A revelação dos escritores fakes da Sports Illustrated e o uso de AI pela mídia na tentativa de sobrevivência em meio à quebra da indústria

Tradicional publicação esportiva comprava perfis em site que cria foto e biografia falsas de pessoas inexistentes. Editora replicou modelo para jornal de sua propriedade, mostrando como AI municiará cultura do clickbait e o impulso dos links para compensar evasão das receitas de anúncios

Eduardo Mendes
4 min readNov 29, 2023

A biografia de Drew Ortiz não entrega histórico algum de sua carreira como jornalista. Pelo menos, esperava-se um currículo robusto para quem escreve na renomada Sports Illustrated.

Curiosamente, Ortiz também não tem perfis nas redes sociais. Para um profissional de comunicação… soa estranho.

Então, uma pesquisa mais profunda realizada pelo Futurism encontrou outros atributos que desvendam o mistério: o “jovem adulto, branco, neutro com cabelo castanho curto e olhos azuis”, na verdade, é uma imagem gerada por inteligência artificial colocada à venda em um site. Ele foi descrito desta maneira na página.

Maggie Harrison, uma jornalista de verdade, descobriu que Drew não era o único AI-Generated Writer encoberto há alguns meses pela tradicional publicação esportiva.

Assim como Ortiz, Sora Tanaka e Domini Abrams surgiram no mesmo lugar que dá vida a pessoas que simplesmente não existem.

Funcionários da SI confirmaram em off à Harrison que os artigos escritos pelos jornalistas fakes também foram gerados por AI.

Pérolas do tipo “o vôlei pode ser um pouco complicado de se começar, especialmente sem uma bola de verdade para praticar” constavam na redação de Drew.

Além do texto parecer ter sido redigido “por um alienígena”, como bem classificou Harrison, há um outro agravante: em momento algum, a SI mencionou sobre o uso de AI para a produção do conteúdo.

O Futurism levou as questões à The Arena Group, a editora dona da publicação. Coincidentemente, logo depois, todos os autores fantasmas desapareceram do site da SI, e os seus artigos criados pela máquina foram atribuídos a outros jornalistas.

A prática de inventar escritores falsos também foi levada ao TheStreet, outro veículo pertencente ao Arena Group, segundo descobriu a reportagem.

Em meio a inúmeras e ótimas revelações trazidas por Harrison, destaco este trecho escrito pela jornalista e que joga luz sobre as motivações por trás dos redatores fantasmas:

“(…) agora que está sob a administração do The Arena Group, partes da revista parecem ter se transformado em uma Vila Potemkin, na qual escritores falsos são criados do nada, equipados com biografias e conhecimentos igualmente falsos para ganhar a confiança dos leitores e usados para produzir guias de compra gerados por AI que são monetizados por links de afiliados para produtos que fornecem uma comissão financeira quando os leitores clicam neles.”

Ou seja, a AI municia e trabalhará ainda mais para nutrir a cultura do clique a todo custo em uma tentativa desesperada das empresas de mídia lutarem contra a queda de receitas dos anunciantes, e que reflete o colapso deste mercado há alguns anos.

O formato desgastado do alcance e dos links impulsionados pelos algoritmos viciantes, agora, passa ganhar um aliado importante que chega neste momento como um bote para resgatar e dar sobrevida às métricas de curtidas, visualizações e impressões das redes sociais, o mais novo lugar para se consumir notícias.

No mar saturado e infinito de conteúdo, isso pode não ser sustentável no longo prazo. Moralmente, o barco segue afundando.

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Eduardo Mendes

Advisor for Culture and Innovation | Co-Founder na The Block Point | Web3 & New Technologies | Strategy, Research & Content | Sports | Entertainment | Media