Storytelling profissional: como a técnica virou o jogo na minha busca de um novo emprego em UX Design

Mari Müller
VagasUX
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10 min readApr 13, 2022

A habilidade de saber “vender o próprio peixe” em entrevistas pode ser decisivo para a carreira de qualquer profissional. Saber falar sobre si e contar sua trajetória profissional é uma ferramenta poderosa e, se bem empregada, pode diferenciar você de outros profissionais com a mesma experiência profissional (ou até maior). Neste artigo, eu falo sobre como foi minha evolução nas entrevistas que participei e como usei o storytelling para contar sobre a minha trajetória profissional. Ao longo do texto, além de dicas, descrevo como a técnica foi essencial para que eu conseguisse avançar em diversos processos seletivos até conseguir o “sim” na empresa que refletia meus objetivos de carreira.

Mesa branca com uma caneca branca, uma régua, um bloco de notas aberto com um lápis e um clips em cima. Ao fundo a pate do teclado de um notebook.
Fonte: @olidale via Unsplash

Alguns pontos importantes antes de continuar:

  • Esse texto é uma parte complementar de outro artigo, onde conto sobre 19 entrevistas que fiz em um mês e dou diversas dicas de como se preparar. Leia mais aqui.
  • Existe um vasto conteúdo na internet sobre o conceito de storytelling, além de artigos de empresas e profissionais de recursos humanos falando sobre storytelling profissional. Se quiser se aprofundar mais sobre o assunto, vou deixar alguns links e referências no final do artigo. 🙂
  • O foco aqui é contar a minha história, da minha perspectiva e ponto de vista como UX Designer, para que sirva de ajuda e inspiração para quem está um pouco perdido(a) e desiludido(a) com tantas entrevistas que não avançam.

Esclarecido tudo, vamos ao que importa, o texto!

Antes de mais nada, como cheguei aqui

Conforme o teaser (prévia) que dei no artigo anterior que escrevi aqui no Medium, depois de dois meses atuando como Designer de Produto na startup de eficiência energética (e de ter visitado várias cervejarias a trabalho 🍺), vi uma mensagem em um dos grupos de UX que participo sobre uma vaga para UX/UI Designer que me chamou a atenção. A vaga era para atuar remotamente em uma startup, estilo software house, de Porto Alegre. A empresa era a mesma que um amigo trabalhava. Ele falava tão bem que atraiu meu interesse, mas na época ele me disse que só aceitavam pessoas com mais de dois anos de experiência. E para essa vaga que eu vi, não foi diferente.

A primeira coisa que pensei foi se valeria a pena aplicar para a vaga, até porque eu estava atuando somente a nove meses como UX/UI Designer. Por outro lado, sou uma profissional com mais de dez anos no mercado de trabalho. Já passei pelas áreas de vendas, marketing e design gráfico, além de ser formada em Publicidade e Propaganda. Não era exatamente uma profissional “crua”, inexperiente. Minhas vivências anteriores de relacionamento com pessoas, pesquisas e design visual, são, inclusive, algumas habilidades para se atuar como UX/UI Designer. Até então, eu não tinha muita noção de como o storytelling profissional bem contado poderia me ajudar nas entrevistas, no entanto, a essa altura eu tinha feito tantas que já tinha decorado de trás para a frente meu discurso.

Aqui eu deixo um agradecimento as pessoas recrutadoras que me deram feedbacks (retornos) construtivos maravilhosos. Foram detalhes simples que fizeram toda a diferença. Um exemplo: seguir uma ordem cronológica, ir de trás para frente ou de frente para trás, conforme fala sobre as experiências de trabalho, gerando uma narrativa coesa.

Construindo um discurso assertivo

Conforme os retornos que eu recebia das pessoas recrutadoras, ia lapidando minha fala a cada nova entrevista. Nesse momento, depois de considerar todos os fatores a favor e contra, resolvi aplicar para a vaga da software house, mesmo não tendo a experiência requerida. Como era uma indicação pelo grupo da comunidade de UX, mandei mensagem para a pessoa que repassou para a empresa meu interesse. Logo me chamaram para a primeira entrevista. Se me lembro bem, foram três ao total: uma de fit (adequação) cultural, com o RH (Recursos Humanos); uma com o RH e a Líder de Design e uma última com alguns designers do time, em um foco mais técnico.

Passei nas três entrevistas, e ainda, como Designer Pleno IV! A empresa usa uma classificação de quatro níveis a cada degrau de experiência (Júnior I, II, III e IV; Pleno I, II, III e IV; assim por diante). Eu falei tão bem que consegui passar em todos os crivos da empresa. E detalhe, falando sobre a minha trajetória incluindo o que aprendi e desafios que enfrentei nas empresas anteriores.

Aqui vale uma ressalva. Muito dessa evolução foi pelo meu perfil e projetos que passei. Lembre-se que a jornada profissional é única para cada pessoa. O que aconteceu comigo pode ser diferente para você. O fato é que: é possível chegar lá, você só precisa ter objetivos claros de onde quer chegar e se mexer. Estudar muito (e continuamente), além de colaborar com os times onde estiver atuando, conversar com todo mundo. Perguntar como funciona. “Botar a cara no sol, mana!”

A seguir, vou mostrar como escrevi o roteiro da minha trajetória. Passo a passo. Você só vai precisar adaptar para seu universo. Você pode ter um modelo padrão e ir adaptando a cada vaga. Pode alterar caso mudem as habilidades e requisitos, para que a história fique mais convincente, valorizando suas características de acordo com o que a empresa busca na contratação.

Passo 1: lista de habilidades

Liste as habilidades das vagas que estiver de olho e comece a observar os padrões. O que mais pedem? Se você já tiver em mente um foco (mais UX ou mais UI) leve isso em consideração.

Se tiver uma empresa favorita, busque se informar sobre a cultura dela. Vá além da descrição da vaga, pesquise na internet. Vasculhe mídias sociais, Glassdoor, chame pessoas que trabalham na empresa pelo Linkedin e pergunte como é trabalhar lá. Isso vai te ajudar não só a escrever um roteiro mais convincente, mas também a descobrir se é nesse lugar mesmo que quer trabalhar. Se, por exemplo, algum funcionário disser para você que a empresa tem prazos apertados para fazer as entregas e você for uma pessoa que não gosta de trabalhar sobre pressão, não vai fazer sentido para você, certo?

Passo 2: lista de experiências profissionais

Liste as empresas que trabalhou, que ano foi, o intervalo de tempo que atuou em cada uma, as principais funções desempenhou, o que aprendeu lá e, por fim, se teve algum desafio relevante que tenha superado ou alguma conquista que teve contribuído e como fez isso.

Passo 3: projeto "modelo"

Escolha um projeto do qual tenha você tenha orgulho, pelo motivo que seja. Pode ser algo que tenha te exigido muito profissionalmente e você aprendeu diversas coisas, ou algum projeto difícil que você teve que usar várias habilidades suas para resolver e entregar, e por aí vai. Descreva como foi esse projeto com começo, meio e fim e qual foi o resultado.

Passo 4: análise de compatibilidade

Faça uma comparação das habilidades profissionais do passo 1 com suas experiências dos passos 2 e 3 e veja o que há em comum. Em todas as experiências que achar uma compatibilidade, você vai incluir a experiência na sua história. O resto você não precisa usar, já que não vai ter relevância. Pensa que você vai ter de 5 a 15 minutos para falar sobre sua trajetória profissional. Então, sua história precisa encaixar nessa “janela” de tempo.

Passo 5: escrita do discurso

Tendo em mãos todas as informações, você vai fazer um esboço do roteiro, contando sobre como cada experiência que você teve foi relevante para atuar em UX/UI até você chegar aonde está hoje, usando o formato de storytelling na sua escrita. Uma analogia interessante é o pitch de vendas. Você deve escrever pensando na audiênia (as pessoas recrutadoras) e no que deseja como objetivo final (ser aprovado na entrevista).

Na prática:

A título de exemplificação, segue abaixo um modelo de roteiro, baseado na minha experiência, que usei em algumas entrevistas no meu início de carreira em UX.

Comecei a minha carreira na área de vendas, em 2009. Naquela época, aprendi a me conectar com as pessoas, ler suas expressões e desenvolver empatia. No primeiro ano, fiquei no ranking como a 19ª melhor colocada em vendas no ano, dentre mais de 50 colegas. No segundo ano, recebi o prêmio da 3ª melhor colocação. Nesse período, desenvolvi sensos de disciplina e ambição, além de perceber que me cercar de pessoas mais experientes poderia fazer eu crescer mais rápido.

Depois de trabalhar com diferentes empregos na área de vendas, em 2012, ingressei na faculdade de publicidade e propaganda. Atuei em projetos que me ajudaram a evoluir habilidades como comunicação em equipe, estratégia, branding, planejamento, escrita e pesquisa. Durante a execução de alguns trabalhos, assumi a liderança, planejando as atividades e ajudando o time a entregar o melhor resultado. Duas equipes as quais eu fiz parte, inclusive, ganharam projetos para clientes reais (promovidos gratuitamente pela universidade).

De 2013 a 2019, atuei como designer visual para uma empresa de mídia exterior e, paralelamente, fiz trabalhos freelancer de design gráfico. Na empresa, comecei como estagiária, evoluindo rapidamente ao mesmo tempo em que desenvolvia minhas habilidades de design. Nesse período, fui capaz de ajudar a empresa a reduzir a burocracia em processos relacionados a criação de materiais de comunicação diversos. Como resultado, contribuí para a empresa receber diversos prêmios de reconhecimento do mercado publicitário.

Todas essas experiências serviram de base para que eu mergulhasse na área de UX. Em 2019, pedi demissão do meu trabalho como Designer Visual para iniciar minha transição de carreira. Durante um ano, estudei e conversei com diversos profissionais atuantes na área. Paralelamente, atuei como ilustradora freelancer. Além de desenhos à mão, criei ilustrações para capas de livros e revistas digitais. Nesse período, ingressei como artista parceira da Dobra, criando ilustrações para seus produtos.

Em 2020, ingressei no meu primeiro emprego como UX/UI Designer. Trabalhei em uma startup do tipo fábrica de software. Exerci projetos de ponta a ponta, de pesquisas a entregas para times de desenvolvimento. Nesse período, estabeleci relações com pessoas de outras áreas, como desenvolvedores, gestores de projeto e de produto. Fui a única designer nos projetos que atuei, requisito para que eu tivesse uma evolução rápida (e intensa). Ao longo do caminho, fui entendendo como os processos funcionavam e como eu poderia adaptar as diversas metodologias de design a realidade de cada projeto. Esses fatores foram me dando mais confiança para atuar como UX/UI Designer.

Caso as pessoas recrutadoras peçam para você contar o projeto que mais se destacou, que mais se orgulhou, etc. Tenha a mão esse discurso também (o que está descrito no passo 3). Abaixo, segue um roteiro meu de exemplo.

O projeto que mais me orgulha é o "Gestão de Terceiros". O cliente do projeto é um dos maiores fabricantes de calçados do Brasil, presente em mais de 80 países e empregando mais de 10.000 pessoas. O projeto se baseava em uma plataforma de gerenciamento de documentos para o setor de recursos humanos. O departamento é responsável por gerenciar documentos provenientes de empresas terceirizadas. O gerenciamento era inteiramente manual, através de planilhas e impressos enviados pelo correio.

Depois que definimos a estratégia do produto, foi acordado que o primeiro entregável seria um MVP (mínimo produto viável), o qual teríamos que desenvolver em três fases. No entanto, o cliente havia entendido que entregaríamos todo MVP em uma única vez (no que seria o prazo da primeira entrega). Uma falha de comunicação entre a equipe de vendas e cliente causou a revisão de todo planejamento, sendo que o projeto já estava em andamento.

Foi um enorme desafio lidar com a adaptação das metodologias de design nesta primeira entrega, de forma que atendêssemos aos curtos prazos acordados com o cliente. A equipe toda precisou lidar com as consequências desse novo planejamento, pela supressão de etapas de design, como testes de usabilidade e prototipação em alta fidelidade. Surgiram diversas lacunas acerca do desmembramento de interfaces, o que sobrecarregou o time de tecnologia, que precisou incluir processos de validação junto à fase de desenvolvimento. Como aprendizado, toda a equipe do projeto passou a enxergar mais valor nas etapas de design como um meio eficiente na validação prévia de hipóteses, reduzindo tempo e custos de desenvolvimento.

O que ganhei usando storytelling no meu discurso das entrevistas

O exemplo do storytelling profissional que escrevi acima foi o que me guiou depois de atuar no meu primeiro emprego como UX/UI Designer. Conforme as entrevistas foram acontecendo, falar sobre a minha trajetória passou a ser cada vez mais natural e tranquila. Automaticamente, eu ia adaptando o discurso e aplicando as dicas que as pessoas recrutadoras iam me falando.

Vejam como uma negativa de entrevista não é, necessariamente, algo ruim. Peça para pessoa entrevistadora falar o porquê não escolheu você e peça conselhos de melhoria. Nem todos serão solícitos, mas, ao menos os que responderem, ajudarão você a ser mais assertivo na sua próxima entrevista.

Então, o que rolou no fim das contas?

Em dois meses e meio atuando na startup que falei lá no início, a software house, eu pude ter o gostinho de como é trabalhar em um lugar com processos e colegas de design com mais maturidade. Foi muito bom ver as coisas funcionando em harmonia e constante evolução. Evolução essa que eu tive a felicidade de contribuir no tempo em que estive na empresa.

Nesse meio tempo, surgiu outra oportunidade que estava mais alinhada ao que eu havia definido como objetivo de carreira. Minha pretensão era atuar em um lugar onde me possibilitasse o aprendizado constante e que fornecesse um planejamento e crescimento de carreira estruturado e claro, além de benefícios trabalhistas (que todo bom brasileiro gosta 🤑).

Foi assim que ingressei, em outubro de 2021, na Accenture. Empresa que oferece tudo o que buscava (e muito mais). E adivinhem, meu discurso foi tão decisivo e meu amadurecimento tão efetivo que entrei para atuar como Designer de Produto Sênior. Sim, minha gente! Nem acreditei, mas foi isso mesmo. Em exatamente um ano (outubro de 2020 a outubro de 2021) e depois de atuar em três empresas diferentes (e cinco projetos, diga-se de passagem), fui considerada uma Designer Sênior por uma consultoria global com mais de 670 mil funcionários e atuante em mais de 120 países.

O storytelling aplicado ao meu discurso profissional ajudou no meu processo de autoconhecimento e a estar onde queria estar desde o começo.

Agora os desafios são outros, mas isso é assunto para um próximo texto!

Chegou até aqui? Meu muito obrigada!

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Beijos de luz e até a próxima!

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Mari Müller
VagasUX

UXR Specialist/ UX Strategist at Accenture. Master in UX Design Strategic Management https://www.linkedin.com/in/mari-muller/