United 4–0 Chelsea: um time com estratégia. E execução

Lucas Filus
4 min readAug 12, 2019

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Andy Mitten, jornalista de Manchester que cobre o clube há anos e costuma ser próximo do elenco, revelou um fato interessante. Nos arredores do nosso amistoso contra o Kristiansund, em Oslo, um jogador teria declarado o seguinte: “acredite em mim, vamos massacrar o Chelsea.”

Foi de acordo com a sensação de que internamente o clima é dos melhores possíveis e existe uma confiança verdadeira nos bastidores. E deu um spoiler do que viria a acontecer no Old Trafford dez dias depois. Os 4 a 0 podem significar pouco no final da temporada, mas simbolizam a atmosfera no momento.

Nessa era do estudo do futebol, com visões cada vez mais voltadas para a análise, a primeira coisa que faço é tentar entender as estratégias dos treinadores. Só assim me sinto em posição de expor meu julgamento sem cometer equívocos de um olhar pouco embasado.

Por isso discordo quando batem na tecla de que ter cedido à posse ao adversário representa um erro. Limitações — e a resposta para tal -, talvez. Erro, não. Desde o início Solskjaer demonstrou sua ideia de montar um time bem estruturado sem a bola e capaz de contra-atacar com precisão, isso não deveria surpreender ninguém.

Leia mais: Solskjaer pode montar um time de sucesso no Manchester United

E saiu por cima na maioria desses confrontos na temporada passada, como detalhei no link acima. Ter um plano diferente pra estreia da Premier League seria brigar contra a lógica. A etapa inicial trouxe fatores a serem trabalhados, mas esperar algo diferente seria utópico. Falhamos em não reforçar o meio-campo na janela e não vai ser a primeira vez que buracos vão aparecer.

Por isso — e pela intenção do Lampard — os visitantes tiveram qualidade na troca de passes e posições quando se aproximavam do ataque. Pedro foi um dos melhores, Barkley e Mount se movimentaram bem e Abraham tem uma intensidade que fez falta nos últimos times do Chelsea. Mas por sorte o ‘outro lado’ do nosso mercado entrou em cena aqui.

Wan-Bissaka e Maguire foram contratações extremamente acertadas e capazes de transformar a realidade da defesa. A performance de ontem foi apenas um exemplo. O pior rendimento do adversário veio pela lateral onde estava o ex-Crystal Palace e quando tentaram furar o bloqueio pela direita, aproveitando a atuação abaixo da média de Shaw, o ex-Leicester foi pefeito.

Excelente nos duelos, antecipando com eficiência quando a situação permitia e passando confiança e segurança em todas as ações. Isso faz diferença na harmonia do setor e Lindelof também teve um desempenho elogiável. Temos uma base mais do que sólida para servir de pilar ao resto do conjunto. Pelas entrevistas antes e depois do apito final, todos tem consciência disso lá dentro.

A plataforma é ideal para a parte decisiva da tática de Solskjaer dar resultado. Seus atacantes/pontas tem bastante liberdade nesse esquema e não fazem a recomposição, ficando lá na frente prontos para os contra-ataques. Geralmente são dois nessa função, mas ontem até três eram vistos em prontidão para o momento em que a bola fosse recuperada.

É um risco que estamos dispostos a correr. Toda tática tem suas ‘trocas’ de pontos fortes por pontos fracos e a nossa vem surtindo efeito.

Martial e Pogba cometeram erros bobos, mas não saíram sem deixar impressões positivas também. O primeiro, agora com a camisa 9 e mais centralizado, fazendo um gol típico de centroavante — como Ole pediu. E o segundo mostrando o motivo de ser tão crucial em duas jogadas, lançando com maestria pro 3 a 0 de Rashford e sendo um típico box-to-box na assistência pro James. Estamos falando de muita qualidade e repertório.

Além do pênalti no começo, foram três contragolpes de manual. Com intensidade, velocidade e cada peça sabendo o que precisava fazer. Esse foi o tempo de cada um, contando da recuperação até o balanço da rede: 16, 10 e 14 segundos. É válido ressaltar como fomos subindo de nível conforme as coisas aconteciam e a impressão era de que continuaríamos marcando se os acréscimos fossem mais longos.

Não é novidade que a comissão técnica resolveu implantar uma mudança drástica na preparação física do plantel a fim de possibilitar esse tipo de jogo. Os perfis se encaixam nas ideias propostas, as condições das pernas vão melhorando e o clima no geral está bom.

“Como falamos para os garotos antes do jogo, nós encontramos a forma que queremos jogar e um estilo em que acreditamos. Nós corrermos riscos mas aqui é assim. É risco e recompensa e hoje fomos recompensados”, foram as palavras de Solskjaer.

Não poderia estar mais certo. Agora a missão é, por incrível que pareça, mais dura: trabalhar intensamente para que tenhamos um padrão efetivo nas partidas contra adversários que vão ceder a posse e plantar a defesa lá atrás. A escassez no meio-campo deve vir à tona, mas é missão do treinador encontrar maneiras de compensá-la.

Para nós, basta confiar. A estreia certamente deu confiança.

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Lucas Filus

Apaixonado por futebol, principalmente o inglês. Ex-blogueiro do Manchester United no ESPN FC. Colaborador do Footure e do PL Brasil. No Twitter, @filuslucas.