OS 25 MELHORES ÁLBUNS DE 2015 — VIL METAL

Igor Natusch
VIL METAL
Published in
21 min readDec 29, 2015

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Que assim seja, pessoal! Pelo segundo ano consecutivo, trazemos a nossa lista com aqueles que consideramos os 25 álbuns de Heavy Metal mais relevantes do ano que já quase ficou para trás. Para começo de papo, algumas brevíssimas considerações:

  1. A lista abaixo foi elaborada por Igor Natusch — jornalista, escritor, músico, obcecado por Heavy Metal e atual apresentador e responsável pela seleção musical do programa de rádio VIL METAL, que vai ao ar semanalmente pela Rádio Estação Web. Trata-se, portanto, do reflexo único e exclusivo das minhas opiniões, obviamente imperfeita (afinal, não é humanamente possível ouvir de forma atenta todos os lançamentos de um ano inteiro), tendenciosa (uma vez que tenho meu gosto pessoal e, queira eu ou não, ele condiciona até certo ponto meu gostar ou não gostar de um determinado CD), limitada (são apenas 25 discos, no fim das contas) e sem nenhuma intenção de liquidar o assunto;
  2. Com certeza está faltando muita coisa nessa lista. Não estarão aqui os novos CDs de Iron Maiden, Saxon, Amorphis, Motörhead (obrigado por tudo, Lemmy), Nile, Nightwish, Marduk e muitas outras bandas. Isso, até certo ponto, se deve ao fato de que tento determinar os álbuns que considero os mais importantes, os mais significativos de 2015 — e embora isso obviamente tenha muito (ou quase tudo) a ver com qualidade pura e simples, não se resume apenas nisso. Embora “The Book of Souls” seja um álbum de grande qualidade, até que ponto ele ditará tendências daqui para frente, até que ponto ele representa ou aponta o auge ou a renascença de seu estilo, da cena onde surge ou do próprio Iron Maiden? Até que ponto os novos álbuns de bandas como, digamos, Slayer e Blind Guardian vão mudar os rumos atuais do Thrash, do Power Metal ou do Heavy Metal como um todo? Esses caras já fizeram isso: agora são novos artistas (ou nem tanto) que estão deixando sua melhor marca, apontando novos caminhos, ajudando o Metal a ganhar novas dinâmicas e ter uma vida longa e saudável. E é isso que, nessa humilde lista, tentaremos apontar;
  3. A lista é em formato de ranking (ou seja, os primeiros colocados são de fato os que considero os melhores discos do ano etc), mas não leve essa escala tão a sério. Eu mesmo tenho dúvidas sobre minhas próprias decisões em 2014 (coloquei o Pallbearer em segundo lugar, por ex, quando hoje eu realmente acho que “Foundations of Burden” foi o melhor disco daquele ano), então sinta-se o mais livre possível para discordar da posição final ou mesmo de algumas (ou todas as) inclusões. Encare essa lista como uma coleção de sugestões e elogios a bandas que eu acredito terem feito um trabalho diferenciado em 2015, não como uma conclusão científica e monolítica sobre o que foi lançado no ano em questão — coisa que esse post definitivamente não é.

Ao fim da lista, farei uma breve leitura sobre o que foi o ano de 2015 para o Heavy Metal, tentando também apontar algumas tendências para o que vem daqui para frente. Se você quiser dar uma olhadinha no que a gente achou de 2014, é só clicar aqui e ser feliz.

Estamos conversados? Muito bem, então. Coloquem um bom som para tocar, porque lá vamos nós!

25 — ALPHA TIGER — iDentity (Steamhammer)

Não é de hoje que esses alemães vêm se equilibrando na tênue linha que une o power metal ao que chamamos hoje de heavy tradicional — mas em “iDentity”, seu terceiro CD, eles caminham sobre o fio dessa navalha com invejável confiança. Flertando às vezes até com hard rock, mas sem jamais perder a força e o peso, “iDentity” traz uma história semi-conceitual sobre manter sua individualidade em um mundo padronizante e empolga com composições ao mesmo tempo pesadas e grudentas, que fãs do estilo vão demorar para esquecer. Não que o Alpha Tiger seja imensamente original no momento, mas o quinteto compõe como poucos e já adquiriu uma personalidade bem respeitável — que, se for bem explorada, os levará ao topo em pouco tempo. Muito recomendável.

24 — ANTIGAMA — The Insolent (Selfmadegod Records)

Esses poloneses não são novatos na cena grindcore — estão na ativa desde 2000, e esse “The Insolent” é seu sétimo álbum completo. Mas, em um momento no qual o sub-gênero parece estar em novo fôlego criativo, o quarteto surge com um trabalho que desafia o gênero em diferentes dimensões. Ainda que sempre brutal e técnico, o Antigama sempre traz elementos intrigantes a seu som, de modo que não apenas todas as músicas são únicas e distinguíveis, mas o próprio álbum vai ficando mais viajante e quase progressivo (de uma forma doentia, claro) próximo do final. “The Insolent” é o que de mais excitante surgiu no grind desde o fim prematuro do Gridlink — e esse é um tremendo elogio, acreditem. Ouça e estoure a cabeça.

23 — PARADISE LOST — The Plague Within (Century Media)

OK, esses ingleses não são nada novatos, como qualquer fã de doom metal ficará feliz (ou talvez não muito, sabem como é) em confirmar. Sendo esse “The Plague Within” o 14º CD de sua discografia, tampouco é de se esperar que tenham reinventado a roda. Mas a verdade é que é o disco certo, na hora exata: ele resgata (de forma brilhante, diga-se) e expande as raízes death / doom da banda, em um momento onde esse terreno volta a ser um dos mais promissores do metal atual. Há muita variedade, segurança e conhecimento de causa em “The Plague Within” — que encerra uma fase na qual o Paradise Lost não sabia se queria ser uma banda de rock gótico ou não e o recoloca entre os gigantes do som extremo. Bem-vindos de volta, caras.

22 — MORGOTH — Ungod (Century Media)

O ouvinte mais cínico pode perfeitamente dizer “ah, mais uma banda do segundo escalão Death dos anos 1990 resolveu voltar à ativa para ganhar uns trocados”, soltar um bocejo e descartar esse CD sem uma ouvida sequer. Mas acredite, amigo(a): isso seria um erro tremendo. Porque “Ungod” não apenas é um sensacional retorno, como é facilmente o melhor disco que o Morgoth já gravou e um dos melhores discos Death dos últimos anos. A pegada old school não é um mero truque para atrair fãs: aliada a certos refinamentos e à experiência que os anos trazem, ela faz desse CD uma aula de como ir além do saudosismo picareta e ser genuinamente atemporal. “Ungod” é um disco de 2015, e um dos melhores — se você curte Death Metal, ouça agora mesmo.

21 — KYLESA — Exhausting Fire (Season of Mist)

Esse excelente trio dos EUA há tempos vem mesclando de forma saborosa metal, sludge e muitas sonoridades psicodélico-progressivas — mas é justo dizer que em “Exhausting Fire” eles levaram a brincadeira a um novo patamar. A faixa de abertura, “Crusher”, é uma das melhores músicas de 2015 e resume de forma brilhante a pegada da banda: ao mesmo tempo ríspida e atmosférica, pesada e quase suave, um riff impiedoso fazendo a base para uma viagem que é puro sonho. Jogar com contrastes (inclusive nas vozes de Phillip Cope e Laura Pleasants) e ainda assim manter a coesão: esse tem sido o jogo do Kylesa há 15 anos, e em “Exhausting Fire” está o mais bem acabado exemplar de uma discografia que já era brilhante há tempos. Vá atrás imediatamente.

20 — HIGH ON FIRE — Luminiferous (Entertainment One)

Para alguns, esse é o melhor álbum da carreira do guitarrista Matt Pike — uma afirmação ousada, se lembrarmos que ele tocou no legendário Sleep e mantém ativo esse High On Fire desde 1998. Eu realmente não iria tão longe, mas não há dúvida que “Luminiferous” é um álbum acima da média, que consolida a banda no topo do cenário stoner / doom. Longe de apenas empilhar riffs lentos e saturados, o High On Fire não raro cai numa velocidade fora do comum, além de letras cheias de teorias conspiratórias e uma pegada sem frescuras, quase uma mescla de Saint Vitus com Celtic Frost. Mais direto do que nunca, “Luminiferous” é um must para fãs de som pesado e orgânico, e algo de que Matt Pike certamente poderá se orgulhar por muito tempo.

19 — GHOST BATH — Moonlover (Northern Silence Productions)

É claro que o grande sucesso de público e crítica do Deafheaven iria motivar muitas experiências aproximando o Black Metal de sonoridades shoegaze, math rock e afins. O Ghost Bath (que fingiu ser da China por um tempo antes de admitir que é dos EUA) encaixa bem na descrição, mas seria errado tomá-los como meros clones. A busca por atmosfera é incansável, numa sonoridade lo-fi que realça o aspecto assustador das composições — e que ao mesmo tempo carrega uma certa beleza, soando quase tocante em inúmeros momentos. Ao fundo, quase como um detalhe da mixagem, a voz grita com um desespero realmente impressionante. “Moonlover” é um passo à frente no chamado post-Black Metal, e o Ghost Bath coloca-se entre os líderes dessa corrente com um álbum belo, enigmático e convincente.

18 — STEELWING — Reset, Reboot, Redeem (NoiseArt Records)

O cenário retrô tem sido quase um plano de carreira para muitas bandas atuais. Sem forçar muito a barra, ficam repetindo riffs e temáticas old school para alegria de um público fiel e que paga bom dinheiro. Nesse cenário onde novidade é quase palavrão, o Steelwing é extraordinário por trazer em seu som um frescor muito acima da concorrência. Embora seu metal seja 100% tradicional, os suecos empolgam graças a um enorme capricho nas composições, sempre muito dinâmicas e com desdobramentos inesperados. A temática pós-apocalíptica surpreende pela maturidade, com boas letras que realmente provocam reflexão. Longe de jogar na bola de segurança, o Steelwing desafia limites o tempo todo — e é esse o segredo de um dos álbuns de metal tradicional mais empolgantes em muito tempo. Duvida? Ouça.

17 — SWALLOW THE SUN — Songs From the North I, II and III (Century Media)

Houve quem dissesse que o álbum, enquanto conceito artístico e comercial, estava morto. Lembram disso? O que dizer, então, quando um dos nomes mais significativos do cenário Death/Doom atual lança um CD triplo e a brincadeira é bancada por uma das maiores gravadoras da atualidade? Cada um dos três CDs procura evocar um sentimento distinto: “Gloom” é bastante melódico e sombrio, “Beauty” é mais suave e cheio de elementos acústicos e “Despair” revela-se mórbido e pesadíssimo, além de ter as músicas mais longas do pacote. É uma viagem que pode ser desgastante (são mais de 2h30 de música, no fim das contas), mas o Swallow the Sun sem dúvida alcançou algo notável em “Songs From the North”. Reserve algumas horas de dedicação exclusiva a esse trabalho, pois ele definitivamente merece.

16 — SCYTHIAN — Hubris in Excelsis (Hells Headbangers Records)

A fronteira entre death, thrash e black metal era bem imprecisa nos anos 1980, antes da especialização que deu aos sub-gêneros seus contornos finais — e é nessa lama primordial que o Scythian vai buscar sua força e inspiração. Mas não tome a dupla inglesa por um mero exercício saudosista: de fato, o Scythian volta ao começo não para repetir, mas para criar uma nova trilha. “Hubris in Excelsis” é poderoso, com uma temática guerreira (as influências de Bathory são inegáveis) que vai além das letras e ganha corpo em um instrumental ao mesmo tempo direto e sofisticado. O resultado é brutal, impiedoso e, acima de tudo, bombástico. Um CD memorável, de uma banda que cita seus heróis sem copiá-los e que ainda vai dar muito o que falar.

15 — PERIPHERY — Juggernaut (Alpha and Omega) (Sumerian Records)

Para muitos, qualquer coisa que remeta (mesmo que suavemente) a gêneros como djent e nu metal não merece menção enquanto manifestação metálica. Azar deles, pois deixam de curtir o ótimo som de gente como o Periphery. Mesclando prog metal com djent e várias citações ao assim chamado math rock, esses norte-americanos há tempos fazem por merecer atenção — e esse álbum semi-conceitual em duas partes é com certeza uma das melhores novidades do cenário nos últimos tempos, mesmo que lembre pouco Dream Theater e afins. Ao mesmo tempo pesado e delicado, cheio de dinamismo e rispidez, “Juggernaut” é um trabalho cheio de nuances, perfeito para quem gosta de desafios. E o metal progressivo é sobre desafiar a si mesmo, não é? Experimente.

14 — SHAPE OF DESPAIR — Monotony Fields (Season of Mist)

Em termos de retornos triunfais, o Shape of Despair não quis deixar muito espaço para contestação. Depois de mais de uma década de relativo silêncio, os finlandeses lançaram um CD destinado a virar referência no Funeral Doom Metal. Enchendo sua música de atmosferas, o grupo cumpre a promessa que traz no próprio nome, dando forma a paisagens ao mesmo tempo angustiantes e de grande beleza e nostalgia. A repetição, aqui, é estratégia: reiterando riffs soturnos em um andamento sempre lento e marcial, o sexteto cria ambiências que mergulham o ouvinte numa dimensão paralela. Embora fortes em si mesmas, as oito faixas de “Monotony Fields” formam uma unidade da qual não há escapatória. Para quem não teme as profundezas da alma humana, Shape of Despair é uma banda para saborear.

13 — IRREVERSIBLE MECHANISM — Infinite Fields (Blood Music)

Quem diria que viria da pouco cotada Belarus uma das estreias mais bombásticas do Death Metal atual? Em “Infinite Fields”, o Irreversible Mechanism faz uso de elementos que, em si mesmos, não são estranhos ao som extremo: a técnica apurada, os elementos sinfônicos, o constante contraste via sintetizadores. Mas a dupla responsável pelo CD triunfa onde muitos fracassam: a multitude de elementos é sempre coesa, a precisão musical nunca soa masturbatória, os teclados são fundamentais para gerar um clima de pesadelo cibernético e os elementos de música clássica, longe de mero enfeite ou complemento, estão irmanados com as composições, fundamentais em cada riff e virada de bateria. O Irreversible Mechanism traz muitas promessas em “Infinite Fields”, mas a qualidade e relevância de sua música já são uma realidade que o metal extremo não tem direito de ignorar. Vá atrás sem medo.

12 — TORCHE — Restarter (Relapse)

Mesclar som extremo com sonoridades flertando com indie rock nunca será o modo mais seguro para fazer amigos e influenciar pessoas no metal. Pois os caras do Torche não apenas fazem isso como têm a pachorra de batizar o próprio som como “thunder pop”… Você pode até detestar o som, mas não dá para condená-los por falta de ousadia! “Restarter” é o quarto álbum em meio a uma montanha de EPs e singles, e o primeiro a sair pela poderosa Relapse — e os caras aproveitaram a chance, lançando músicas que têm tudo para estourar. Há muito sludge/stoner no som do Torche, mas também muito rock alternativo — tudo longe de soar sisudo ou melancólico, já que o CD tem uma aura leve e bem humorada. Quem se leva a sério demais vai ter enjoos com “Restarter”; os demais terão a chance de curtir um dos CDs mais divertidos de 2015.

11 — MOONSPELL — Extinct (Napalm)

Muitos elementos são bastante importantes na hora de gravar um grande álbum, mas é óbvio que nenhum CD para de pé sem algumas boas composições. Nesse sentido, seria impossível ignorar esse trabalho do Moonspell, o 11º de sua discografia, já que estão nele várias das melhores músicas metálicas de 2015. Ainda que, no caso, os portugueses tenham aliviado um pouco o peso da coisa toda, fazendo um álbum mais próximo do gótico do que do metálico, o fato é que o Moonspell entendeu o espírito dos tempos que vivemos e materializou isso em um punhado de músicas que revitalizam sua própria carreira e o nicho onde se encaixam, que há tempos não gerava um disco tão bom. “Medusalem”, “Funeral Bloom”, “Breathe (Until We Are No More)”, “Extinct”… Memoráveis, todas elas. E convenhamos que isso sempre merece ser celebrado.

10 — SATAN — Atom By Atom (Listenable Records)

Dentro do crescente nicho das bandas oitentistas voltando à ativa, poucos trouxeram música de tanta qualidade quanto o Satan. Obscuros (mas jamais esquecidos) heróis da NWOBHM, voltaram com um excelente “Life Sentence” (2013) e agora trazem “Atom By Atom”, que se bobear é ainda melhor. Mesmo sendo old school, a música desses ingleses é do tipo que nunca envelhece, uma vez que traz em si tudo que se espera do metal: peso, energia, trabalho intenso de guitarras (os duelos de Steve Ramsey e Russ Tippins são de outro mundo), voz marcante (Brian Ross conhece seu ofício), letras obscuras, composições dinâmicas… Tudo está em “Atom By Atom”. Mas — e aí está o truque — jamais soa chato ou maçante, ao contrário: o Satan de 2015 é cativante, cheio de relevância musical. Pouca gente faz melhor, pode acreditar. Brilhante e indispensável.

09 — BARREN EARTH — On Lonely Towers (Century Media)

Desde o início, a pegada do Barren Earth foi de experimentar dentro do Death/Doom — com dois ex-músicos do Amorphis na formação, não daria para esperar menos, não é mesmo? Nesse sentido, “On Lonely Towers” (seu terceiro CD) é não apenas um álbum extraordinário, mas o triunfo de uma iniciativa musical. Com o novo e excelente vocalista Jón Aldará, as possibilidades dramáticas se expandiram, e o instrumental seguiu a deixa muito bem. É um trabalho ao mesmo tempo denso e dinâmico, onde o sabor progressivo sempre presente no Barren Earth se aprimorou ao extremo, sem sacrificar nada do caráter grandioso-soturno da banda. Muitos os comparam ao Opeth, mas eu acho que são bem diferentes e, hoje em dia, bem melhores. Um álbum majestoso, que coloca o Barren Earth no topo do seu estilo.

08 — ENSLAVED — In Times (Nuclear Blast)

Longe de ser um novato promissor no cenário, o triunfo do Enslaved é de outra natureza: uma banda que já lançou 13 álbuns e nunca deixou de desafiar a si mesma e aos limites do seu sub-gênero preferencial (o black metal) no processo. “In Times” é até meio difícil de descrever: não é surpresa que seja um grande CD, embora o álbum em si seja surpreendente em seus próprios termos. O grupo ainda mantém um pouco do black / viking metal que fez sua fama inicial, mas hoje é mais progressivo do que nunca, com direito a passagens limpas, corais, elementos acústicos, piano… Tudo, por incrível que pareça, muitíssimo natural e sem forçar a barra. O Enslaved não tenta ser moderno: ele é a modernidade do black metal, e tem sido há 25 anos. Que os mais jovens aprendam: enquanto isso, os noruegueses seguem no trono, sem margem para contestação.

07 — BARONESS — Purple (Abraxan Hymns)

De início, o Baroness era pouco mais que uma curiosidade do underground dos EUA, uma banda cujos discos tinham nomes de cores e com artes desenhadas pelo vocalista-guitarrista John Baizley. Logo veio o hype, que gerou um disco muito incensado, mas um tanto exagerado (“Yellow & Green”), e em seguida um acidente com o tour bus que quase deixou Baizley sem um braço e fez dois músicas desistirem da banda. Nesse cenário, “Purple” é uma reafirmação e o melhor álbum da banda até aqui. Unindo metal, sludge, rock progressivo e psicodelia, o Baroness soa ao mesmo tempo denso e amigável, adotando a beleza como um dos elementos principais de sua paleta musical. Tudo é muito variado e ao mesmo tempo cheio de convicção, um triunfo de composição e foco musical. Hoje, depois dos percalços, o Baroness está na linha de frente do metal. E “Purple” é a prova irrefutável dessa realidade.

06 — SOLEFALD — World Metal. Kosmopolis Sud (Indie Recordings)

A expressão “world metal” não é apenas uma força de expressão aqui. Nome da velha guarda Black Metal que sempre recusou a acomodação, o Solefald tem feito do experimentalismo sua razão de existir, e seu mais recente CD leva isso a uma nova e fascinante dimensão. É o segundo trabalho de uma série que explora os sons folclóricos do mundo todo, e é seguro dizer que o resultado aqui é bem superior ao CD anterior (“Kosmopolis Nord”). Inúmeras bandas por aí que ousam chamar a si mesmas de avantgarde deveriam escutar faixas como “Le Soleil” e “World Music with Black Edges” para entender o que realmente é vanguarda musical. Talvez “World Metal. Kosmopolis Sud” não seja copiado por milhões de bandas nos próximos anos, mas isso é mais por culpa delas do que do Solefald, um grupo que faz o rótulo “post-Black Metal” não só fazer sentido como ser amplamente empolgante. Ouça.

05 — UNDERSMILE — Anhedonia (Black Bow Records)

A quase completa ausência desse álbum nas listas de melhores do ano é, para mim, inexplicável. Esse grupo inglês (formado por duas mulheres e dois homens, que constituem dois casais) já vinha gravando coisas legais há algum tempo, e com “Anhedonia” mostrou-se destinado ao topo do underground mórbido europeu. Misturando doom, sludge e drone, o Undersmile cria massas sonoras vagarosas, sombrias e cheias de texturas, realçadas pelos vocais sempre dobrados de Hel Sterne e Taz Corona-Brown. Há até um toque grunge aqui e ali, mas pense no aspecto mais mórbido do Alice in Chains antes de jogar pedras no ótimo trabalho do Undersmile. “Anhedonia” propõe uma viagem pelos corredores escuros da nossa imaginação, e o faz com brilhantismo. Vão crescer muito, podem apostar. Geniais eles já são.

04 — AHAB — The Boats of the Glen Carrig (Napalm)

Há tempos o Ahab está no primeiro escalão do som extremo, graças ao seu método soturno e bombástico de fazer Doom Metal. Nesse sentido, difícil dizer que “The Boats of the Glen Carrig” será revolucionário para o cenário atual — o que no fundo pouco importa, já que é o melhor disco que o Ahab já fez e talvez o mais perfeito trabalho de Funeral Doom Metal de todos os tempos. Obcecados por temas náuticos, o quarteto conta a história de um grupo de náufragos que encontra criaturas assustadoras enquanto estão à deriva, e o faz com uma sucessão de riffs intermináveis (no bom sentido) e uma atmosfera colossal, que usa partes melancólicas e explosões sonoras com total maestria. Hoje, o Ahab é uma das bandas mais importantes do metal mundial, e “The Boats of the Glen Carrig” é sua maior conquista até aqui. Uma audição que pode assustar incautos, mas ainda assim indispensável.

03 — DEAFHEAVEN — New Bermuda (Anti Records)

Em certo sentido, é quase uma pena que tanto hype tenha sido lançado sobre “Sunbather”, o CD anterior desse grupo dos EUA. Afinal, a atenção da mídia não-metálica e a súbita explosão de clones deram ao Deafheaven status de “ame-o ou deixe-o” do metal atual, o que não é justo com eles. Mais: fará com que muitos que odiaram “Sunbather” (que era OK, mas nada de outro planeta) ignorem o genial “New Bermuda”, que é muito melhor que seu antecessor. Antes, os saltos do black metal brutal para elementos shoegaze eram não raro forçados e anti-climáticos; agora, as coisas estão unidas de tal forma que é impossível fazer uma distinção. O Deafheaven agora traz alguns ótimos riffs, além de genuína interpretação em meio à rispidez nas linhas vocais. Belo e violento na mesma proporção, “New Bermuda” é sim um novo e excitante capítulo no som pesado. Acreditem no hype desta vez, pois ele é plenamente justificado.

02 — ELDER — Lore (Armageddon Shop)

Antes desse CD, os norte-americanos vinham construindo uma fama sólida no cenário stoner, graças à competência inegável de suas composições. Mas não eram exatamente a banda mais original do planeta, digamos assim. Com “Lore”, isso mudou — e agora estamos prestes a ver grandes desdobramentos no cenário stoner, que terão o Elder como seu ponto de partida. Somando elementos progressivos ao caldeirão e ampliando a complexidade de riffs e estruturas musicais, o Elder deixou para trás a simples repetição de riffs e criou um monstro, no bom sentido. Ainda é um disco de stoner, mas não há um CD stoner por aí que soe como esse. Alguém precisava dar esse passo, tirar o stoner da mera busca pelo riff perfeito e colocá-lo em um novo patamar de criatividade e engenho musical. Elder fez isso com “Lore”. Serão idolatrados e imitados daqui para frente, e com toda justiça. Histórico.

01 — TRIBULATION — The Children of the Night (Century Media)

Não foi fácil decidir, entre os 5 melhores cotados nesta lista, qual deles ocuparia o topo. Todos têm méritos únicos e relevantes que os destacam na multidão. Mas os suecos do Tribulation resumem tudo que faz do metal atual um universo tão fascinante: fiéis ao estilo de onde surgiram (death / black), mas ainda mais fiéis a si mesmos e à incansável ânsia por reinvenção. Depois de um flerte com elementos progressivos, resolveram mudar as coisas de novo em “The Children of the Night”, desafiando os próprios conceitos de peso e agressão aplicados ao metal. Não há riffs velozes nem blast beats aqui, ao contrário: há uma amálgama de metal tradicional, acid rock, gótico, psicodelia, dark metal e muitos outros elementos, unidos de uma forma que soa ao mesmo tempo nova e curiosamente familiar. Não é pesado como, digamos, um Slayer ou Death, mas ainda assim é pesadíssimo e fascinante. Mais do que uma banda presa a um sub-gênero, o Tribulation consolida-se como um conceito musical — e quantas bandas no mundo, em qualquer estilo, podem dizer isso de si mesmas? O resultado é um dos melhores discos da década, nada menos que isso. Ouça agora e pelo resto da vida.

RESUMO DE 2015:

Algumas tendências que já eram apontadas em anos anteriores se consolidaram no ano que passou — entre elas, a vitalidade criativa do doom metal (que teve muitos ótimos lançamentos que acabaram fora dessa lista) e as novas possibilidades dentro de sub-gêneros como o stoner e o death metal. Mas houve um ressurgimento de nota: o do cenário black — que, além das bandas aqui mencionadas, trouxe ótimos e criativos trabalhos de novatos (ou nem tanto) como Ur Draugr, Panopticon, Ophidian Coil, Fluisteraars e muitos outros. Longe de ser um mero elemento de misturas com rock alternativo e afins, o black metal tem uma vida criativa própria logo à frente, e tudo indica que os proximos anos serão riquíssimos nesse sentido.

Estilos mais puristas, como o thrash e o metal tradicional, ainda estão devendo em termos de novidade e capacidade criativa — o que não surpreende tanto, já que o cenário retrô ainda é muito forte nesses sub-gêneros. Mas há esperança no horizonte, tanto no primeiro caso (que teve ótimos lançamentos de Comaniac e Gama Bomb, por ex, que poderiam muito bem aparecer nessa lista) quanto no segundo, e é seguro dizer que quem tiver a melhor sacada tem tudo para ganhar espaço rapidamente, já que há uma carência de renovação nessa esquina metálica. Um sopro que já está começando também no power metal, onde Pyramaze e Guardians of Time, para citar apenas dois, lançaram alguns dos melhores CDs do gênero em muito tempo.

O que talvez seja o grande desafio do heavy metal como um todo (e que algumas bandas já estão abordando, embora longe esteja de ser de fato uma tendência global) é questionar os próprios preconceitos e cacoetes. Se a cena deve à superação do purismo musical intransigente muito do ótimo momento criativo que vive nessa década, ainda falta dar um passo além em termos de temática lírica e de postura diante de um mundo em transformação. Como um todo, o heavy metal ainda é refratário a discursos inclusivos e pouco questionador no que tange a estruturas sociais — e embora seja claro que não há (nem deve haver) nenhuma obrigação de tratar de política ou estudos sociais, é justamente ao “contaminar-se” com essas discussões que o heavy metal pode encontrar novas formas de sair da zona de conforto e expandir a si mesmo.

Esse saudável repensar tem acontecido em outros espectros do rock, mas ainda parece longe do heavy metal, onde letras sobre misoginia e/ou estupro ou glorificações de um estilo de vida violento, inconsequente e individualista ainda encontram aceitação fácil entre a maioria dos headbangers. Falta ao metal colocar a si mesmo contra a parede e discutir até que ponto a postura dos anos 1980 deve mesmo ser preservada — ou se, quem sabe, é o caso de deixarmos de lado esse tipo de conservadorismo rumo a um novo modelo, que renove nosso pensamento sem renegar os elementos que definem nosso universo artístico e musical. Em termos gerais, essa é a incerteza coletiva que paira sobre o heavy metal (uma leitura onde, é preciso que se diga, longe estou de ser pioneiro ou mesmo uma voz original) e que esperamos, todos os que se incomodam com o atual estado de coisas, transforme-se em uma discussão imperativa o mais breve possível.

O VIL METAL vai ao ar duas vezes por semana, às quintas (19h) e terças-feiras (00h), sempre pela Rádio Estação Web. Quem quiser nos contatar pode usar, além do Medium, nossos perfis no Facebook e Twitter, além do nosso e-mail, que pretendemos usar em breve para uma mailing list aos interessados. Todo retorno, de qualquer natureza, é muito bem-vindo!

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Igor Natusch
VIL METAL

Jornalista. Ser humano. Testemunha ocular do fim do mundo.