Uma licença-maternidade diferente

Ana Luiza Silveira
Work in Estonia
Published in
4 min readDec 7, 2020

A desenvolvedora Laís Gatti teve dois filhos na Estônia. Aqui, ela conta sua experiência com a licença-maternidade no país

Laís Gatti e o filho, Theo

“Sou de São José dos Campos, no interior de São Paulo. Há cinco anos, eu trabalhava como desenvolvedora de sistemas no Brasil e o Matheus, meu marido, na área de qualidade de uma montadora. Naquela época, queríamos viver a experiência de morar fora do país e melhorar nosso inglês. Então, um dia, decidimos arriscar. Fechamos as malas e viemos para a Estônia em busca de novas oportunidades.

Chegamos aqui sem nada em vista, mas em dois meses eu já estava trabalhando como engenheira de suporte em uma startup. Para o Matheus demorou um pouco mais: foram seis meses até encontrar um novo posto, desta vez na área de Supply Chain. Há dois anos, tivemos nosso primeiro filho, Theo. Foi toda uma nova experiência: ter um filho pela primeira vez, em outro país, longe da família.

Aqui na Estônia, esse momento na vida de uma família é bastante valorizado. Tanto que a licença-maternidade é de um ano e meio. Além de ser remunerada e garantir que seu emprego ainda estará lá quando você retornar, a licença pode ser dividida com o marido, de forma alternada. Nós fizemos isso. Fiquei os 13 primeiros meses em casa e o Matheus ficou com o Theo nos últimos cinco.

Bella chegou neste ano para completar a família

Tarefas iguais

Nesse período em que fiquei em casa, me dediquei 100% ao meu filho. Fazia muitas atividades com ele, levava à natação, à aula de música. Passei um ano sendo mãe em período integral. Para o Matheus foi difícil, pois normalmente são as mulheres que ficam de licença-maternidade. Então, ele ficava o tempo todo sozinho com o Theo. Apesar de possível, não é algo comum vermos pais de licença.

Eu, particularmente, acho muito interessante que se permita a divisão com o pai, porque a criação dos filhos não é responsabilidade só da mãe. É do pai também, na mesma medida! Para a nossa família, foi uma experiência incrível. Meu filho e meu marido puderam se conectar ainda mais.

Só quando o Matheus ficou de licença é que ele realmente entendeu como é ficar em casa, como pode ser cansativo e solitário cuidar de um bebê. Para mim, também foi interessante, pois pude entender como é a dupla jornada de uma mãe que trabalha fora.

Longo, mas recompensador

Esse tempo maior de licença, em comparação com o que temos no Brasil, é maravilhoso e desafiador. É um privilégio poder passar a maior parte da primeira infância do seu filho com ele, ajudá-lo a se desenvolver e vê-lo crescer bem de perto. E o fato de todo esse período de 18 meses ser remunerado faz com que você possa realmente se dedicar ao bebê, sem precisar mudar seu estilo de vida por alguma redução de renda da família.

Houve momentos, porém, em que achei esse período muito longo. A carreira não é prejudicada, pois a empresa precisa manter sua vaga e, em geral, as empresas na Estônia não têm problema em contratar mulheres que acabaram de retornar da licença. Mas, no final, eu estava doida para voltar ao trabalho. Sentia falta da rotina e das pessoas, de me sentir eu mesma novamente. Essa licença prolongada é um presente, mas às vezes um pouco pesada.

Mesmo assim, decidimos repetir. Há cinco meses, nasceu a Bella, nossa menina. E nossa ideia é dividir a licença da mesma forma. Desta vez, por conta da quarentena da Covid-19, o Matheus está trabalhando em casa e me ajuda na hora do aperto.

Apoio e segurança

Em comparação com a licença brasileira, sinto que a da Estônia tem vantagens e desvantagens. Os quatro meses no Brasil, a meu ver, são pouco tempo. Olhava para o Theo, tão pequeno, e não acreditava que as mães tinham que voltar ao trabalho com um bebê daquele tamanho e deixá-lo em uma creche! Aqui na Estônia, por exemplo, não existe creche para crianças com menos de 18 meses. Então, se você não tem uma rede de apoio, mas gostaria de voltar ao trabalho antes da licença terminar, é quase impossível.

O período em casa também pode ser muito solitário. O que faz a licença ser mais leve é poder encontrar outras mães que também estejam de licença, sair para passear com o bebê e conversar. Caso contrário, você passa o dia todo conversando com alguém que não te responde (risos). Então, para contar minhas experiências de maternidade na Estônia e mostrar a outras mães que elas não estão sozinhas, criei um canal no Instagram e outro no Spotify.

A Estônia é maravilhosa em tudo que é ligado a crianças. O sistema de saúde pública, na gravidez e no parto, é muito bom. Tive um ótimo pré-natal nas duas gestações. Além do apoio do Governo às famílias que querem ter filho aqui, a educação é de qualidade e gratuita. Sem falar na segurança: as crianças podem ter a liberdade de andar na rua sem medo.

Às vezes, quando penso em ir embora da Estônia, lembro de tudo o que ela proporciona para a criação dos nossos filhos e desisto. É aqui que quero ficar”.

Quer saber como funciona a licença-maternidade na Estônia? Clique aqui.

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