pessoas que neles aparecem, as pessoas que deles saem existem de fato, eu estou em uma igreja agora, afastado do mundo e de todos para não perder minha inspiração que deve vir de algum lugar sagrado que a mim não foi confiado. E enquanto isso eu passo meus dias a pensar em como seria bom não saber de nada, em viver meus dias atarefados e com medo como todas as pessoas do resto do mundo. Em ser apenas mais um, não um escolhido, apenas mais um.
Fico me perguntando como a pobre garota irá reagir depois de descobrir que seu mundinho perfeito não existe como ela imaginava que era, que está sendo travada uma batalha constante entre as forças do bem e do mal, como em meu primeiro desenho a quase vinte e nove anos atrás, onde pontilhei dois velhos barbados, gêmeos, jogando xadrez, um com vestes brancas e o outro com vestes negras. Se a igreja não soubesse do que se tratava, se eu não tivesse sido trago, era bem provável que seria ainda como as pessoas ingenuas que tanto invejo.

Será um choque para ela saber que existem mais criaturas na Terra do que imaginamos, que o inferno somos nós, que estamos perto do fim e que somos meras peças em um jogo que está além da nossa compreensão. Preso em minhas memórias nem me apercebi de um desenho que estava terminando. Quem diria, sou eu nele. Será um alerta para cessar com as queixas ou um aviso de que Deus está comigo? Mas no fim das contas eu sou apenas um desenhista que sabe de algumas coisas, coisas que muitos nem sonham que existam, coisas que destruiriam os mundos de pessoas comuns, coisas que me fazem perceber em como a ingenuidade é uma benção para os mais afortunados.

Gostaram? Deem palminhas!

Esse é o terceiro conto de uma série de contos sobre 7 grupos de 7 personagens cada e a descoberta de seus dons sobrenaturais, em meio a uma luta invisível travada entre a Ordem e o Caos.

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A batalha entre a Ordem e o Caos está apenas começando.

Contos anteriores:

I - Sonhar é sua sina.

II - Dia da caça.

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