(Imagem do Twitter; não consegui estabelecer a fonte original)

De onde menos se espera… [Rumo a 2022, n. 40]

Abril de 2022: a campanha sai para as ruas e os jornalões dão palco para as arruaças de Bolsonaro.

Gustavo Laet Gomes
Tem que manter isso, viu?
6 min readMay 1, 2022

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Esta é a 40ª edição da série Rumo a 2022 (conheça o nosso método). A campanha foi pra rua e Bolsonaro segue pautando os jornalões. Não há mais dúvida de que único ponto do “programa de governo” de Bolsonaro para reeleição é um golpe de Estado. A diferença entre ele e Lula caiu, mas isso reflete principalmente uma acomodação dos eleitores à direita com a saída de Moro e a derrocada da “3ª via”.

Gráficos

Faltando 6 meses para as eleições…

… e os Jornalões estão a dez dias (desde pelo 21 de abril) falando todos os dias sobre um brucutu imbecil, cujo nome nós, assim como o Luiz Fux, há pouco mais de um ano atrás, sequer deveríamos lembrar. E com isso, claro, concede um palanque especial para Jair Bolsonaro e seu discurso golpista, que volta com toda a força e assim será até janeiro do ano que vem. Isso mesmo: janeiro, porque mesmo que ele perca em outubro ou novembro, vivenciaremos o fim de ano mais tenso dos últimos 40 anos.

Não quero entrar novamente no ciclo das especulações acerca da capacidade de Bolsonaro de ser bem-sucedido numa tentativa de golpe. A princípio creio que será difícil. Entretanto, notícias como esta: “Governo Biden recebe dossiê de acadêmicos com alerta de ‘versão mais extrema de ataque ao Capitólio’ no Brasil”, que efetivamente provocou uma reação do governo Biden no sentido de reafirmar a confiança no processo eleitoral brasileiro, em particular nas urnas eletrônicas, indica que, de fato, o presidente e seu círculo mais próximo efetivamente planejam uma tentativa de golpe nos mesmos moldes (lembrando que Eduardo Bolsonaro participou do planejamento do golpe nos EUA).

O que mais tem me incomodado nesses dias nem é o discurso em si, mas a cobertura jornalística dele. De duas uma, ou os jornalões não aprenderam nada nos últimos 6 anos (desde a eleição de Donald Trump), ou eles estão cinicamente tentando fomentar de novo o antipetismo. O cínico aqui é que eles sabem muito bem que a escolha não é nada difícil e, na verdade, a dificuldade está em justificar que, no fim das contas, eles até gostam de um fascismozinho. Porque não é possível que eles não compreendam que não há nada a se noticiar no caso do brucutu — ao menos não por 10 dias seguidos. O fato jornalístico em si — a afronta de Bolsonaro ao STF com a publicação de um decreto de “graça” — embora tenha surpreendido inicialmente pela “audácia”, surpreende muito mais por descobrirmos que, no fim das contas, Bolsonaro tinha o brucutu como alguém mais próximo do que se imaginava do que pela atitude em si: circulou a notícia de que o decreto já estava escrito há muito tempo, mas sem o nome do beneficiado, e que fora preparado para nomes como Flávio, Carlos ou Eduardo. Se tivéssemos tido a felicidade de ver um desses facínoras condenados pelo STF, absolutamente ninguém se surpreenderia com a emissão de um decreto de “graça” para livrá-los. Afinal, é só nisso que Bolsonaro pensa: em livrar a si e a seus três filhos prediletos da cadeia. E é por isso que ele precisa se reeleger a qualquer custo.

Também foi dito — e é verdade — que este imbróglio específico em torno do decreto não tem potencial de atrair novos eleitores para Bolsonaro. Sua função específica é principalmente manter radicalizada tanto a parcela disposta a pegar em armas durante o golpe quanto os covardes que não pegarão em armas, mas têm a função de aplaudir o golpe. Entretanto, o efeito colateral da hiperexposição na mídia é dar mote para a circulação da propaganda bolsonarista nos meios preferenciais — os grupos de WhatsApp — e, mais importante ainda, a cortina de fumaça sobre a deterioração econômica do país, esta sim que deveria ser a principal pauta, repetida a exaustão e histericamente pelos jornalões se tivesse algum comprometimento com a decência e a democracia (nessa ordem). É indecente o uso que Bolsonaro faz do instituto da “graça”? Óbvio que sim, mas o assassinato de centenas de milhares de pessoas durante a pandemia, o extermínio de povos indígenas, a devastação do meio ambiente e a conversão de milhões de brasileiros em indigentes miseráveis são muito piores.

Mas chega de falar desse verme. É preciso explicar também por que reduzi a nota de Lula e aumentei a de Bolsonaro. Em primeiro lugar, isso visa refletir o que estamos vendo nas pesquisas, que indicam uma redução da diferença entre os dois. A redução da diferença obviamente aumenta as chances de Bolsonaro se reeleger e, como consequência diminui as de Lula. Não faria sentido aproximar Bolsonaro de um 10 de Lula, por exemplo, porque, na prática, o que isso faz é aumentar a indefinição do resultado, ou seja, afastar Lula da posição em que a sua vitória é certa.

Isso posto, a redução não implica que Lula esteja sofrendo uma sangria de eleitores. Ele segue variando dentro da margem de erro, embora tenha sofrido sim uma leve queda em relação aos momentos de maior pico. Isso pode ter relação com vários fatores que vão desde uma ou outra declaração que não caiu bem em ouvidos conservadores (no varejo) quanto, dentro da esquerda, pessoas torcendo o nariz para Geraldo Alckmin. Entretanto, o fato de esses fatores não gerarem uma queda expressiva e de derivada acentuada, indica que eles estão sendo acomodados com relativa facilidade.

Já no lado de Bolsonaro, sua subida se explica por dois fatores principais: (1) a saída de Sergio Moro e (2) a constatação da inviabilidade da chamada “3ª Via”, em particular o fato de os jornalões, sempre eles, terem jogado a toalha. Isso está fazendo com que número de indecisos caia rapidamente e de forma inédita a uma distância tão grande do pleito. Fica claro que a maior parte desses indecisos era composta de eleitores que votaram em Bolsonaro em 2018 e que, por alguma razão, preferiam não repetir o voto em 2022, mas que, diante da inviabilidade de uma alternativa à direita, estão se posicionando novamente com o fascismo. Trata-se de uma franja do antipetismo que tentava se descolar de Bolsonaro. Tudo indica que Bolsonaro já está no seu teto (dentro da margem de erro), dado que sua rejeição está em torno de 60%.

Um efeito interessante desta polarização é que, embora a disputa tenha de fato se acirrado, ainda não se pode descartar uma vitória de Lula no 1º turno. O principal fator neste caso seria a capacidade de mobilizar os eleitores antibolsonaristas ao voto útil em Lula no 1º turno, justamente por conta das ameaças de golpe. Para isso bastaria converter uma parcela dos eleitores que hoje declaram voto em Ciro Gomes e o restante dos indecisos que não irão para Bolsonaro.

Não há muito o que falar sobre os demais candidatos. No campo da esquerda, Lula já conseguiu o apoio oficial de todos os partidos fora o PDT. Ciro já está isolado como em 2018, mas muito mais cedo do que o isolamento de então, que só se consumou definitivamente por volta do final de julho. A candidatura não é viável e não tem para onde crescer. Os acenos em direção ao União Brasil não surtiram (e não tinham como surtir) efeito e o União Brasil, aliás, que chegou a lançar “oficialmente” Luciano Bivar como pré-candidato neste mês, já acena de volta para Bolsonaro. Já ficou claro que Ciro não tem como atrair eleitores bolsonaristas, lavajatistas e antipetistas, nem muito menos tomar votos de Lula. E os indecisos não decidirão por um candidato que obviamente irá perder.

Neste sentido, a candidatura de Simone Tebet até poderia, potencialmente, fazer mais sentido para uma parcela do eleitorado que quer evitar Bolsonaro ao menos no 1º turno apenas para dizer que não teve como evitar votar nele no 2º turno contra Lula (os eleitores do Amoêdo em 2018). O fato, contudo, de ela ser do MDB torna tudo muito difícil, pois este também é o eleitorado da antipolítica, que tem aversão ao MDB. De todo modo, João Doria, que também já não tem mais dúvida de que sua candidatura é inviável, já admite ser vice de Tebet e deve desistir em breve. Eduardo Leite também já jogou a toalha este mês e agora está falando em trair o seu vice e sair candidato ao governo do Rio Grande do Sul, num movimento sem precedentes em que o governador renuncia para ficar um ano de férias e tentar ser governador de novo. Isso devia ser proibido e certamente vai inviabilizar sua candidatura.

Sobre André Janones, o único fato relevante é que, perguntado pelo Roberto D’Ávila sobre quem era o presidente da Argentina, ele respondeu que era … “o Macron… da França”.

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