2015: O ano dos m-payments

A ascensão do M-Commerce (Parte 2)

Recentemente —11 de setembro de 2015— o Google pegou todos de surpresa com o anúncio de que o Android Pay estava sendo lançado nos Estados Unidos. Muitos imaginavam essa chegada somente com o lançamento oficial dos novos dispositivos Nexus, mas, ciente do crescimento dos pagamentos mobile a empresa de Mountain View não parece disposta a esperar tanto.

Nos últimos meses várias soluções vem surgindo nessa área. No ano passado tivemos o Apple Pay em outubro e o Snapcash em novembro. Nesse ano, além do Android Pay, foram anunciados em março o Samsung Pay e uma nova funcionalidade do Facebook Messenger, que permite o envio de dinheiro para qualquer contato da sua lista de amigos. Podemos dizer que até agora, 2015 foi dos pagamentos mobile.

O volume em transações feitas através de dispositivos mobile cresceu de U$352,2 bilhões em 2014 para U$431,1 bilhões em 2015 e as previsões são de que esse número dobre nos próximos dois anos. — Statista

No Quênia, por exemplo, os pagamentos mobile já deixaram de ser somente uma tendência e hoje fazem parte do dia-a-dia e da cultura local. Lançado em 2007, o M-PESA já é utilizado por 59% da população adulta queniana, movimentando mais de 2,1 bilhões de dólares mensalmente, o equivalente a 66% das transações feitas no país. Com o M-PESA os usuários podem fazer de tudo pelo celular: realizar as compras do mês, pagar as contas de casa, comprar passagens de avião, etc, tudo isso sem nem ao menos precisar de uma conta bancária ou de um endereço fixo. O sucesso é tão grande que a empresa já expandiu seus serviços para mais de 10 países, incluindo Índia, África do Sul e Egito.

Usuário enviando dinheiro através do M-PESA. Um dos diferencias do serviço é que ele funciona até mesmo em feature phones.

Parte disso vem do enorme conhecimento sobre o mercado e os usuários. Criado pela Safaricom, a operadora de telefonia líder no mercado queniano, o serviço é incrivelmente mais barato do que a concorrência. Outro diferencial é que para utilizar o M-PESA os usuários não precisam ter uma conta bancária nem apresentar comprovante de residência, dois artigos de luxo em um país dividido por conflitos étnicos e guerras civis. Além disso, durante o conflito pós-eleições em 2008 muitos quenianos viram o serviço como uma forma mais segura de enviar dinheiro para seus parentes e amigos refugiados no distrito de Nairobi, já que na época — dependendo de sua etnia — não se podia confiar nos bancos, e muito menos carregar grandes quantias de dinheiro na rua.

Tendo estabelecido uma base de usuários iniciais, o M-PESA acabou se beneficiando de sua rede: quanto mais as pessoas utilizavam o serviço, mais fazia sentido para os outros se inscreverem também.

O que isso significa?

A série de anúncios na área sugere que a indústria pode estar vivendo um momento crucial. Mas, ser bem sucedido com pagamentos mobile não é uma tarefa fácil. O Google falhou uma vez e agora tenta se reinventar, a AT&T assumiu a derrota, e até mesmo a Apple caminha a passos curtos.

Apesar disso, a recompensa é generosa para aqueles que são bem sucedidos, como são os casos do Starbucks, M-PESA e PayPal. Qual é o segredo dessas empresas? Como adaptar as estratégias de pagamento para acompanhar o mundo mobile?

Segurança

Uma das maiores preocupações quando se fala em pagamentos é em relação à segurança, ainda mais quando se trata de dispositivos mobile. Segundo uma pesquisa recente feita pela Tripwire, metade das pessoas considera que a forma mais segura para realizar uma compra em uma loja física é com dinheiro, seguida pelo cartão de crédito com 29%. Em último lugar aparece o pagamento mobile, com uma porcentagem praticamente irrelevante. Ou seja, se você quer que seu cliente pague com o celular, antes de mais nada é preciso garantir para ele que aquela transação é a mais segura possível.

Com o lançamento do iOS 8 e dos iPhones 6, a Apple apresentou ao mundo o Apple Pay, que combina a tecnologia NFC com o Touch ID para garantir a segurança dos pagamentos. Para os que ainda não conhecem a funcionalidade, o Touch ID utiliza o leitor de impressões digitais do iPhone para fazer a autenticação do usuário, o que pode ser utilizado para diversas tarefas, desde desbloquear o celular até confirmar suas compras. Ao mesmo tempo que traz mais velocidade e facilidade para o usuário, que não precisa mais lembrar e digitar senhas complexas, a funcionalidade também traz mais segurança, já que depende da impressão digital.

Processo de compra de produtos e aplicativos utilizando o Touch ID da Apple.

Iniciativas de toda a indústria, tais como o Touch ID e o uso de , têm potencial para aumentar significativamente o nível de segurança e, posteriormente, a percepção do público em geral sobre pagamentos, principalmente em dispositivos móveis.

Facilidade

Uma tendência na área de pagamentos são as transações (P2P). O avanço da tecnologia e o surgimento de plataformas mais confiáveis e transparentes tornou as transações entre indivíduos mais fáceis e baratas do que nunca. Hoje vemos consumidores cada vez mais dispostos a poder receber e enviar dinheiro para outras pessoas sem o envolvimento direto de um banco. Com isso fica muito mais fácil vender aquele abajur que você não usa mais, ou cobrar aquele almoço do seu colega de trabalho.

Segundo uma estimativa feita pelo Business Insider Intelligence, as transações P2P feitas pelo celular alcançarão 86 bilhões de dólares até 2018, isso só nos Estados Unidos.

Mas se engana quem pensa que isso significa o fim do varejo. Qualquer comunidade precisa de regras, gestão e de um lugar para se encontrar. Então por que não criar um ambiente confiável que facilite essas transações?

Recentemente, o Facebook anunciou que será possível fazer transações P2P dentro do Messenger, vinculando seu cartão de crédito ao aplicativo. Dentro de um chat com um amigo o usuário verá um novo botão sobre o teclado, que acionará a interface de pagamentos. Nela, basta digitar a quantia que será enviada e confirmar. Como forma de segurança o usuário poderá cadastrar uma senha de confirmação por código ou impressão digital, utilizando o Touch ID por exemplo. Essa adição ao Messenger veio meses após a divulgação do Snapcash, uma solução praticamente idêntica anunciada pelo Snapchat. A diferença é que nesse caso a segurança é feita pelo já conhecido serviço de pagamentos digitais Square, e não pela equipe do aplicativo.

Nova funcionalidade do Facebook Messenger, que permite transações P2P.

Nesses casos a facilidade é o maior atrativo das soluções. Por que ir até o banco e enfrentar filas quilométricas para depositar o dinheiro que você deve àquele amigo distante se você puder fazer isso pelo chat do Messenger, ou pelo Snapchat?

Fidelidade

Um estudo feito pela Nielsen revelou que uma das chaves para converter os usuários aos métodos de pagamento por dispositivos móveis são os programas de fidelidade. 69% dos consumidores estariam dispostos a realizar uma compra dessa maneira em troca de algum desconto, ou se houvesse algum programa de recompensas atrelado à compra.

Quem entendeu isso foi o Starbucks. A rede de cafeterias afirma que 10% das vendas em lojas americanas são feitas através de smartphones, o equivalente a quatro milhões de transações por semana. Graças a seus aplicativos para iOS e Android, a rede se tornou uma das maiores do mundo em pagamentos mobile.

Telas do aplicativo da Starbucks para iOS. Com ele os usuários podem realizar pagamentos na loja e conseguir brindes e descontos exclusivos.

Os dois aplicativos funcionam de maneira bem simples, com eles os usuários podem adicionar créditos em seus cartões de fidelidade e pagar por suas compras escaneando o código de barras gerado na boca do caixa. Além disso, é possível também agendar recargas automáticas para quando os créditos estiverem muito baixos, acessar descontos exclusivos e receber brindes como músicas, e-books e até mesmo outros apps (geralmente pagos, mas fornecidos de graça para clientes do Starbucks).

Em 2015 ficou claro que, ao menos no cenário internacional, a compra por dispositivos móveis não é a próxima, mas sim a atual onda do . É claro que ainda existem barreiras a serem quebradas — como a questão da segurança e praticidade — para que esse meio de pagamento se torne a regra, e não a exceção. A fim de realmente influenciar a mudança de comportamento do consumidor é preciso pensar em uma experiência consistente, segura, simples e recompensadora.

Quem já está nesse caminho — oferecendo soluções de pagamento mobile — terá a faca e o queijo na mão quando essa realidade chegar ao Brasil e se tornar parte do dia-a-dia dos brasileiros. E se você ainda não é um desses, saiba que o futuro bate à porta.

--

--