Sentia que, a cada noite, afundava no lodo da existência, arrebatado pelos acontecimentos nefastos de um presente cruel, pelas…
O que vale é a intenção, é o gesto. Esquece a palavra, atente aos detalhes: mãos entrelaçadas, olhares furtivos, gemidos abafados, risos claros…
Se Deus realmente quisesse acabar com o pecado, não teria expulsado Adão e Eva do Paraíso, mas simplesmente amputado suas mãos. É por elas que passam…
Continuação do conto anterior.
Carlos Eduardo retira o revólver da sua boca. Ele não é nenhum idiota, apenas encena o seu próprio drama, em seu apartamento apertado, em meio aos livros que decoram as prateleiras. Aquele é o seu espaço para o…
Carlos Eduardo descobriu, num livro de Bauman, o motivo de seu desconforto com a vida, nos últimos anos: a supressão espaço-tempo. Ele não gosta propriamente de ler, mas nascera numa casa com paredes cheias de prateleiras decoradas com livros. Por isso, os folheia ocasionalmente, assim…
Uma lembrança o arranca subitamente daquela cama quente, e da mulher lânguida ao seu lado, e ele podia quase sentir o suave roçar de uma farta cabeleira ruiva em sua nuca, os dedos maliciosamente descendo entre os pelos de seu peito, em direção à barriga; o barulho de uma boca que se abre próxima ao seu…
Aquilo não lhe cabia bem; não era necessário perscrutar-lhe os olhos, ou inquirir sua alma se aquilo lhe pesava: o desconforto era nítido, refletido nos olhos, no esgar da boca, nos gestos e no corpo inteiro. Aquela peça era uma estranha, uma forasteira, era como sal no pote de açúcar, ou…
Apenas pares de olhos destacavam-se em meio à densa fumaça dos cigarros, naquele barzinho esquecido pelos homens de boa índole. Aos pares ou solitários, todos ali carregavam, bem nutridos, os vermes de uma corrupção cuja origem é agora desconhecida, mas que lança uma centelha de loucura no olhar de cada um. Há…