Ilustração: Agatha Catunda

Quem é você?

Perguntas difíceis e o que aprendi com meu pai sobre ser.

Pela Metade
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3 min readAug 7, 2018

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Meu pai nunca teve um emprego "bonito" — desses que você consegue quando tem um diploma (Hahahaha). Eu nunca disse para meus coleguinhas de escola: meu pai é advogado, empresário, médico, ah…ele é servidor público. Na verdade, por um bom tempo, eu não sabia o que meu pai “era”. Porque ser, na minha ingênua concepção, era com o que a gente trabalhava.

Quando surgia o assunto, eu respondia: ah, meu pai faz de tudo. Sem vergonha, mas cheia de questionamentos. E fazia mesmo. Mas como definir o que meu pai era?

Houve uma época em que a gente só se via algumas vezes durante o mês inteiro: meu pai era caminhoneiro e trabalhava viajando. Meu pai foi funcionário de uma empresa de telefonia e ficava muito tempo fora também: instalava linhas telefônicas por todo interior do estado. Meu pai já foi o menino de recados, o cara que vai no banco pagar as contas e aquela pessoa que você liga quando precisa de ajuda. Meu pai já trabalhou em um supermercado e em uma fábrica de café. Meu pai já foi motorista, emprestou dinheiro e durante a infância e adolescência ajudava minha avó, junto com os irmãos, vendendo cavaco e banana real — “Olha aê, a banana reaaaaal!” — de porta em porta (as melhores histórias que ele conta são dessa época).

Cara…meu pai já foi uma porção de coisas, coisas que eu talvez nem saiba também. Meu pai nunca frequentou uma universidade, nunca foi um calouro, nem tem um diploma, mas antes mesmo de concluir o ensino médio ele já "era" um monte de coisa. Provavelmente ele não imaginou que seria tudo isso. Provavelmente ele não escolheu ser nem metade (e isso é escolher também). Ele não tem um papel timbrado pendurado na parede que ateste suas competências em direito, administração ou economia. E nem precisa. Quem ele é vai além da educação acadêmica e das suas competências profissionais. O que ele fez para ganhar dinheiro e se manter foi só uma parte de quem ele era e vem sendo.

E eu aprendi que ser caminhoneiro, cartomante, designer, diarista, médico ou _________(insira qualquer outra profissão aqui), não é o suficiente para nos definir. O que você faz, em termos de profissão, não define quem você é — principalmente se você escolheu a sua baseada em status, dinheiro ou pressão familiar. O que nós somos vai além disso.

São e serão as nossas ações, que podem tender para uma direção hoje e seguir outra, completamente diferente, amanhã, que irão fazer de nós quem somos. E, te digo uma coisa, estamos em uma contínua construção de nós mesmos. Impossível se definir. Eu, pelo menos, continuo com dificuldade.

P.s.: Achei difícil escolher o que colocar na minha biografia do Medium.

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