Tudo aquilo que eu perdi a chance de te falar
A gente se esbarrou em uma briga que nunca foi nossa e ao mesmo tempo sempre foi. Acho que me abalou por ser a primeira vez. O primeiro esbarrão sempre dói mais. Mas, ao mesmo tempo, é como se eu já esperasse por isso desde sempre. O destino acontece cedo ou tarde.
Eu falei mais do que eu devia, mas não falei tudo o que queria.
Prefiro acreditar que você também falou mais do que precisava. Mais do que era verdade. As palavras que você mostrou devem ter sido um engano.
Você não vai concordar, porém o erro foi seu. Acredito que você pode até já ter chegado a essa conclusão, mas nunca vai conseguir admitir.
A sequência de erros foi sua, só que eu estava no meio do caminho. E fui atropelado. Atropelado porque cheguei perto demais do acidente e tudo explodiu na minha cara. Mas se eu não tivesse ido ver, nunca saberia. Para quem acredita em destino, não existe um universo paralelo em que eu preferi manter distância. Então não existe um universo em que a gente não se machucou. Mas existe um universo em que o erro foi meu, ainda que ele só exista na sua cabeça e eu não consiga vê-lo. Não tem como alguém se transportar para lá. Menos ainda eu.
Eu que não fujo de conflitos. Eu que falo demais. Eu que prefiro expressar do que guardar. Eu que acredito que brigas não são fins, e que fins são passageiros, e que eu já fui passageiro demais.
Passageiro sempre. As despedidas não me abalam. Desci em tantas estações que o aviso sonoro já até é familiar. E também não é a primeira vez que alguém desce na próxima estação. Admita que quem desceu foi você e que nós apenas seguimos viagem. Você saltou só e nem deu a chance para que alguém fosse junto. O que esperava? A culpa não é de quem fica.
Só é uma pena que a gente não tenha se despedido. Agora eu imagino que você tenha entendido errado as minhas últimas palavras, mas não tem mais como eu me explicar. As coisas que você me disse também não tem explicação. Talvez por isso não me atingiram. Foram socos muito fracos em uma carcaça dura. Eu não acredito em nada do que foi dito, nem por um segundo. Você me pediu pra nunca desistir, mas foi você quem desistiu. Injusto. A única coisa que fere debaixo da carcaça é a perspectiva de que acabou.
Acabou porque eu acredito no seu orgulho de não subir mais nesse trem.
E mesmo se subir, vai estar tudo tão diferente. A paisagem vai ser outra. Nós dois teremos a mesma cicatriz no rosto. A gente vai se reconhecer e talvez sorrir e perguntar como anda a vida. Mas a gente consegue ver a marca. Ignorar não faz ela sumir.
São marcas do acidente causado por uma gota d’água, cuja tempestade foi monumental.
Eu sinto muito que você estivesse vulnerável. Sinto muito que você não controlou a raiva. Sinto muito que você desceu do trem. Mas a nossa festa não parou, e nem poderia, por causa dos seus fogos de artifício. Você sabe em qual estação eu desci. Você sabe que eu vou sorrir e perguntar da sua vida. Então se um dia você quiser voltar para ver o que sobrou, tudo bem.
Se não, espero que tenha mais sorte na próxima estação, mas leva um casaco, porque pode ser inverno.
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Uma saída muda tudo.