Ovelha perigosas

Caio Tendolini
Instituto Update
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3 min readNov 14, 2014

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Um olhar sobre a apatia

Tradução do texto "Ovejas peligrosas" de @Pia Mancini

Primeiro vem a apatia. O mesmo de sempre: ninguém se importa, ninguém vota, ninguém se mete. Escutamos isso mil vezes em tempos de abundância, votam com o bolso. O sistema se sente cômodo com esse arranjo: se ninguém se envolve, nada muda. Mas quando o sistema político está em problemas e precisa que seus eleitores — afastados por anos de más práticas e impunidade — voltem ao rebanho, surge o monstro dos grandes riscos ligados à apatia: os extremos. Se as pessoas não votam, quem ganha são os extremistas que estão mobilizados. Em vez de ovelhas, nos tornamos ovelhas à serviço dos fanáticos de plantão.

O artigo da Economist deste mês "Angry Voters" (eleitores raivosos) ressalta essa estratégia e nos leva ao nível de ovelhas raivosas e perigosas. O sistema entra em alerta máximo. Os eleitores, agora raivosos, votaram nos extremos: a democracia está em risco!

Em vez de identificar o que não funciona num sistema que gera apatia, raiva e desinteresse, vemos que se potencializa a cultura do medo aos autoritarismos extremistas e à "anti-política"(direita ou esquerda dá no mesmo, como sempre), e mais uma vez guiamos as ovelhas ao conforto dos partidos tradicionais — eles que supostamente prezam por nossos interesses. O sistema reage por instinto, evita a mudança, supera o baque com um pouco de maquiagem, e se restabelece.

O que precisamos fazer é olhar para o sistema: por que ele gera apatia e raiva?

Os custos para participar são muito altos: tornar-se militante partidário é opção para um setor muito restrito. Para o resto de nós, resta ir as urnas a cada 2 anos e não opinar sobre o assunto entre uma eleição e outra. Podemos escolher os representantes, mas não podemos opinar sobre as políticas públicas. E cuidado com querer se meter nisso, colocando uma mesinha na rua para coletar assinaturas ou mobilizando na internet — esse ambiente pouco seguro.

A linguagem do sistema é feita — e defendida — de advogados para advogados — que por sua vez dizem que "a tecnologia exclui". Agora façamos o seguinte teste, leia o parágrafo abaixo (no juridiquês) e diga o que entendeu:

Os indivíduos ou instituições responsáveis pelos dano causados à um bem que se declare ou considere declarado PCCABA em virtude dos termos do artigo 9º, inciso a) da Lei Nº 1227 e as criadas pela Lei 449 até quando se crie um regime de penalidades para tal código, sem prejuízo das faltas que possam ser-lhe impostas, deverá proceder à reparação dos danos causados ou a reconstrução dos bens afetados.

Super acessível, certo? Sem mencionar quão inclusivo é precisar juntar coletivos e articular politicamente para conseguir ter acesso a trâmites legais.

O que de fato precisamos é de lideranças e partidos que sejam capazes de guiar a sociedade no processo de adaptação a um mundo que se transforma rapidamente a partir das possibilidades de uma nova tecnologia da informação. Líderes que inovem no sistema político, capazes de imaginar e projetar espaços onde os cidadãos possam ter participação que gere impacto no sistema e melhorem a qualidade das políticas públicas.

Você nunca vai conseguir mudar as coisas lutando contra o que existe. Para mudar algo, construa um novo modelo que torne o antigo obsoleto.

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Caio Tendolini
Instituto Update

Amante de projetos colaborativos que geram impacto positivo na sociedade. @update-politics