Viciadamente

Maximilian Rox
Conto que te Conto
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2 min readNov 9, 2018

Ensaio sobre a ansiedade

Quando me dei conta, duas horas se passaram dentro do metrô e eu nem tinha percebido. Me empolguei com a história de algum amigo pelo celular e isso me levou a uma espiral devoradora de vídeos quando finalmente recebi uma mensagem perguntando onde eu estava.

Isso nunca aconteceu comigo, sabe. Sempre fui alguém atento, mas só agora percebi que meu aparelho tinha alguma anormalidade bizarra. Na ocasião de alguns dias atrás eu queria evitar um cara chato do trabalho e fingi que estava digitando algo e ele passou reto por mim. Reto, sem olhar, sem acenar, sem incomodar; como se ignorasse a minha existência mesmo depois de três meses puxando aqueles papos chatos de escritório. Pensei que só podia ser coincidência, mas pouco a pouco notei que ninguém mais conversava comigo a partir do momento que puxava o celular do bolso.

Desde então, tudo aquilo se tornou minha mágica secreta e pessoal. Era só mergulhar no aparelho e o mundo inteiro virava os olhos da minha direção. A benção da opacidade social estava ali, nas palmas das minhas mãos. Aconteceu no trabalho, aconteceu com os amigos, aconteceu agora no metrô. E eu nem sabia porque ele demorou tanto para chegar no meu ponto.

Quando finalmente parei na estação, saí pela porta do trem e subi as escadas em direção à rua. Contornei a grade e confrontei o suor da cidade, mas depois dos primeiros passos eu jurei ter ouvido alguém chamar por meu nome. Soou tão distante como aqueles suspiros que cruzam sua mente e você tem a impressão de que alguém conhecido está por perto. Tão perto como se eu tentasse encontrar uma janela acendendo no horizonte iluminado de prédios. Tão longe como se alguém gritasse no final de um túnel e você já estivesse do outro lado.

Eu sinceramente não lembro do que aconteceu depois. Quando me dei conta novamente, já estava há algumas quadras com o dedo deslizando sem parar pela tela.

O que sonham os acordados

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Maximilian Rox
Conto que te Conto

Jornalista com ascendente em poesia. Community manager; Call of Duty, games, esports.